Cotidiano

Mais de 90% do Paraná está em risco máximo de incêndio

Impacto da seca vai além da falta de água: prejudica agricultura, saúde e agrava riscos de queimadas

Mais de 90% do Paraná está em risco máximo de incêndio

Cascavel – O Paraná vive uma das piores estiagens da história. A seca provoca impactos que vão além do fornecimento de água para abastecimento público. Já são contabilizadas perdas consideráveis na produção agrícola, há um aumento na ocorrência de incêndios em todo o Estado e também da incidência de problemas de saúde.

No início de agosto, o governo estadual publicou o quarto decreto de emergência hídrica no Paraná, em sequência, reconhecendo a gravidade da estiagem e que prioriza o uso da água para abastecimento humano e dessedentação animal.

Em julho, houve 1.505 focos de queimadas no Paraná, 125% a mais que no mesmo mês do ano passado, quando 669 ocorrências foram confirmadas. Nos primeiros dias de agosto, as ocorrências mais do que dobraram, passando de 674 registros entre os dias 1º e 8 de agosto, contra 329 no mesmo período de 2020.

O alerta de risco alto de incêndio continua vermelho em quase todo o Estado, conforme mapa divulgado ontem pelo Simepar (Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná).

“Essa situação severa para a rápida propagação de incêndios ambientais deve-se à combinação de alguns fatores, como ausência de chuvas, umidade do ar mais baixa e temperatura. Esse cenário só muda com a ocorrência de chuvas mais volumosas no Estado. Embora esse período seja historicamente mais seco, também temos o agravante de uma crise hídrica que perdura há mais de um ano”, afirma o coordenador de Operação do Simepar, meteorologista Marco Jusevicius.

 

Perdas no campo

No Paraná, as perdas provocadas pela estiagem repercutem em toda a cadeia alimentar. Sem chuvas significativas no momento do plantio de grãos, muitos produtores atrasaram a semeadura, fazendo com que a produção sofresse impacto de pragas e de geadas fora dos ciclos convencionais.

A quebra na produção de milho foi de 58% na segunda safra em relação ao mesmo período da cultura no ano passado. Segundo o Deral (Departamento de Economia Rural) da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento, a estimativa inicial era colher 14,6 milhões de toneladas de milho em 2,5 milhões de hectares no estado. Sem chuvas suficientes, os agricultores paranaenses colheram 6,1 milhões de toneladas na mesma área plantada. Isso significa um prejuízo de R$ 12 bilhões na economia apenas nessa cultura.

O chefe do Deral, Salatiel Turra, explica que, como consequência, o grão está 124% mais caro do que no ano passado, com reflexos na criação de frango, peixe e porco. “O milho é a principal proteína na produção de frango, por exemplo. Os produtores terão que importar o grão, causando impacto no preço dos alimentos para o consumidor final”, afirma.

Maior produtor de feijão no País, o Paraná também viu diminuir em 48% a colheita das duas primeiras safras deste ano. Das 539 mil toneladas esperadas, foram colhidas 282 mil toneladas.

Saúde

O tempo seco contribui para o ressecamento da mucosa das vias aéreas, o que facilita o surgimento de alergias, asma, bronquite, dermatites, gripes e resfriados. E, como consequência, infecções bacterianas secundárias como pneumonia, sinusite, otites e laringites, segundo o pneumopediatra José Orlando Nonino, de Londrina. Como prevenção às doenças respiratórias, o médico indica boa alimentação e a ingestão de água regularmente.  “A criança deve receber líquidos várias vezes ao dia. Esses líquidos podem ser o leite, o suco, mas, principalmente, água”.

Abastecimento de água

Atualmente, 14 cidades da Região Metropolitana de Curitiba, incluindo a capital, têm o fornecimento de água durante 36 horas, com suspensão de até 36 horas. E Pranchita e Santo Antônio do Sudoeste estão em rodízio mais ameno, com suspensão do abastecimento durante oito horas a cada quatro dias.

Outras cidades do Estado seguem em alerta no abastecimento. No Norte Pioneiro, Santo Antônio da Platina, Ibaiti, Quatiguá, Siqueira Campos, Carlópolis e Jacarezinho. Na região oeste/sudoeste, Goioerê, Iretama e Medianeira. Em Cascavel, desde o início do mês, a Sanepar passou a utilizar a captação do Lago Municipal para complementar a produção e atender a demanda da cidade.

A implementação do rodízio e o alerta para uso racional da água foram adotados pela Sanepar para mitigar os efeitos da crise hídrica que atinge o Paraná há mais de um ano, uma estiagem sem precedentes pelo menos nos últimos 50 anos. Chuvas abaixo da média têm reduzido a vazão de rios e poços utilizados para abastecimento humano.

O rodízio tem evitado que sistemas de abastecimento entrem em colapso, permitindo que a água seja distribuída de forma regular para toda a população e não prejudique, assim, moradores das regiões mais altas e distantes dos pontos de distribuição.

Efeitos climáticos

As mudanças do clima não têm precedentes, segundo dados da ONU (Organização das Nações Unidas) ao divulgar no início de agosto o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. Esse é o mais importante relatório sobre ciência climática dos últimos sete anos, recolhendo estudos compilados por pesquisadores do mundo todo.

Os efeitos são eventos climáticos extremos mais frequentes e mais severos como ondas de calor, chuvas fortes e secas em todas as partes do mundo. Segundo o pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Lincoln Alves, que trabalhou no relatório, as observações das últimas décadas mostram que o clima do Brasil está mudando.