Cotidiano

Parentes de vítimas criticam Egito por naufrágio que pode ter matado 400

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CAIRO ? Um dia depois de um barco com cerca de 600 imigrantes ilegais ter naufragado na costa do Egito, quase 400 pessoas seguem desaparecidas no Mar Mediterrâneo, segundo estimativas de testemunhas. As equipes de resgate conseguiram salvar 169 dos passageiros ? de acordo a Organização Internacional para Migrações (OIM), são 111 egípcios, 26 sudaneses, 13 eritreus, um sírio e um etíope. O governo egípcio afirmou que o número de vítimas subiu para 52, mas ainda deve crescer. As equipes de resgate estão concentrando esforços em encontrar o quarto de refrigeração do barco, que concentraria cerca de cem passageiros. Sobreviventes do naufrágio disseram à rede BBC que acreditam que centenas de pessoas se afogaram. Parentes criticaram uma suposta ineficácia das autoridades em lidar com a tragédia.

A embarcação esteve em alto-mar durante cinco dias antes de ceder e afundar, recebendo cada vez mais passageiros a partir de barcos que levavam outros migrantes a bordo em plena travessia. De acordo com migrantes ouvidos pela BBC, a embarcação não resistiu quando um grupo de 150 pessoas foi incluído a bordo. Nessa quarta-feira, as forças de segurança egípcias prenderam quatro homens por suspeita de tráfico humano e homicídio culposo, afirmou uma fonte da Promotoria da cidade de Rosetta (também conhecida como Rashid), Norte do país.

Muitos dos imigrantes que sobreviveram ao naufrágio também foram presos. As autoridades disseram que egípcios que estejam sob custódia da polícia serão libertados, mas estrangeiros ficarão detidos por mais alguns dias para esclarecerem sobre como ingressaram no país. Jovens resgatados que aguardavam em uma delegacia disseram que tentaram viajar com a esperança de conseguirem empregos na Itália.

O episódio evidencia o aumento do fluxo de embarcações superlotadas na rota para a Itália, após um acordo entre a União Europeia (UE) e a Turquia impor barreiras à chegada ao continente pela Grécia, que foi em 2015 a principal entrada para a Europa. De acordo com a agência de fronteiras da UE, a Frontex, o pacto entre UE e Turquia é um dos principais motivos para a Itália ter passado a receber 750 imigrantes diariamente. O fechamento da fronteira grega com a Macedônia também colaborou para o novo cenário, apontou a Frontex.

SETE HORAS NA ÁGUA

O egípcio Mohamed Mabrouk, um dos 169 sobreviventes, quis deixar o seu país para tentar um futuro melhor na Europa. Logo antes do amanhecer da quarta-feira, o jovem ligou para o seu tio em pânico. Saeed Abu Hamed, de 37 anos, estava dormindo quando o telefone tocou. Ele lembra de ter ouvido a voz agonizante do seu sobrinho repetindo: ?Tio, me ajuda! As pessoas estão morrendo ao meu redor, o barco está afundando, a água está vindo de todos os lados?.

? Eu ouvi as pessoas gritando por ajuda no fundo. Foi horrorizante. Eu não sei se sou capaz de esquecer disso ? disse Hamed para a Reuters.

Deitado no leito de um hospital público de Burg Rashed, Ahmed Darwish, de 27 anos, diz que passou sete horas na água.

? O capitão do navio não conseguia mais controlar o barco. Nós dissemos a ele que o barco não nos levaria até lá em segurança. O barco ficou balançando até virar ? conta Darwish.

O homem avistou um barco de pesca a cerca de um quilômetro de distância, e tentou desesperadamente chamar a atenção dos tripulantes.

? Eu tinha uma bolsa na mão, e fiquei ?lutando? com a água até que eles finalmente me viram e acenaram com uma camisa branca ? narra Darwish ? Em questão de segundos, eles mudaram a direção do barco e vieram na velocidade de um foguete para me salvar.

Para parte da população, o Egito não está fazendo um trabalho bom o suficiente no resgate, apesar do primeiro-ministro egípcio, Sherif Ismail, ter afirmado que todos os recursos possíveis estão sendo direcionados para a operação. Gamal Assad, que recebeu uma ligação do seu irmão de 17 anos às 5h, acusa as forças estatais de ineficiência.

? Eu liguei para a guarda costeira, mas eles não se mexeram. Foram os barcos de pesca que os salvaram.

No posto da guarda costeira em Burg Rashid, onde o Mediterrâneo encontra o Nilo, dezenas de pessoas esperavam por notícias sobre os desaparecidos. Quando um barco com 12 corpos chegou à orla, alguém gritou:

? Se nós fôssemos estrangeiros, italianos ou franceses, vocês teriam feito alguma coisa. Como está o trânsito na rua onde você está?