Guaíra – A prisão de três contrabandistas em flagrante aliciando indígenas em uma aldeia na cidade de Guaíra semana passada reacendeu a discussão sobre a utilização desses territórios – que por lei não podem passar por uma fiscalização ostensiva – para guardar produtos ilegais do Paraguai.
Além dos cigarros paraguaios, investigação de forças policiais que atuam na fronteira aponta que aldeias “alugadas” guardam produtos ainda mais nocivos, como armamento pesado, munições e drogas, sobretudo maconha, haxixe e cocaína.
Em julho deste ano, na mesma aldeia onde os contrabandistas foram presos semana passada, a Polícia Militar aprendeu 20 quilos de maconha e 7,3 quilos de haxixe.
A prática não é isolada e vem sendo adotada há anos nas margens do Rio Paraná, especialmente no trecho de fronteira com o Paraguai, na altura das cidades de Guaíra e Salto Del Guairá.
Conforme as investigações, muitas embarcações vêm lotadas com produtos ilícitos trazidos do outro lado da fronteira, principalmente à noite e na madrugada. Como uma das aldeias está bem próxima à barranca do rio, o processo de descarga e locomoção até os depósitos é facilitado pela proximidade.
Em terra, os produtos seguem pelas “mulas” – pessoas que trabalham na descarga.
Na operação da semana passada, o Nepom (Núcleo de Polícia Marítima da Polícia Federal) apreendeu três veículos velhos usados para o transporte desses produtos, um motor de barco, uma carreta para embarcação e 20 caixas abarrotadas de produtos contrabandeados. “Isso ocorre na região de Guaíra há anos. Às vezes o fluxo diminui um pouco, mas nunca deixou de existir. Há a conivência de muitos indígenas porque acaba sendo um dinheiro fácil”, afirma um agente da Polícia Federal que atua na fronteira há anos.
Produtos ficam até um mês no depósito
A reportagem do Jornal O Paraná já esteve na aldeia indígena onde foram encontrados produtos ilegais e teve de sair sob ameaça dos índios.
Na ocasião havia sido identificada uma espécie de carreador indicando por onde o fluxo passava para a descarga dos barcos na barranca do Rio Paraná. Para descarregar as mercadorias, são usados os chamados portos clandestinos. São clareiras abertas na mata ciliar que margeia o rio. Para isso os contrabandistas improvisam uma espécie de atracadouro e derrubam as árvores para facilitar a descarga.
Os portos clandestinos são rudimentares e sempre que um é descoberto e sua estrutura é danificada pela polícia outro é aberto a poucos metros, caracterizando mais um crime: o ambiental, porque as espécies tombadas são geralmente árvores nativas.
Em uma faixa de pouco mais de 100 quilômetros na fronteira do Brasil com o Paraguai, passando pelo Paraná, existem de 150 a 200 portos clandestinos todos abertos por uma das cerca de 20 quadrilhas que trabalham intensamente no contrabando de cigarros, no tráfico de drogas, armas e munições na região.
Quanto às aldeias, os produtos costumam ficar nelas por duas semanas até um mês para despistar a investigação e depois seguem Brasil afora. Quanto ao cigarro, a maior parte abastece mercados como Centro-Oeste, Sudeste, Nordeste e a própria Região Sul do Brasil. Armas e munições seguem, prioritariamente, ao crime organizado nos estados do Paraná, de São Paulo e do Rio de Janeiro.