RIO ? No Brasil existem três espécies de morcegos hematófagos, sendo que uma delas, o Diphylla ecaudata, se alimentam exclusivamente do sangue de aves. Não mais. Pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) descobriram que indivíduos de uma pequena colônia que vivem numa caverna no Parque Nacional do Catimbau, entre o agreste e o sertão pernambucano, também estão se alimentando de sangue humano.
? Todos os registros na literatura indicam que a espécie é especializada em sangue de aves ? diz Enrico Bernard, professor do Departamento de Zoologia da UFPE e coautor do estudo publicado no periódico ?Acta Chiropterologica?. ? Pela primeira vez detectamos sangue humano em uma espécie que se alimenta exclusivamente de aves.
De acordo com o pesquisador, o D. ecaudata está presente em praticamente todo o continente americano, do sul dos EUA até o norte da Argentina, mas a espécie é relativamente rara. A colônia estudada tem apenas cerca de 30 animais.
? Eu estudo esses animais há 20 anos, e foi a primeira vez que tive um Diphylla vivo na minha mão ? conta Bernard.
Os pesquisadores analisaram 70 amostras de fezes, sendo que em 15 delas foi possível extrair o DNA das presas. Em três foram encontrados traços de sangue humano. Também foram encontrados vestígios de sangue de galinhas.
Apesar de a notícia de que um morcego-vampiro está se alimentando de sangue humano parecer alarmante, o pesquisador afirma que não há motivo para pânico. Existe, sim, o risco de o animal transmitir raiva, provocando um problema de saúde pública na região, mas a espécie é especialmente rara, o que minimiza as chances de ataques contra humanos.
O que a descoberta escancara é a negligência com a conservação da caatinga. Normalmente, o Diphylla se alimentaria de aves de grande porte, mas elas desapareceram. Apesar de o Parque Nacional do Catimbau, segundo maior de Pernambuco, ter sido criado em 2002, até hoje ainda existem comunidades vivendo sem seu interior.
? Os morcegos hematófagos são dependentes de sangue, eles são incapazes de se alimentar de outra coisa. O cenário ecológico da região é de uma porção de caatinga desfaunada. As presas desse bicho já desapareceram e, paralelamente, temos a chegada de humanos ? disse Bernard. ? Com os homens chegaram as galinhas, que são criadas como animais domésticos, e as habitações são de péssima condição. A nossa hipótese é que ele está se aproveitando de uma nova oferta de alimento.