SAINT-ETIENNE-DU-ROUVRAY, França ? Após terem degolado um padre que rezava uma missa, os jihadistas que atacaram uma igreja francesa tiveram uma conversa surpreendente com duas religiosas mantidas reféns. O relato sobre o que aconteceu no interior do templo veio do jornal católico ?La Vie?. Os terroristas e as freiras falaram de religião, paz e morte nos momentos que antecederam a chegada da polícia.
Quando o padre Jacques Hamel, de 86 anos, já estava morto e um fiel estava gravemente ferido, os dois terroristas mudaram subitamente de comportamento. Até então, eles haviam mantido uma atitude agressiva e furiosa.
? Tive direito a um sorriso do segundo ? afirma a freira Huguette Péron, que estava no local. ? Não um sorriso de vitória, mas um sorriso doce, de alguém feliz.
A irmã Hélène Decaux, de 83 anos, e a esposa do fiel ferido, com mais de 80 anos, pediram para se sentar. Um dos assassinos aceitou.
? Pedi minha bengala e ele me deu ? conta a freira.
Depois, a conversa se voltou para a temática religiosa. Um dos homens perguntou à irmã Hélène se conhecia o Alcorão.
? Claro, respeito como respeito a Bíblia. Já li várias suras. As suras que falam de paz me tocaram particularmente ? respondeu a religiosa.
Em resposta, um dos terroristas lhe disse:
? A paz, isto é o que queremos. Enquanto houver bombas na Síria, continuaremos com os atentados. E haverá todos os dias. Quando pararem, pararemos ? disse, acrescentando uma pergunta também inesperada: ? Você tem medo de morrer?
Diante da resposta negativa da freira, o extremista perguntou por que.
? Creio em Deus e sei que serei feliz ? responde a irmã Hélène que, segundo contou ao jornal, neste momento encomendou sua alma à virgem. Pensou então em Christian de Chergé, o prelado do mosteiro de Tibehirin, na Argélia. Ele foi assassinado com outros seis monges em 1996.
Com a irmã Huguette, a conversa foi sobre Jesus:
? Jesus não pode ser homem e Deus. São vocês que se enganam ? afirmou o assassino.
? Talvez, mas o que importa? ? respondeu a freira. Mais tarde, ela relatou que ofereceu sua vida a Deus, pensando que ia morrer.
? Visivelmente, esperavam a polícia ? diz a irmã Hélène. Pouco depois, os dois homens tentaram sair usando as três mulheres como escudo humano. ? Mas não se colocaram totalmente atrás de nós. Seria possível dizer que caminhavam para a morte.
Presente na missa quando os extremistas chegaram, uma terceira religiosa, a irmã Danielle Delafosse, conseguiu sair da igreja e dar a voz de alerta.
Os dois terroristas aparecem em um vídeo divulgado pelo Estado Islâmico manifestando lealdade ao grupo. As imagens foram mostradas na quarta-feira pela agência Amaq, ligada aos extremistas.
No vídeo de um minuto, os dois homens falam em árabe e fazem referência a Abu Bakr al-Baghdadi, líder do EI. Um deles segura um laptop com a imagem da bandeira do grupo. E embora se identifiquem como Abu Omar e Abu Jail el-Hanafy, a agência os identificou como os autores do atentado – muitos mudam de nome ao entrar para o grupo.
Os dois terroristas degolaram o padre Jacques Hamel, de 86 anos, na igreja de Saint-Etienne-du-Rouvray e feriram um outro refém durante o ataque. Um deles foi identificado como Adel Kermiche, um jovem nascido na França com distúrbios comportamentais e obcecado pela Síria, para onde tentou viajar duas vezes.
O segundo homem envolvido foi formalmente identificado como Abdel Malik Petitjean, de 19 anos. Ele estava em uma lista de observação da autoridades francesas como potencial ameaça à segurança desde junho, após tentar entrar na Síria a partir da Turquia.