LISBOA ? No dia seguinte em que o brasileiro Raduan Nassar foi anunciado como vencedor do Prêmio Camões, maior galardão da literatura em língua portuguesa, a 86ª Feira do Livro de Lisboa, maior evento literário de Portugal, tinha apenas um exemplar do escritor à venda. Um único volume de ?Menina a caminho?, coletânea de contos do autor era oferecido no estande da editora Cotovia por apenas ? 4. Nem mesmo a editora portuguesa Relógio D?água, que detém os direitos dos romances do escritor no país (?Lavoura arcaica? e ?Um copo de cólera?) tinha qualquer obra do paulista à venda. Ao pedir para soletrar o sobrenome do autor, os vendedores da editora demostravam sequer conhecê-lo.
? Não temos exemplar algum, infelizmente. Não conheço o autor. Os livros que temos dele são edições muito antigas, já não há exemplares, segundo consta aqui no catálogo ? desculpou-se um jovem vendedor da editora, das maiores do país, a mesma que representa Clarice Lispector no evento, e que dava à autora destaque merecido, com banners e descontos no estande.
?FALTOU ANTECEDÊNCIA AO BRASIL?
Num evento com 300 pavilhões de livros à venda, com toda sorte de títulos escritos em língua portuguesa, a ausência de Raduan é curiosa. Não só dele, aliás: numa ronda pelos estandes das editoras que integram o evento, a presença de autores brasileiros é tímida. Há sete estandes exibindo títulos brasileiros na feira. O da editora Cotovia também comercializa livros de nomes como Bernardo Carvalho, Milton Hatoum, Nuno Ramos, Marcelo Mirisola, João Antônio, Rubens Figueiredo e Adélia Prado, além de clássicos como Machado de Assis, Graciliano Ramos e João Cabral de Melo Neto (que também foi um dos brasileiros ganhadores do Prêmio Camões). Todos têm livros à venda na feira, a preços que vão de ? 4 a ? 12.
O espaço da Tinta da China, que publica Gregorio Duvivier, Paulo Scott, Ruy Castro, Michel Laub, Francisco Bosco, Luiz Ruffato e Tatiana Salem Levy, lança pela primeira vez neste ano a prosa de Nelson Rodrigues no país (os livros custam por volta de ? 15). Outros trazem títulos esparsos: o estande da editora Quetzal, por exemplo, tem ?Pornopopéia? e ?O cheirinho do amor?, de Reinaldo Moraes; o da Porto Editora exibe a trilogia ?1808?, ?1822? e ?1889?, de Laurentino Gomes (a ? 14 cada). Até a tarde de ontem ? sexto dia do evento, que segue até 13 de junho ? o livro brasileiro mais vendido (17 exemplares) era ?Os contos completos? de Clarice Lispector (a ? 21, na tenda da Relógio D?água, que também comercializa a coletânea de esquetes de humor ?Porta dos fundos?). Na Sextante, havia uma boa coleção de títulos de Rubem Fonseca em promoção (? 11). E, na editora 4 Estações, obras como ?Ajude-me a chorar?, de Fabrício Carpinejar, a ? 6.
? Assim como há muitos autores portugueses desconhecidos no Brasil, também nós precisamos ainda conhecer muito da literatura brasileira ? comentou um dos vendedores da Sextante, que preferiu não se identificar.
A feira acontece há 86 anos no país. Nesta edição, a maior de todas, a expectativa é que cerca de 500 mil pessoas circulem pelo Parque Eduardo VII, onde acontece o evento, movimentando cerca de ? 4 milhões. Além dos poucos títulos exibidos por casas portuguesas, o Pavilhão do Brasil traz apenas a Editora do Senado Federal, que exibe obras raras sobre a História do país. O secretário-geral da Associação Portuguesa de Editores de Livros (Apel), que organiza o evento, Bruno Pacheco, diz que faltou antecedência necessária aos interessados:
? A Feira do Livro de Lisboa é um grande evento, com muitos participantes, exigindo uma organização rigorosa que começa com muita antecedência. O fato de o Brasil ter mostrado interesse em participar desta edição, seis anos depois de sua última presença no evento, foi para nós motivo de grande contentamento, e quisemos incluí-lo com o destaque que merece. No entanto, a comunicação de interesse em participar não foi feita com a antecedência necessária.
Mariana Filgueiras viajou a convite da TAP