Cotidiano

Educador do Ano envolveu alunos com a tragédia do Rio Doce

201610172309351709.jpg SÃO PAULO- Saiu de conversas entre alunos nos corredores do colégio, no início deste ano letivo, a ideia do projeto que deu ao professor de uma pequena cidade no Espírito Santo o prêmio de Educador do Ano de 2016. A iniciativa de Wemerson Nogueira, de 25 anos, da Escola Estadual Antonio dos Santos Neves, em Boa Esperança, promoveu o engajamento dos seus estudantes com a situação do Rio Doce, arrasado pela tragédia ambiental ocorrida após o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco no município de Mariana, em Minas Gerais, no ano passado. educ

Nogueira foi anunciado como o Educador do Ano numa cerimônia em São Paulo, na noite de anteontem. O anúncio foi a etapa final da 19ª edição do Prêmio Educador Nota 10, iniciativa da Globo e do Grupo Abril, organizada pela Fundação Victor Civita em parceria com a Fundação Roberto Marinho para valorizar experiências pedagógicas inspiradoras no Brasil.

Recém-formado e entusiasta de técnicas inovadoras para melhorar a dinâmica em sala, Nogueira percebeu que, no começo deste ano, a tragédia do Rio Doce dominava as rodas de conversas entre estudantes do município de 15 mil habitantes. Ele viu ali uma oportunidade para tornar as aulas de química mais atraentes.

Por seis meses, o professor de ciências orientou cerca de 40 alunos do 9º ano do ensino fundamental a aprender, de um jeito diferente, noções básicas da química. Com jalecos e luvas, para que eles se sentissem ?pesquisadores de verdade?, destaca o professor, os estudantes trocaram a sala pela comunidade litorânea de Regência, último vilarejo do Espírito Santo a ser atingido pela lama que tomou o Rio Doce. Foram cerca de dez visitas ao local em quatro meses, entrevistando moradores e coletando água do rio para análise. O objetivo foi estudar as características da água lamacenta e relacionar os resultados a elementos da tabela periódica, conteúdo das aulas no início de 2016.

O engajamento foi tal que o projeto acabou se desdobrando numa ação social.

? Quando os alunos viram de perto o sofrimento daquelas pessoas, eles me disseram que tinham que fazer alguma coisa sobre aquela água suja. Um deles lembrou de um filtro que uma professora de ciências anterior mostrou numa aula, e começamos a trabalhar num filtro que pudesse servir para os moradores de Regência ? conta o professor.

?Filtrando as lágrimas do Rio Doce” foi, então, o nome dado ao projeto premiado.

? Eles se sensibilizaram, e teve choro mesmo. Mais do que alunos motivados, eles saíram desse projeto cidadãos globais ? defende o professor.

Filho de agricultores com apenas o ensino fundamental completo, Nogueira formou-se em Ciências Biológicas e Químicas pela Faculdade Metropolitana de Santos, no litoral de São Paulo, a cerca de mil quilômetros da cidade onde mora, Nova Venécia. O curso foi cumprido à distância e, logo no início da graduação, ele começou a trabalhar como professor não-habilitado. Há cinco anos, ele dá aulas.

? Eu gosto muito de ensinar. Já fazia isso durante as aulas no colegial. Pretendo inspirar jovens a se tornarem professores.

Nogueira foi eleito o melhor educador de 2016 entre 4.221 professores do país. Dez docentes responsáveis por pequenas revoluções em suas comunidades escolares foram selecionados como finalistas do prêmio.

? Minha escola tem histórico de premiações, e isso ajudou muito. Mas não é a realidade do país. Falta apoio dos governos em geral às escolas. Isto impede uma educação de qualidade ? diz o educador.