Cotidiano

MSF rejeita apoio financeiro da União Europeia por 'políticas antirrefugiados'

RIO – A Médicos Sem Fronteiras (MSF) decidiu parar de receber apoio financeiro da União Europeia (UE) e de seus Estados-membros, anunciou a organização humanitária. O motivo alegado é a “oposição às políticas de dissuasão danosas e à intensificação das tentativas de empurrar as pessoas e seu sofrimento para longe da costa da Europa”, em referência à série de decisões do bloco para impedir a chegada de pessoas que fogem da guerra e da fome em países africanos e no Oriente Médio.

De acordo com a ONG, a situação humanitária dos refugiados atualmente retidos nas ilhas gregas somente se deteriora. Os mais de 8 mil migrantes parados no país não conseguem avançar para outros países no continente como consequência de um acordo assinado no início do ano entre entre a UE e a Turquia. Eles não tem recebido apoio jurídico e têm o direito de circulação barrado, segundo MSF.

No pacto, todas as chegadas ilegais de refugiados passam a ser barradas, em troca de compensações financeiras, a entrega do número equivalente de refugiados aguardando em solo turco e vantagens para integrar o país ao bloco europeu. A maioria das famílias afetadas vem de Síria, Iraque e Afeganistão, e não tem integração na Turquia.

“Há meses MSF tem se pronunciado abertamente sobre a resposta vergonhosa da Europa, mais focada em dissuadir essas pessoas do que em lhes oferecer a assistência e a proteção de que necessitam”, disse em nota Jérôme Oberreit, secretário-geral internacional de MSF. “O acordo entre UE e Turquia vai ainda além, e colocou o próprio conceito de ‘refugiado’ e a proteção que ele oferece em perigo.”

A Médicos Sem Fronteiras relatou ter atendido cerca de 200 mil homens, mulheres e crianças na Europa e no Mar Mediterrâneo durante o auge da crise dos refugiados, principalmente em 2015. 

PLANOS DE NOVOS ACORDOS SÃO CRITICADOS

Um ponto que criou ainda mais temor e potencializou a decisão de rejeitar financiamento europeu, segundo comunicado de MSF, é que a Comissão Europeia planeja uma nova série de acordos com os mesmos moldes do pacto turco para países africanos, “facilitando retornos forçados” por dinheiro em nações como Somália, Eritreia, Sudão e Afeganistão. Estes países fazem parte das dez que mais geram refugiados pelo mundo, segundo levantamento recente da ONU.

“A única oferta da Europa aos refugiados é que eles fiquem em países de onde estão desesperados para fugir? Mais uma vez, o foco principal da Europa não está na proteção das pessoas, mas na maneira mais efetiva de mantê-las distante”, disse Jérôme Oberreit. “Políticas de dissuasão apresentadas para o público como soluções humanitárias só exacerbaram o sofrimento das pessoas em necessidade. Não há nada remotamente humanitário nessas políticas. Elas não podem se tornar a norma e devem ser questionadas”

Ainda segundo a organização, a decisão de recusar os fundos europeus é um apelo para que suas instituições “alterem prioridades” (“eles devem maximizar o número de pessoas que recebem e protegem”, diz MSF).

Com atividades financiadas principalmente por doações privadas, a organização relatou que, no ano passado, os fundos das instituições geridas pela UE representaram €19 milhões de euros, enquanto fundos dos Estados-membros representaram €37 milhões de euros.