Cotidiano

Após dez dias parado, Paraná volta a produzir

Prejuízos já somados apenas com os dias parados já passam de R$ 6 bilhões na indústria e na cadeia do agronegócio

Cascavel – Foram dez dias de uma greve que provocou o caos em todo o País e que tomou proporções catastróficas e fora de qualquer controle. Um movimento que começou com a paralisação dos caminhoneiros e uma pauta que tratava da implantação do valor mínimo para o frete, redução do preço do óleo diesel e fim da cobrança de pedágio por eixo suspenso virou um levante popular com pedidos de intervenção militar e a destituição dos três poderes e do presidente Michel Temer. Após o término das negociações, ficou claro que não havia líderes e o que era para ser uma greve de uma categoria virou uma bagunça generalizada cujas perdas devem ser sentidas pelos próximos 60 dias, pelo menos.

A Ocepar (Organização das Cooperativas do Estado do Paraná) e a Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná) confirmam perdas de R$ 2 bilhões apenas na cadeia do agronegócio. Os frigoríficos suspenderam o abate, aves morreram no campo, cargas de grãos e do complexo carne deixaram de ser embarcadas para exportação.

Já a Fiep (Federação da Indústria do Estado do Paraná) estima em R$ 4 bilhões as perdas nesses dez dias de greve.

Além disso, há o desabastecimento generalizado em todo o País. Na terça-feira, após acordos e ordens judiciais, foi retomada a saída das cargas de combustíveis das distribuidoras, mas apenas as maiores cidades haviam recebido cargas até ontem. Nas cidades menores o combustível que chegou foi priorizado para ambulâncias e veículos da polícia. A previsão é de que o abastecimento seja normalizado apenas no fim de semana, assim como o gás de cozinha.

Ontem, os frigoríficos anunciaram a retomada dos abates, inclusive na região oeste do Paraná e houve o início da saída de cargas para exportação que estavam em câmaras refrigeradas. A previsão é de que a retomada completa leve ainda uma semana.

Apenas na região oeste as perdas das cooperativas passam de R$ 300 milhões. Considerando outros setores, esse número chega a R$ 1 bilhão. Esses números ainda vão aumentar devido ao atraso nos alojamentos e à morte de bilhões de animais, especialmente aves. A estabilização total das perdas pode levar até um ano, estima o setor produtivo. Todas as cooperativas da região já anunciaram que devem fechar o ano com prejuízo.

Efetivo militar

dos números negativos, do fim das negociações, do caos instalado, foi preciso que PRF (Polícia Rodoviária Federal), PF (Polícia Federal), PM (Polícia Militar) e Exército fossem para as rodovias ontem para liberar caminhoneiros retidos nos protestos e dissolver grupos que ainda teimavam em fechar as rodovias federais.

Parte do movimento não considera o fim da greve, porém, muitos caminhoneiros já voltaram ao trabalho e um grande número de policiais foi mobilizado para liberar os caminhoneiros após denúncias de que estariam parados mediante pressão dos grevistas.

Em Céu Azul, a quarta-feira começou com mais de 200 homens envolvidos: Polícia Militar, PRF, Choque e Exército, concentrados nos pontos de manifestação para garantir que os caminhoneiros que quisessem voltar para o trabalho pudessem voltar, sem interferência.

Na cidade, o tenente-coronel Washington Lee, acompanhado de outros policiais, conversou com caminhoneiros e pediu compreensão para permitir quem quisessem seguir viagem.

No início da manhã de ontem, equipes da PRF e da Polícia Militar também liberaram caminhões em Cascavel. Foram 250 veículos que começaram a rodar na região e que estavam parados no Trevo Cataratas. Parte dos caminhões estava carregada com ração e ficou retida por dias no pátio de um posto de combustíveis, apesar de o movimento grevista negar seguidamente o bloqueio de cargas e caminhões.

A desmobilização nos pontos de manifestação começou ainda na noite de terça-feira em diversas regiões do Paraná. O Exército também participou da liberação de veículos nas rodovias de toda a região.

Combustível

A situação do abastecimento de combustível em toda a região também só deve ser normalizada semana que vem. Em Cascavel, o que havia de estoque nas distribuidoras acabou. Agora, à medida que os caminhoneiros voltam ao trabalho, os veículos precisarão pegar combustível na refinaria em Araucária, onde a fila está imensa, de acordo com o Sindicombustíveis.

