Policial

Polícia diz que atiradores previam morrer em ataque

Garotos de 15 anos disparam dentro da sala de aula e atingem dois alunos

Medianeira – A rotina escolar do Colégio Estadual João Manuel Mandrone, em Medianeira, foi quebrada violentamente na manhã de ontem por tiros, gritos e correria. Dois estudantes baleados. Outros dois detidos. Uma manhã para nunca mais ser esquecida.

Por volta das 8h30, dois jovens atiraram em colegas na sala de aula. Os adolescentes gravaram vídeos falando sobre o ataque, pediam desculpas e culparam colegas por praticarem bullying. O atirador deixou uma carta dentro da mochila. A polícia acredita que se tratava de uma despedida, já que os meninos previam um confronto armado com a Polícia Militar e acreditavam que não sobreviveriam.

Outros vídeos correram as redes mostrando alunos correndo e o desespero na hora do atentado.

O delegado da Polícia Civil de Medianeira, Denis Merino, não revelou o conteúdo da carta, mas ressaltou que o material encontrado pela polícia, assim como os vídeos feitos pelos adolescentes e os celulares apreendidos, seriam alvo de perícia. As redes sociais dos adolescentes também passarão por análise.

A polícia encontrou armas de pressão, bombinhas e recortes de reportagens sobre atentados ocorridos no País e até no exterior que serviriam como base para o plano na casa de um dos adolescentes. Em um dos vídeos o rapaz coloca a culpa nos colegas pelo atentado e diz que era humilhado, citando nome diversos alunos. “Este bullying que ele sofria era tanto verbal como físico. Como as provocações não pararam, ele resolveu colocar o plano em prática, em parceria do amigo. Na casa desse menino havia desenhos de tendência nazista”, afirma o delegado, que ressaltou que o crime foi premeditado.

A Polícia Civil também teve acesso a uma foto que mostra o adolescente autor dos disparos municiando uma arma. “A arma usada era do pai do menino e o garoto sabia onde ela estava. Em razão das armas que foram encontradas, os pais serão autuados em flagrante por posse ilegal de arma de fogo”, reforça o delegado. O crime é passivo de fiança e os pais podem responder em liberdade.

Os adolescentes foram ouvidos e ficarão à disposição da Justiça. “No caso de adolescentes, todo procedimento é feito conforme o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]. Os menores de idade são apreendidos em flagrante, o Ministério Público representa e a Justiça define como será o encaminhamento para socioeducação”, explica a promotora da Vara da Infância e Juventude, Ana Cláudia Luizotto Bergo.

Pais sabiam de bullying

Os pais do menino autor dos disparos sabiam do preconceito que ele era vítima na escola. Bastante abalados, eles conversaram com a reportagem do Jornal O Paraná na delegacia de Polícia Civil: “Chamavam ele de Zé Patrola por ser do sítio, e de outros nomes”, contou o pai. “Ele sempre falava que sofria preconceito por ser gordinho, ser do interior, mas eu sempre conversei com ele a respeito”, disse a mãe.

Os pais estavam trabalhando quando os vídeos começaram a ser divulgados nas redes sociais. “A gente nunca imaginava que uma coisa assim pudesse acontecer. Ele é um menino tranquilo, nunca teve problema na escola, e agora estamos aqui, sem saber o que vai acontecer”, desabafou o pai, em tom de desespero.

Segundo o diretor do Colégio, Darlan Chiamulera, eles eram meninos tranquilos e disse que a escola não sabia de bullying sofrido pelo atirador. “Não há nada que nos diga que eles não eram bons alunos. Temos palestras frequentes sobre bullying, conversamos sobre o assunto e eles nunca chegaram à direção reclamando a respeito”, defendeu-se o diretor.

Atiradores pediram para amigos saírem da sala

Era um dia de aula normal. Os alunos entraram para a escola mas dois deles ficaram do lado de fora da sala do 1º ano do Ensino Médio. Eles foram chamados pela equipe pedagógica para justificar por que não entraram. Logo depois, um deles vai para a sala de aula e chama alguns amigos para que saíssem da sala. Um deles se recusou. Foi então que ele entrou e ameaçou os colegas e efetuou os disparos. Um deles atingiu o amigo que não atendeu seu pedido de sair do local. Agora, ele está internado em um hospital e nem sabe que talvez não voltará a andar.

Relatos de estudantes e funcionários revelam o terror: “Os dois meninos saíram correndo com as armas, eu fui até a sala e pedi para que os demais ficassem ali, com a porta trancada. Alguns saíram correndo por medo. Eu fui pessoalmente atrás dos dois que estavam armados para tentar conversar com eles. Certamente, eu não era um alvo, porque caso contrário eles teriam atirado”, conta o diretor da escola, Darlan Chiamulera.

“É uma cidade pequena, tranquila, há anos não havia uma ocorrência na escola. Agora precisamos usar isso como instrumento para ensinar que não é com arma que as coisas se resolvem”, complementa o diretor, que decidiu fechar o local logo depois do crime.

Não há previsão de quando as aulas voltarão. Muito menos de quando a rotina voltará a ser normal. Um acompanhamento psicológico deve ser providenciado para alunos e trabalhadores.

Durante à tarde, os materiais dos alunos permaneciam na sala de aula vazia. O local passou por perícia da Polícia Civil e alguns alunos voltaram pegar os pertences. Quem faltou à aula por acordar tarde respirou aliviado, mas sofre pelos colegas traumatizados. “Eu vi tudo o que aconteceu só depois. Um amigo meu ficou com a arma apontada na cabeça. Eu estava com ele há poucos minutos na minha casa, e ele chorava o tempo todo”, contou um adolescente de 15 anos.

Conforme as investigações preliminares, os dois alunos que foram feridos não eram os alvos dos adolescentes acusados do atentado. Os dois de 15 anos e foram levados para atendimento médico. O menino chamado pelo atirador para sair da sala mas ficou teve a bala ficou alojada na segunda vértebra lombar. “Ele não corre risco de morrer, mas pode perder a mobilidade das pernas, total ou parcial”, contou o pai do adolescente.

Ele disse que o filho não tem vida social com os colegas fora da sala de aula, que é compenetrado nos estudos e que não ouviu, ou não deu importância, quando foi chamado para fora pelo atirador.

Policiais foram recebidos a tiros

A Polícia Militar foi acionada e encontrou a dupla de atiradores em uma sala de aula trancada. A PM deu voz de abordagem, a qual não foi acatada. Os militares forçaram a entrada e foram recebidos a tiros. Um dos policiais quase foi atingido.

Os garotos acabaram se rendendo e foram levados para a Delegacia de Polícia Civil. Com eles foram apreendidos um revólver garrucha calibre .22, 65 munições do mesmo calibre intactas, seis munições deflagradas, três caixas de bombinhas rojão com 56 unidades ao todo, uma faca, duas bombas de fabricação caseira e uma mochila.

Garantia do Estado

A governadora Cida Borghetti divulgou nota lamentando o episódio e anunciou que o Estado garantiu todo o atendimento médico necessário aos garotos. Um estudante foi ferido de leve com um tiro de raspão, foi medicado e liberado. Outro ferido, baleado nas costas, foi removido e internado no Hospital Municipal Germano Lauck em Foz do Iguaçu.

Cida classificou o episódio como “triste e lamentável”. “Determinei todo apoio às famílias das vítimas, do autor dos disparos e à comunidade escolar. Vamos reforçar ações de proteção às nossas crianças e de prevenção ao bullying em todas as escolas da rede estadual”, garantiu Cida.