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Gomes: da Guiné à Dinamarca, o obstáculo entre a seleção e o gol

Entre a seleção brasileira e o tão esperado gol, que ainda não saiu na Olimpíada do Rio, haverá um defensor que diz não ter medo “de fazer o trabalho sujo”. A dificuldade moldou Edigerson Gomes, dono de uma dentre tantas histórias de imigrantes africanos que sonham mudar de vida na Europa, mas descobrem uma realidade nem tão acolhedora. Da pobreza na Guiné Bissau, chegou a uma favela em Portugal. O risco iminente de derivar pelo caminho do crime fez o pai e a madrasta o levarem a Dinamarca. Entre os percalços da vida, aprendeu a não ter medo. E diz que não teme marcar Neymar, embora reconheça o talento do brasileiro.

Um dos nove filhos de uma família pobre, Gomes jogava nas ruas de Bissau, de onde brotaram jogadores como Éder, autor do gol do título da Eurocopa por Portugal. O futebol acena como uma chance de ascensão social na África, mas ainda demoraria mais alguns anos para acontecer na vida deste defensor de 27 anos e 1,92m. Aos seis anos, em busca de uma vida melhor, a mãe levou Gomes e os irmãos da Guiné Bissau para Portugal. Terminaram morando numa favela no bairro das Marianas, em Carcavelos, a 17km de Lisboa. links futebol 10/08

Graças ao esforço da mãe, que trabalhava com faxina e lavava roupas, entre todas as privações de uma família tão numerosa, só não faltou comida. Mas Gomes cresceu rodeado pelo crime e o tráfico de drogas.

– Meu pai e minha madrasta foram visitar e viram o caminho que eu estava seguindo, um caminho muito ruim. Foi difícil para a minha mãe, mas ela entendeu que era o melhor para mim. E fui para a Dinamarca. Hoje me sinto dinamarquês também, mas quando Éder fez aquele gol, fiquei muito feliz. Abre caminhos para jovens da Guiné. O futebol é uma esperança de sair na pobreza para os africanos – diz Gomes, que chegou à Dinamarca com 11 anos.
Ele diz não ter sofrido preconceito, evita falar em dificuldade de inclusão para os africanos. Tem um olhar rígido sobre a vida. Segredos Olímpicos futebol

– Quem escolhe seu caminho é você. Se você sai da África, consegue chegar à Europa e faz a opção errada, pelo crime, esquece que há outros milhões de africanos que gostariam de ter tido a sua oportunidade. O futebol é um caminho – diz o zagueiro.

A vida o moldou como um jogador duro, como ele próprio se define. Nas peladas de rua na infância na África, diz que já sonhava com o futebol. Mas aos poucos, aprendeu o quanto custaria realizar o sonho.

– Na vida nunca me deram nada de graça. E no campo é assim. Você tem que brigar por seu país, seu time. A vida moldou meu caráter e o futebol é tudo na minha vida. Se não fosse jogador, não sei o que ia ser de mim. Num jogo, não adianta dar 50%, tem que dar 100%. É como eu digo: você escolhe seu caminho.

Nesta quarta-feira, terá Neymar pelo caminho. Medo não lhe passa pela cabeça.

– Não tenho medo de nada, de falhar, de errar, de sair jogando. Neymar é bom jogador, mas é um homem que falha, é só um jogador, um ser humano. Não se pode ter medo de ninguém – afirma Gomes, fã de Rui Costa e de Makelele, mas inspirado pelo francês Thuram. – A maneira que ele joga, um defensor que sai jogando, é como a minha. Sei entrar duro também. Todo time precisa de um jogador que, quando as coisas não estão bem, faz as coisas sujas, o trabalho sujo. Que não tenha medo de cartão, para ajudar a mudar o panorama. Eu sou assim.