Policial

Em busca da “liberdade”

Hoje em casa, em tratamento contra o câncer, a busca é uma só: ter a liberdade de cuidar das duas filhas, de 7 e de 8 anos. Não que ela não considere um erro o homicídio, que cometeu em 2013, no “calor” da emoção. O arrependimento é constante, de alguém que nunca teve passagem pela polícia, nem participa de organização criminosa, e cometeu, na vida, o que considera como o único e grande erro.

Matou, se arrependeu, aprendeu a valorizar a vida e ficou doente, dentro da prisão. A história da mulher, escrita nestas linhas, renderia muito mais do que duas páginas de um jornal.

“Livre” desde o dia 19 de janeiro, ela luta contra um câncer de colo de útero maligno, que está em estágio avançado e se espalhou pela bexiga. Depois de muita luta na Justiça, ela foi para casa acompanhada da tornozeleira eletrônica, que precisou ser retirada por conta do tratamento radioterápico.

Detida pela polícia e em regime fechado desde a data do crime, a detenta, que não será identificada, tem a rotina resumida às radioterapias e quimioterapias na Uopeccan, e a casa onde mora, de favor, com uma amiga.

Mas em toda essa história, o caso poderia ser menos grave se ela não tivesse passado por um diagnóstico errado, ainda dentro da prisão.

“As presas fazem exame ginecológico todo ano. Quando eu estava na Penitenciária de Piraquara, em novembro de 2016, já deu que eu estava com alteração, e que deveria ser investigado. Mas nada foi feito. Depoisde um tempo, comecei a sentir muita dor. Fiquei quatro meses menstruando mesmo a base de antibiótico. No fim de 2017, já quando havia sido transferida para Foz do Iguaçu, o médico me mandou fazer a biópsia, que comprovou o câncer. Mas eu já tinha tirado uma das trompas, um tempo antes, estando presa”, conta a personagem, que acredita que só foi liberada porque três meses antes de descobrir a doença, uma presa morreu em decorrência do câncer, dentro da Penitenciária de Foz do Iguaçu.

A tristeza começa ao pensar que o tratamento apenas começou, mas, ao fim das radioterapias, no dia 30 deste mês, a tornozeleira será, novamente, a companheira do dia a dia. E há possibilidade de, ao fim do tratamento, que ela volte para a prisão. “Minhas filhas pedem que eu não volte mais para aquele lugar. Elas entendem muito bem a situação toda, estudam… Me visitavam na prisão, porque na época elas eram menores. Agora, já estão acostumadas com a minha companhia. Quero ficar com as minhas filhas”, pede.

Parceria

Condenada a 23 anos e quatro meses de prisão, ela teria de cumprir ao menos nove anos e seis meses em regime fechado. Já se foram seis anos da pena. O tratamento, segundo ela, leva cinco anos. Sem poder trabalhar, ela depende da parceria de uma amiga, que mais considera como um anjo, para cuidar das crianças. “Ela fica com minhas filhas desde que eu fui presa. Dependo deles para meu sustento, porque não posso trabalhar, minhas filhas dependem disso e fui abandonada pela minha família”.

O advogado que acompanha a presa foi designado, na época do crime, pelo Estado, e virou advogado particular. E, segundo ela, antes mesmo de ela ser liberada para tratamento médico, a tentativa era de que ela tivesse direito a prisão domiciliar, para poder cuidar das filhas, que não têm assistência paterna. “Porém, a Justiça não entendeu que elas precisavam de mim e eu continuei presa. Por isso, minha amiga lutou na Justiça para ficar com a guarda provisória, porque se não as duas acabariam em um abrigo”.

A intenção é esperar o fim do tratamento e entrar na Justiça contra o Estado cobrando a negligência médica.

A prisão

A personagem, que passou por três prisões diferentes no Paraná, conta como era a vida dentro da cadeia. “Sempre tive bom comportamento. Me formei costureira dentro da prisão, e sempre trabalhei, o que também me ajudou a ser liberada. A vida na prisão é muito difícil. Ficávamos em um cubículo de 2 metros por 3 metros. Com três beliches. A comida vinha azeda. Comíamos pasta de dente para matar a fome. Ficávamos sem água, de ter vontade de beber a água do vaso sanitário de tanta sede, porque as guardas deixavam a gente sem água. Fora a humilhação com os familiares quando eles vão visitar. Além das vistorias, quando minha amiga levava comida, os guardas humilhavam dizendo que não tinha que levar, que da próxima vez iam jogar fora. Entravam nos cubículos, quando iam fazer vistoria, e estragavam as nossas coisas. Chamavam a gente de vagabunda pra cima, uma agressão psicológica muito grande”, desabafa.