Todos os anos a cena se repete: candidatos correm desesperados para pegar os portões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ainda abertos. A tendência de deixar quase tudo para a última hora, no entanto, não acontece só no dia da prova. Um estudo do Laboratório de Pesquisas da UniCarioca, realizado com 1.224 estudantes que farão a prova, revelou que 39% ainda não começaram a se preparar para o exame, que será aplicado nos dias 5 e 6 de novembro. De acordo com os dados, somente 14% estão estudando com afinco desde o ano passado. fies
? Esses resultados estão relacionados a um comportamento do brasileiro de deixar para fazer as coisas em cima da hora. A maioria dos alunos acha que se fizer assim vai dar conta do recado, mas na verdade isso não acontece. Tem muita gente que pensa que não precisa se preparar porque acha que o que aprendeu em sala de aula é suficiente para ter um desempenho bom. A preparação é importante. Temos que perder esse mau hábito, somos muito operacionais e pouco estratégicos ? comenta o coordenador do Laboratório de Pesquisas da UniCarioca, Jalme Pereira, que participou do estudo.
“AGORA BATE O DESESPERO”
O relatório aponta que 27% estão se preparando há cerca de três a seis meses. Outros 20%, há menos de dois meses. A iniciativa de estudar para valer demorou um pouco a chegar para Eduardo Neves, de 18 anos. Postulante a uma vaga de Engenharia de Produção no vestibular deste ano, o jovem conta que só agora nas férias intensificou a rotina em favor da prova que acontece em novembro.
? Agora estou correndo atrás. Estou estudando o dia todo, mesmo estando de férias. Também pedi umas dicas para um professor para estudar melhor e aproveitar o tempo ? afirma Eduardo, contando ainda que modificou a rotina. ? Estou ficando menos no computador, jogando menos e usando menos o Facebook. Como está mais perto da prova, agora bate o desespero.
A pesquisa mostra que, de todos os entrevistados, 57% buscam uma vaga nas universidades públicas do país, justamente as instituições que, na maioria das vezes, apresentam maior concorrência no vestibular.
Dharana Araújo está entre os candidatos ao Enem que tentarão uma vaga no ensino público. Mas, embora queira entrar para o curso de Cinema na Universidade Federal Fluminense ? que no ano passado chegou a registrar um índice de 55 candidatos por vaga ?, ela admite que só pouco tempo antes das férias despertou para a realidade.
? Caiu minha ficha quando fui mal em uma prova de química e comecei a pensar que, além da escola, precisava passar no Enem. Eu sempre me acostumei a deixar tudo para véspera e tenho que aprender a não fazer isso. Quando as aulas recomeçarem pretendo sair menos com meus amigos e estudar um pouco mais ? diz Dharana.
Outro aspecto interessante da pesquisa é a falta de confiança dos alunos no conteúdo ensinado em sala de aula. Os dados mostram que, na rede estadual, 71% deles não acham que o conteúdo aprendido é suficiente para obter um ótimo desempenho no Enem. A taxa cai para 40% nas escolas federais e para 33% nas instituições particulares.
? Por um bom tempo a aprovação era automática nas instituições públicas e, quando não há uma avaliação balizadora, existe essa desconfiança. Nas particulares há muitos simulados e provas que podem contribuir para uma sensação de ?estar preparado?? explica o pesquisador Jalme Pereira.
O calcanhar de Aquiles de muitos candidatos também foi exposto no estudo. Segundo a estatística, quando o assunto é redação, 28% dos estudantes têm dificuldade para selecionar e organizar argumentos para defendem seu ponto de vista no texto. Depois desse quesito, 22% dos alunos apontam como obstáculo compreender a proposta da redação e, a partir dela, utilizar conceitos de todas as áreas do conhecimento para abordar o tema.
O quadro, na opinião da educadora Andrea Ramal, autora do livro ?Redação excelente?, é um reflexo do distanciamento dos alunos brasileiros com a leitura.
? O que está por trás disso é a falta de intimidade do estudante brasileiro com leitura, escrita e interpretação de textos. Eles sabem o que dizer, mas têm dificuldade de fazer isso na forma de um artigo estruturado. Além disso, a proposta da redação exige capacidade de interpretação. Aplicar conceitos de diversas áreas é uma competência que exige visão global. A impressão é que o que o estudante brasileiro aprende ainda está muito solto na cabeça dele, e ele não consegue fazer todas as ligações de sentido ? diz ela, acrescentando a necessidade de abrir os olhos para a prova: ? Há ainda um mau hábito do estudante brasileiro ?deixar para a última hora?. Mas vale o alerta: quem não começou, precisa fazer isso imediatamente.
Para otimizar os estudos até a prova, o professor do Pensi Marcelo Tavares orienta que os alunos tentem captar a ?essência? de cada conteúdo e não pensem em estudar tudo. Além disso, é preciso ter método:
? Ao contrário de querer absorver a matéria como um todo, é preciso pegar o que é mais importante. Quanto mais desenvolver habilidade de filtro, mais preparado o candidato ficará. É fundamental também estabelecer uma metodologia. Por exemplo, quando estudar uma disciplina, dê um intervalo de três dias para estudá-la novamente.
Coordenador de vestibular do Colégio Qi, Renato Pelizzari orienta os alunos ?atrasados? a resolverem provas anteriores e manterem a calma.
? Agora esses estudantes também não devem estudar tudo de uma vez para não ficarem exaustos. Como o Enem não é uma prova convencional ou meramente conteudista, se o aluno conseguir pegar os pontos mais importantes, chegar no exame tranquilo e administrar bem o tempo, ele pode conseguir ter um bom desempenho.