Cotidiano

Centrais nucleares aderem à onda de greves na França

PARIS – Os trabalhadores das usinas nucleares na França se juntaram nesta quinta-feira à onda de greves contra a reforma trabalhista do governo socialista, que tem provocado uma escassez de combustível e outros problemas econômicos. A paralisia crescente do país ocorre a duas semanas para a abertura do Eurocopa, em 10 de junho.

Os sindicatos convocaram um novo dia de protestos, o oitavo desde o início do movimento, há três meses, que em várias ocasiões acabaram em violentos confrontos com as forças policiais. O ápice será uma manifestação em Paris, programada para 14 de junho, quatro dias depois do início do torneio de futebol que o país sediará.

Sob pressão, o primeiro-ministro francês, Manuel Valls, admitiu nesta quinta-feira a possibilidade de ?mudanças? ou ?melhorias? no projeto de lei, e anunciou que receberia representantes do setor petrolífero no sábado. No entanto, o chefe de governo voltou a descartar a retirada do texto controverso.

Na quarta-feira, Valls afirmou que a CGT, que lidera os protestos, ?não dita a lei no país? e nesta quinta voltou a criticar a ?irresponsabilidade? da união sindical. Por sua vez, o secretário-geral da CGT, Philippe Martinez, convocou, , ?uma generalização da greve?.

Os protestos subiram a um novo degrau nesta quinta-feira, com o voto a favor da greve nas 19 usinas nucleares do país.

? Entre 50% e 80% dos funcionários estão em greve, de acordo com as centrais ? afirmou a porta-voz da CGT nesse setor, Marie-Claire Cailletaud, admitindo que, para manter o fluxo, a França ?provavelmente será forçada a importar energia? de países vizinhos.

O organismo que administra a rede elétrica nacional, RTE, afirmou por sua vez que ?a oferta de produção disponível (…) é suficiente para cobrir as necessidades de eletricidade do país?. A oferta foi reduzida em 25% na central de energia elétrica de Nogent-sur-Seine, cerca de 100 km ao sudeste de Paris.

O movimento de protesto também tem provocado interrupções nos transportes. A companhia ferroviária SNCF informou na quarta-feira sua quinta greve desde março.

A Direção-Geral da Aviação Civil (DGAC) recomendou que as empresas reduzam em 15% os seus voos de quinta-feira para o aeroporto Paris-Orly.

Segundo o governo, a lei vai dar mais flexibilidade às empresas para combater o desemprego. Já os seus detratores consideram que aumentará a insegurança no trabalho. Por isso criticam especialmente o artigo 2, que dá primazia aos acordos particulares sobre as negociações de sindicatos profissionais, precarizando as condições de trabalho.

A contestação divide profundamente a esquerda francesa. O governo precisou recorrer a um instrumento constitucional que permite aprovar uma lei sem passar pelo voto no Parlamento, antes de ser tramitada no Senado.

O bloqueio de refinarias e depósitos de petróleo forçou o governo a utilizar suas reservas estratégicas de combustível. O Estado havia utilizado na quarta-feira três dos 115 dias de reservas disponíveis. Cinco dos oito depósitos de combustível permaneciam bloqueados ou operando bem abaixo de sua capacidade, depois que as forças de segurança dispersaram pela manhã os ativistas que bloqueavam um deles.

? Vamos fazer tudo o necessário para garantir o abastecimento dos franceses e da economia ? disse o presidente François Hollande.

FILAS NOS POSTOS

Longas filas se formam há vários dias nos postos de gasolina, que em muitos casos racionam a distribuição. Os depósitos de quase um terço dos postos de combustível estão secos ou quase vazios, enquanto um popular aplicativo para telefones móveis indica onde ainda há combustível disponível.

Viviane, uma aposentada de 66 anos que esperava para abastecer seu carro em Allier (Centro), compara a atual turbulência com as duas semanas de greves e manifestações de 1968.

? Lembro-me de Maio de 68 e posso dizer que a escassez não é brincadeira e eu estou tomando precauções ? disse a motorista.