RIO – O Petit Trianon, que abriga a Academia Brasileira de Letras (ABL), terá uma
semana bastante agitada, como há tempos não se via. Na quarta e na quinta-feira,
o palacete vai receber duas eleições de novos membros, em substituição aos
falecidos Ivo Pitanguy, na cadeira 22, e Ferreira Gullar, na cadeira 37. Entre
os acadêmicos, não há quem se recorde de um episódio parecido. Uma das razões
para a o pleito duplo foi outro fato inusitado: em novembro do ano passado, a
sucessão de Pitanguy terminou sem vencedor. Os principais concorrentes ? o poeta
e filósofo Antonio Cicero e o cientista político e ex-ministro da Cultura
Francisco Weffort ? não conseguiram alcançar o número mínimo de votos
necessários para a vitória. Assim, o processo eleitoral foi reiniciado.
? Não é uma ocorrência comum. Pelo menos nos últimos dez anos, que é o meu
tempo de Academia, não tenho notícias ? diz o presidente da ABL, Domício Proença
Filho, que detalha o que aconteceu na sucessão da cadeira 22. ? Como nenhum dos
dois candidatos conseguiu a maioria absoluta exigida pelo regimento para ocupar
a cadeira vaga, em casos como este, as inscrições são reabertas.
Na quarta-feira, a eleição para a cadeira 22 será refeita, porém com outros
candidatos. O favorito é o escritor e diplomata potiguar João Almino, vencedor
do Prêmio Casa de las Américas em 2003, com ?As cinco estações do amor?
(Record), e do Prêmio Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura em
2011, com ?Cidade livre? (Record). Seu último livro foi ?Enigmas da primavera?
(Record), de 2015. Almino também é autor de vários livros de História e
filosofia política, referências sobre autoritarismo e democracia. O diplomata
concorre com Osmann de Oliveira, José Itamar de Abreu Costa, Antonio Spyer de
Mourão Matos e Juarez M. Avelar. De acordo com o estatuto, para se candidatar à
ABL é preciso ter publicado obras ?de reconhecido mérito?, literárias ou
não.
Entusiasmado com os candidatos, mas sem revelar seus votos, o acadêmico
Arnaldo Niskier, o terceiro membro mais antigo da ABL atualmente, alerta:
? A academia é um mistério permanente. Nunca se sabe direito o que vai
acontecer. Ela se renova quando certas coisas acontecem. Agora, quem vai ganhar,
só Deus sabe.
DISPUTA APERTADA
Antonio Cicero, num primeiro
momento, se inscreveu para concorrer novamente à sucessão de Pitanguy. Depois
mudou de ideia e passou a disputar a cadeira 37, vaga com a morte do poeta
Ferreira Gullar. Gullar, foi, inclusive, um personagem importante nos bastidores
da disputa que terminou sem vencedor. O poeta maranhense atuou como um dos
principais cabos eleitorais de Cicero, seu amigo, e também como adversário da
candidatura de Weffort. As rusgas entre Gullar e o ex-ministro da Cultura
remontam ao início do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso: o poeta foi
demitido do comando da Fundação Nacional das Artes (Funarte), cargo que ocupava
desde o governo de Itamar Franco, por Weffort.
Cicero conta com o apoio da chamada ?ala literária? da ABL e tem o crítico e
professor Antônio Carlos Secchin como um de seus principais apoiadores. No
entanto, deve enfrentar uma eleição tão ou mais difícil do que a anterior. Isso
porque o seu principal adversário na disputa pela cadeira 37 (na quinta-feira) é
o historiador Arno Wehling, presidente do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (IHGB), autor de obras importantes, como ?Formação do Brasil
Colonial? (Nova Fronteira, escrito com Maria José Wehling). O historiador tem o
apoio de muitos dos acadêmicos que também são sócios do IHGB ? são 14 ao todo ?,
como o historiador e diplomata Alberto da Costa e Silva, que também é
ex-presidente da ABL, o historiador José Murilo de Carvalho e o jurista Alberto
Venancio Filho. O GLOBO apurou que Costa e Silva foi o responsável pelo convite
para que Wehling se candidatasse e é um dos mais empenhados pela sua
vitória.
Segundo pessoas próximas ao processo eleitoral, há um sentimento bastante
forte na Academia de que eleger Wehling seria uma maneira de homenagear o IHGB.
Apoiadores dos dois lados, entretanto, acreditam que o vencedor, quem quer que
seja, o será por pequena margem. E não está descartada a possibilidade de
ninguém ser eleito, como ocorreu na primeira votação para sucessão de Pitanguy.
Correndo por fora na disputa pela carreira 37, de Gullar, está Antônio Campos,
irmão do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e criador da Festa
Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto). Os outros candidatos são
Felisbelo da Silva, Batista D?Obaluayê, Rossini Corrêa, Antonio Martins de
Araújo, Adenildo de Lima, José Roberto Guedes de Oliveira, Diego Mendes Sousa,
Luisinha Dias de Valois Santos e Eloi Angelos Ghio D?Aracosia.