Existe uma discussão que já dura algumas décadas: a potencial substituição da mão de obra humana pela mão de obra das máquinas. Isso já foi matéria para a reflexão em várias camadas sociais. Do Jihad Butleriano, descrito nas obras de ficção científica de Frank Herbet, aos movimentos ludistas do início da revolução industrial, que foram bem reais.
No cinema, homens e máquinas são comumente antagonistas, como na série Terminator. Na vida real, geralmente, é o contrário. As máquinas ajudam os humanos a fazerem suas tarefas da melhor forma possível. Porém, esse medo da obsolescência humana sempre assombra diversos profissionais.
Sendo assim, é clara a necessidade de uma discussão em cima desse tema. A ficção costuma falar de forma alegórica sobre os problemas da realidade, e a realidade costuma dar indícios do que realmente é preciso ser mudado para que o progresso possa ser respeitado, sem que a sociedade fique estagnada.
Antigamente, o medo era do robô do chão de fábrica. Hoje, um dos maiores medos é a inteligência artificial. Mas, o fato é que as pessoas aprenderam a lidar com os maquinários. As profissões se adaptaram. E o mesmo deve acontecer com as AIs.
Advogados e médicos, por exemplo, já começam a usar o Watson, inteligência artificial da IBM, para realizar análises de dados de forma mais precisa e, através delas, fazerem processos e diagnósticos mais precisos, que atendam melhor a seus clientes e representem ganho de tempo em seus escritórios e consultórios.
No chão de fábrica, a Indústria 4.0 está permitindo que mais dados sejam coletados e analisados para que produtos melhores sejam criados, falhas sejam detectadas com antecedência, e a segurança de funcionários e clientes aumente. A mão de obra humana se restringe a análise dos dados para um julgamento estratégico.
Sim, é verdade que há aqueles que têm de mudar, que precisam adequar seus estudos e expertises para uma nova realidade, mas isso faz parte de um processo de evolução contínuo em que a própria humanidade está inserida.
O trabalho humano é muito mais cerebral, e sempre deveria ter sido. As AIs não funcionam melhor do que o cérebro humano. Elas nem se quer funcionam da mesma forma. São tipos de processamentos de informação bem diferentes, que não suplantam um ao outro, mas se complementam em suas necessidades.
Há quem possa vir a criticar que dependemos demais das máquinas. Porém, esse é um problema com o qual precisamos lidar tanto quanto nossos antepassados que inventaram a roda, e desde então pararam de arrastar as coisas por aí. Faz parte da evolução. É uma adaptação que vem com o desenvolvimento do próprio ser humano.
Na indústria, encontramos problemas de integração entre o homem e a máquina no dia a dia. Normalmente, isso se dá porque o ser humano, muitas vezes, se mostra relutante em compreender que seu papel também mudou. Não somos mais mão de obra braçal. Somos mentes em trabalho. É difícil se acostumar a isso, principalmente quando desde pequenos somos tratados como máquinas.
No Brasil, sobretudo, não há incentivo ao trabalho mental. Convencemos as pessoas de que elas só sabem apertar parafusos, colocar tijolos um em cima do outro, soldar placas. Quando, na verdade, deveríamos estar dizendo a elas para pensar em materiais melhores para que os encaixes sejam feitos sem parafuso, que casas durem mais e sejam construídas mais rápido, e possamos imprimir peças de metal já no formato correto, sem precisar de solda.
É justamente aí que entra a mudança na forma de enxergar as coisas. A busca pela qualidade, pelo processo ideal para extrair o melhor do ser humano, é reeducar as pessoas. Esse é o futuro, e o meio por onde mitos como da “substituição dos humanos pelas máquinas” deixarão de ser discutidos. Ou talvez, fiquem apenas na lembrança de bons filmes e livros da ficção.
Alexandre Pierro é fundador da Palas, consultoria em gestão da qualidade e inovação e engenheiro mecânico pelo Instituto Mauá de Tecnologia