Cotidiano

CPI da Lei Rouanet é cenário de discórdia entre petistas e opositores

BRASÍLIA – A CPI da Lei Rouanet, instalada há um mês na Câmara, desponta como um cenário de querelas políticas entre os defensores dos governos do PT e seus opositores. Essa disputa aparece no conteúdo dos requerimentos de convocações dos dois lados. Os antipetistas querem convocar o ator José de Abreu, que tem fortes vínculos com o partido e seus dirigentes, e outros beneficiados pela lei nos últimos anos. Aliados de Lula e Dilma dão o troco e querem levar para depor o ex-presidente tucano, Fernando Henrique Cardoso, e Bia Doria, mulher do prefeito eleito de São Paulo, João Doria, também do PSDB.

No discurso, os deputados acenam com bandeira branca e dizem que o espaço não pode ser para perseguir governos.

? Mas, do jeito que foi criada, só falta dizer aqui que essa é a CPI do PT, restrita aos petistas ? disse Vicente Cândido (PT-SP).

Autor do requerimento para convocar José de Abreu, Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) diz que não quer politizar a comissão e que pretende convocar todos os casos de inadimplência ? segundo ele, é o caso da peça encenada pelo ator.

? Todos que se enquadrem serão chamados. Seja José de Abreu, ou de partido A, B ou C ? disse Cavalcante.

Mas a justificativa de Cavalcante no requerimento é genérica e diz que o objetivo da convocação é tratar de ?questões pertinentes ao objeto desta CPI?. Sem mais detalhes.

Aliado dos petistas, Orlando Silva (PCdoB-SP) defende que a CPI seja propositiva:

? Não é para ser feita uma devassa. Nem ter visão policialesca. Não devemos fulanizar.

A CPI foi criada para investigar escândalos no uso da Lei Rouanet, em especial os que foram detectados pela recente Operação Boca Livre, da Polícia Federal. O relator, Domingos Sávio (PSDB-MG), presidente do partido em Minas, defendeu, primeiro, que se restringisse somente aos últimos dez anos, o que atingiria as gestões de Dilma e Lula. Os petistas protestaram e conseguiram do relator o compromisso de que, se aparecerem casos de irregularidade na obtenção de patrocínio via Lei Rouanet em anos anteriores, esses serão objeto de investigação.

? Não temos interesse em encobrir nada. O pedido de abertura original trata de fatos elencados de 2005 a 2016. Mas podemos fazer sem prejuízo a outras investigações ? garantiu Sávio.

DISCUSSÕES ÁSPERAS

O deputado Jorge Solla (PT-BA) quer levar Fernando Henrique Cardoso, sob o argumento de que o instituto recebeu R$ 14,5 milhões frutos da isenção e está entre os cem maiores beneficiários da lei.

O presidente da CPI, Alberto Fraga (DEM-DF), antevê discussões ásperas na comissão:

? Em algum momento haverá debate mais acalorado. Não tenham dúvida. Mas não é do meu feitio fazer politicagem. No meu currículo não tem parcialidade.

O deputado Izalci (PSDB-DF), autor da grande maioria dos 84 requerimentos apresentados até o momento na CPI, não quer saber de discutir política cultural. Diz que a CPI está ali para apurar irregularidades.

Na última terça-feira, a ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda foi a primeira a falar na CPI. Irmã de Chico Buarque, a artista negou que ele tenha proposto projetos para receber patrocínios por meio da lei durante sua gestão:

? Minha família quase inteira está no meio artístico. Eu procurei todos, quando assumi, para dizer que não poderiam ser proponentes de projeto nenhum. O Chico não foi proponente. As acusações contra mim são de um baixo nível tão grande. Eu não respondo a calúnias.

Em sessão esvaziada, a ex-ministra defendeu que celebridades como Maria Bethânia recebam recursos por meio da lei. Ana foi a única ex-titular da pasta durante as gestões petistas que aceitou prestar depoimento como convidada. Segundo o presidente da CPI, os ex-ministros Juca Ferreira e Marta Suplicy recusaram o convite e podem ser convocados. Gilberto Gil não falará por problemas de saúde. O ministro da Cultura, Marcelo Calero, confirmou audiência no dia 27.