Opinião

O pão e o afeto de cada dia

Não é só de pão que se vive, mas também de tudo que possibilita existência digna. Para a definição legal, o dever de sustento dos pais para com os filhos menores abrange não só comida, mas também vestuário, saúde, educação, lazer,… Equivocadamente, esse sustento é conhecido como pensão alimentar, dando a falsa sensação de que se relaciona apenas ao pão de cada dia. Daí porque a enxurrada de críticas sobre os valores dos alimentos comumente definidos, que não garantem o mínimo vital.

Mas, pior que a insuficiência dos recursos para o sustento dos filhos menores é a negligência do suprimento do inferior ao mínimo, com o total descaso com as necessidades básicas de quem não tem condições de fazê-lo por si e geralmente fundamentada na misoginia com a desqualificação da mulher no manejo com as finanças. Como se as mães, geralmente, fossem ter um agir paterno de olhar para seus próprios caprichos com prioridade, sustentando nova relação ou mesmo fazendo mimos a si próprias. Os estereótipos engessam qualquer diálogo, ainda que o interesse a ser protegido com prioridade devesse ser o do menor.

Acumulam-se aos milhares ou milhões os processos de execução de alimentos, não havendo mais grande surpresa de prisão por dívida alimentar. É só mais um preso, mas também mais uma vida tornada indigna pelo comportamento irresponsável. A mãe se torna o alimento, desde o ventre ou da lactação até o alimento afetivo do dia-a-dia que carece aos genitores que burlam o cumprimento do mínimo. Porém, a maternidade solitária traz uma carga de responsabilidade e desgaste absurda, que precisa ser compartilhada com alguém: na falta do pai, na rede de apoio, caso em que a responsabilidade acaba sendo assumida pelos avós, voluntariamente ou de forma compulsória.

É possível, portanto, pleitear alimentos dos avós para o suprimento das necessidades vitais dos menores, tendo em vista que a lei define a obrigação alimentar enquanto fundamentada no afeto e nas relações de parentesco de ascendência. Os avós também são ascendentes, de modo que podem ser convocados a se responsabilizar pelo sustento dos netos. No entanto, a obrigação dos avós não é direta, pois não deriva do poder familiar, mas apenas da relação de parentesco. Assim, eles detêm obrigação subsidiária ou complementar àquela que deve ser cumprida pelo genitor, quando este, reiteradamente, descumpre sua obrigação ou está plenamente ausente.

O cumprimento da obrigação pelos avós pode ser alternativa, isto é, não precisa haver pagamento diretamente em dinheiro, podendo ser a assunção de alguma despesa, como plano de saúde ou escola. Uma vez estipulada a obrigação avoenga, ela deve ser cumprida, porque, apesar das controvérsias judiciais, entende-se a possibilidade de prisão civil dos avós quando há manifesta intenção de frustrar o pagamento dos alimentos, ofendendo direito inalienável do menor: a vida.

Não se exige a prestação alimentar para que haja o gozo dos direitos inerentes à relação familiar. Assim, os avós sempre apresentam o direito de convivência com os netos, pois o foco está no convívio familiar e no desenvolvimento adequado da personalidade do menor. O direito de conviver existe ainda que a obrigação alimentar não seja cumprida, como é previsto também ao genitor. O Direito não socorre aos que dormem, mas também nem sempre anda de mãos dadas com o que se pode entender por justiça…

Dra. Giovanna Back Franco – Professora universitária, advogada e mestre em Ciências Jurídicas