“Acredito que na sexta-feira começamos a entregar nas distribuidoras e nos postos. Etanol será mais rápido, pode ser que amanhã [hoje] já tenha, mas a gasolina e o diesel só na sexta-feira e no sábado. Abastecimento completo apenas na semana que vem, até por conta das filas, que acaba sendo gerada nos postos. Ontem [quarta-feira], à medida que os postos eram abastecidos, acabava o combustível porque muita gente estava à espera”, disse Roberto Pellizetti, diretor-regional do Sindicombustíveis.

Nacional: bloqueios nas estradas custaram R$ 6,6 bi para produtores

Os protestos dos caminhoneiros resultaram em um prejuízo de R$ 6,6 bilhões para os produtores rurais, informou a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).

O valor abrange as perdas relativas ao chamado VBP (Valor Bruto da Produção) Agropecuária, que mede a estimativa de faturamento bruto na produção. Por meio de nota, a CNA informou que esse prejuízo é “apenas na produção primária, sem considerar ainda o processamento, as indústrias e a parte de insumos, que estão tendo prejuízos severos”.

A entidade afirma que o prejuízo será maior, já que se custará tempo até que a situação fique normalizada – o que pode levar de seis meses a um ano, prazo que, segundo a entidade, será o necessário para que os produtores se reestruturem. Diante desse cenário, a CNA alerta sobre a possibilidade de “caos extremos”, caso os bloqueios continuem.

Ainda segundo a nota, há registros de animais morrendo nas estradas, além de desperdício de hortaliças e de leite.

70% do leite produzido no sudoeste foi descartado

Para o setor leiteiro os prejuízos também foram acumulados dia a dia. Apesar de alguns caminhões de leite passarem pelos bloqueios, os laticínios não recebiam o produto desde o início da semana por não possuírem condições de processar, estocar e enviar o leite para os supermercados. O jeito de muitos produtores foi vender para as queijarias, que pagam entre R$ 0,30 e R$ 0,50 por litro, menos da metade do que um laticínio.

Por conta disso, muitos produtores jogaram leite fora, já que a ordenha precisa continuar sendo feita, sob risco de comprometer o plantel. Conforme a Rural Leite Sudoeste, naquela região cerca de 70% da produção foi jogado fora. Nesse caso, o prejuízo é todo absorvido pelo próprio produtor.

Perdas da greve equivalem a meio ano de gastos na Saúde

Em todo o País, as perdas decorrentes dos dez dias de greve equivalem ao valor gasto com a saúde pública durante seis meses. E os números correspondem a dados de apenas 13 segmentos, que indicam perdas de mais de R$ 50 bilhões com fábricas paradas, exportações suspensas, vendas adiadas e animais mortos, entre outros problemas. Em 2017, o Ministério da Saúde gastou R$ 96 bilhões.

No grupo de setores com maiores perdas estão o de distribuição de combustível, que deixou de vender o equivalente a R$ 11 bilhões, e o químico, com perda de faturamento de US$ 2,5 bilhões (cerca de R$ 9,5 bilhões). A cadeia produtiva da pecuária de corte deixou de movimentar entre R$ 8 bilhões e R$ 10 bilhões.

Vários setores não calcularam prejuízos, mas o balanço de suas atividades dá a dimensão do estrago resultante da greve. “Estamos apavorados”, diz o presidente executivo da Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados), Heitor Klein.

Pesquisa feita com associados da entidade indica que metade dos 300 mil funcionários das empresas do setor está ociosa em razão do desabastecimento de matérias-primas. Estoques de calçados prontos, equivalentes a um mês de produção aguardam condições de tráfego para serem despachados aos lojistas.

A indústria automobilística, que mantém a maioria das 40 fábricas de diversas marcas paradas desde sexta-feira (25), deixou de produzir aproximadamente 38 mil veículos. O setor emprega 113 mil funcionários e grande parte foi para casa.

Dados da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) indicam perdas de R$ 3,1 bilhões nas vendas de combustíveis, lubrificantes e hortifrutigranjeiros nos Estados de São Paulo (responsável por quase metade desse valor), Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Bahia e Distrito Federal.