Cotidiano

TV estatal do Irã exibe ?House of Cards? para mostrar degradação do poder nos EUA

hoc_ps2_002_h.jpgTEERÃ ? O governo do Irã não hesita em extirpar os símbolos da cultura pop ocidental da sociedade persa ? a não ser que o produto reforce a desconfiança popular em relação aos históricos inimigos americanos. Desde setembro, as autoridades linhas-duras do país exibem ?House of Cards? na TV estatal, para mostrar as trapaças, as enganações e as articulações pelo poder do sistema político de Washington, na pele do ficcional congressista Frank Underwood. A série do Netflix serviria, aos olhos da censura iraniana, como um espelho do quão suja é a política nos Estados Unidos.

No programa, Kevin Spacey interpreta um político da Carolina do Sul que conspira, suborna e ameaça até chegar à Presidência do país. Os profissionais encarregados pela censura no Irã viram na série uma possível divulgação do retrato obscuro de Washington, que inclui até assassinatos no caminho do poder. O foco na narrativa de degradação do sistema político americano, no entanto, exclui as cenas de envolvimento sexual entre Underwood e a repórter Zoe Barnes, papel de Kate Mara, em alinhamento aos critérios morais islâmicos.

? Isso mostra o quão suja é a política nos Estados Unidos ? disse Mohammad Kazemi, um estudante de mecânica na Universidade Azad, na capital iraniana. ? Eles (os americanos) fazem qualquer coisa para ascender ao poder.

Todas as noites, às 23h no horário local, o canal Estatal Namayesh exibe um episódio dublado em Farsi. A nova programação causou rebuliço no Irã, onde as produções americanas são raras e as autoridades não raro denunciam a cultura pop ocidental como decadente e anti-islâmica. Apesar do bloqueio de sites que o governo julga contrários com a tradição persa, vários iranianos, em especial os mais jovens, assistem a programas estrangeiros na internet ou compram DVDs piratas de filmes e séries de TV, de ampla oferta nos mercados de rua do país.

A aprovação partiu do órgão que gera a transmissão audiovisual do país, cujo chefe foi apontado pelo líder supremo aiatolá Ali Khamenei. A história, no entanto, é velha conhecida dos espectadores, que puderam assistir, há algum tempo, à série britânica que inspirou o drama do Netflix.

A estudante Farnaz Rahmani acredita que a TV estatal exiba ?House of Cards? para provar que os políticos americanos são traiçoeiros.

? Para mim, é a chance de preencher meu tempo livre com uma boa série de TV. Talvez seja também a oportunidade de a televisão atrair mais pessoas aos canais iranianos ? conta a menina de 17 anos.

A mídia iraniana também não ignorou a estreia da série na emissora estatal. O website conservador Tabnak elogiou o ?brilhante retrato? por parte de Kevin Spacey. Nas redes sociais, usuários compartilharam um clipe do protagonista com a estrela Robin Wright ? que vive a mulher do congressista, Claire Underwood ? em que discutem, em diálogo dublado para o Farsi, como navegar nos corredores de poder.

??House of Cards? pôde, com habilidade, mostrar a desilusão na complicada esfera política liberal da civilização americana, assim como a deslealdade, a sede por poder, a promiscuidade e os crimes perpetrados por quem comanda o país?, escreveu com o site linha-dura Mashregh.

Nenhum órgão oficial iraniano quis comentar a transmissão de ?House of Cards?. Não há, até por isso, dados disponíveis da audiência do show. É incerto, segundo a agência Associated Press, se existe um acordo entre as autoridades do país e os produtores da série. Não há acordos oficiais sobre proteção de direitos autorais entre as nações, nem o Netflix está disponível no Irã. O serviço de streamming se limitou a informar que não possui licença global para vender a produção.