“Graduei-me em Engenharia Mecânica na universidade de que hoje sou reitor. Fiz pós-doutorados na Itália e na Holanda e hoje me concentro em resgatar o prestígio da Trinity, fundada em 1592. Vim ao Brasil para debater a educação como saída para crises, experiência que tive no crash da Irlanda, em 2010, bem pior que o de vocês.”
Conte algo que não sei.
Estive no Brasil por uma semana. Vim convidado por alguns professores brasileiros e eles me persuadiram sobre oportunidades de parcerias para criar conexões com as grandes universidades do Brasil. Foi um redemoinho de dez dias.
E o que encontrou aqui foi animador?
Há muitas possibilidades, em Engenharia, especialmente. Já há projetos em que europeus e brasileiros formam times virtuais para trabalhar juntos. Discuti com reitores uma colaboração que beneficiasse os alunos, tanto localmente quanto via Skype. E percebo que nossa crise foi pior que a de vocês: lá, cortamos salários em 20%, enquanto aqui não há algo parecido.
E o que você achou das universidades brasileiras?
Creio que você sabe que há ótimas universidades no Brasil. O que eu não sabia é que boa parte da capacidade é desempenhada pelo setor privado. Não esperava essa diversidade.
Que tipo de diversidade?
O setor privado demonstra mais dinamismo. O setor público também é bom, mas precisa de boa dose de infraestrutura, o que é uma necessidade das universidades públicas. Acontece em todo o mundo. Mas eu imagino como ficará essa balança daqui a dez anos.
Por quê?
A universidade pública brasileira é uma verdadeira exceção no mundo. As universidades da Irlanda já foram como as brasileiras, 100% públicas, assim como mudou nos EUA, com a maior parte dos fundos vinda de outras fontes. Nossas universidades não recebem a maior parte dos recursos do governo: 43% de nossas verbas vêm do Estado. O resto é via filantropia, contratos de pesquisa com a indústria e taxas estudantis, sobretudo de pós-graduados. Participei de debate em que brasileiros suscitaram que há uma questão de ideologia. Se for, não é uma ideologia sustentável. Na Irlanda, não somos bons com ideologia, somos pragmáticos.
Como vê a função da universidade hoje?
O nosso desafio é o de ser uma universidade global. Hoje, 40% dos nossos professores são de fora da Irlanda, e 25% dos nossos estudantes vêm de outros países. É preciso perguntar onde a universidade se encaixa no cenário global. O ranking nacional não faz mais diferença. Os jovens irlandeses já pensam: ?Não quero ir pra Trinity, quero Stanford.? É uma forma de pensar que não havia nos anos 1980, 90. Só que os pais e os filhos estão pensando nisso agora, e isso muda o jogo.
E quais seriam as novas regras, na sua opinião?
Uma universidade deve ser razoavelmente boa em tudo que ensine, mas precisa ter picos de excelência internacional e competitividade. Por exemplo, nosso centro de pesquisa em envelhecimento humano obteve US$ 107 milhões de uma fundação chamada Atlantic Philantropy para trabalhar em parceria com a Universidade da Califórnia-São Francisco. Isso só foi possível porque éramos visíveis uma para a outra.
Mas e quando os professores decidem mudar de país? A fuga de cérebros não é um cenário preocupante?
Se for só uma pessoa, eu não me preocuparia. Se cinco quisessem se mudar, aí seria preciso uma estratégia para reverter a situação. Você pode ter 200 professores, mas só dois têm reais chances de ganhar um Nobel e criar um patamar.