Cotidiano

Amigo de Ron Wood, o artista plástico Ivald Granato é homenageado no filme 'Olé! Olé! Olé!'

unnamed.jpgNesse mundão em mais de 50 anos de estrada, os Rolling Stones, maior banda do planeta, vivem experiências inimagináveis. Cercados por multidões e aparatos, tentam em sua intimidade levar uma vida ?quase normal?, como define bem Mick Jagger no filme “The Rolling Stones Olé, Olé, Olé!: A Trip Across Latin America”, em cartaz no Festival do Rio, sobre a mais recente turnê da banda pela América Latina.

O documentário de Paul Dugdale nos leva a viajar com eles e passear pelos ritmos, sotaques, folclores e o sangue quente latino-americano. Mostram encontros com fãs, a curiosidade da banda com a cultura típica de cada lugar e nos aproximam deles quando saem do palco.

O Brasil, que abre o filme com uma cena em uma favela, na qual um morador ouve Stones em sua laje, traz um momento de intimidade do guitarrista Ronnie Wood. Revela sua paixão pela pintura e a longa e fiel amizade com meu pai, o artista plástico Ivald Granato ? único brasileiro homenageado pela banda no filme.

Em uma cena dentro de um carro, em São Paulo, Ronnie conta que está ?ansioso? para encontrar o amigo. É recebido com um abraço apertado e um recíproco ?I love you? na casa-atelier de meu pai, no bairro Alto de Pinheiros. Ao entrar na sala, surpreende-se com as telas: ?Granato, você sempre tão expressivo e colorido?, elogia Ronnie.

A amizade e a comunicação entre os dois era muito particular. Meu pai não falava bem o inglês e talvez isso os tenha aproximado ainda mais. Quando eu o perguntava como era a conversa, ele ironizava. ?Alice, você acha que eles querem falar inglês? Eles falam inglês todo dia. Entre nós a linguagem é outra.?

unnamed (1).jpgEra a mais pura verdade. São mais duas décadas de amizade, várias turnês em que meu pai e sua mulher Laís viajaram para encontrar a banda. Além de Ronnie, são também muito amigos de Keith Richards, já até se hospedaram em sua casa perto de Nova York.

Com o mesmo tempo de estrada dos Stones, mais de 50 anos de carreira artística, Granato (que nos deixou subitamente há três meses), tinha com Ronnie uma simbiose muito interessante. Um roqueiro que ama ser pintor em seu tempo livre. E um pintor que amava ser roqueiro. Quantos vezes assistimos meu pai tocar sua guitarra elétrica na sala de casa?

A comunicação entre Ronnie e ele era na arte, por isso grandiosa. Extrapolava qualquer barreira. No filme, meu pai o leva para grafitar no Beco do Batman, na Vila Madalena, e mostrar ao Stone novos artistas, mas a maior parte das cenas é em sua casa-atelier.

IMG_1608.JPGFoi ali o cenário escolhido pelo guitarrista para falar da sua paixão particular pela pintura. Como ela o leva a viajar, tanto quanto nas turnês musicais. Nessa parte do filme, as cenas são em slowmotion mostrando os amigos pintando juntos e o gestual deles com os pincéis, em tomadas muito bonitas.

É com muita emoção e orgulho que vi esse longa-metragem retratar meu pai em sua plenitude. Um artista livre, com uma pintura exuberante e um carisma absurdo ? a ponto de ser o escolhido para representar a arte brasileira pela maior banda do mundo. Um dos takes traz a bandeira do Brasil erguida no jardim de sua casa-atelier.

E no final do filme o crédito: “Olé! Olé! Olé é dedicado à memória de Ivald Granato”.

“The Rolling Stones Olé, Olé, Olé!: A Trip Across Latin America” tem sua última sessão no Festival do Rio nesta sexta-feira, às 22h15, no cinema Reserva Cultural Niterói 4.

* Alice Granato é jornalista e escritora e filha do artista plástico Ivald Granato