Noel Rosa já dizia que quem é da Vila (em referência à Vila Isabel, seu bairro) ?nem sequer vacila?. Em terras cariocas, as palavras do eterno sambista devem ser levadas à sério também pelos cerca de 10.500 competidores que passarão pela Vila dos Atletas, na Barra da Tijuca. O espaço, inaugurado hoje, oferece uma série de armadilhas que podem tirar o foco da competição. Os fartos banquetes, os corpos esculturais e as festas são exemplos de distrações que podem jogar toda a preparação de um ciclo olímpico ou até mesmo de uma vida por água abaixo.
Brasileiros que já viveram essa experiência contam que o maior dos pecados da Vila é a gula. Com um banquete aberto 24 horas com quase todos os tipos de comida do planeta, é quase impossível resistir a um lanche a mais. Em alguns esportes, como a ginástica artística, a mordida em um chocolate pode ser o diferencial de uma medalha. Sem citar nomes, a rainha do basquete Hortência conta que viu uma colega de seleção engordar 5kg por causa do sorvete. Obviamente, isso fez diferença na quadra.
Medalhista de prata em Atlanta-1996, a ex-jogadora de basquete, em palestra feita para jovens atletas que vão aos Jogos pela primeira vez, também alertou para um perigo silencioso: o celular. O aparelho integrado ao dia a dia pode causar prejuízo imensurável caso o atleta troque horas de sono e descanso por mais tempo nas redes sociais da moda.
? Em Londres-2012, eu fiquei com o celular e achei que prejudicou um pouquinho, porque é muita gente falando e você quer ficar mais com você. Na Rio-2016, vou desligar Whatsapp, desligar total. Recomendei o mesmo para os mais jovens ? disse Robenilson de Jesus, do boxe.
Depois da gula, a paquera é apontada como o segundo maior ponto de distração ? algo esperado num espaço com 10.500 seres humanos interessantes no auge de suas formas físicas e vindos de todas as partes do mundo. Neste cenário, é difícil controlar o libido. Consciente dos perigos que isso pode gerar, o Comitê Olímpico Internacional informou que 450 mil preservativos estarão a disposição dosinquilinos. Este número é três vezes maior que o de Londres-2012.
? A paquera rola solta. Tem muito flerte. Pode até ser uma maneira de se distrair um pouco, aliviar a pressão. Há também sempre um clube com música, é preciso ter controle para não exagerar ? diz Hugo Hoyama, ex-mesatenista que tem seis participações olímpicas como atleta e, desta vez, ficará na Vila como parte da comissão técnica brasileira.
Ter alguns de seus ídolos de outros esportes convivendo no mesmo espaço também pode ser um problema, pois cria uma sensação de que o atleta já faz parte do topo da elite do esporte mundial e esquece-se que o objetivo ainda não foi cumprido. Dona de duas medalhas de prata no vôlei de praia, Adriana Behar diz que este tipo de situação pode causar deslumbramento nos atletas e, consequentemente, perda de foco. Como gerente do Comitê Olímpico do Brasil, ela fez questão de fazer um seminário com todos os atletas brasileiros para antecipar essas armadilhas.