RIO ? Todos que trabalharam com o jornalista Wilson Branco Martins, mais conhecido como Lula Branco Martins, têm histórias guardadas sobre a maneira criativa e empolgada com que ele conduzia suas pautas. Com passagens pelo GLOBO, Jornal do Brasil e Veja Rio, veículos em que foi repórter, editor, colunista e crítico musical, além de fundador da revista ?Rio, Samba e Carnaval?, Lula escrevia principalmente sobre o Rio, sua cultura e comportamento dos seus moradores. Era um especialista no espírito do carioca.
Quando organizava a cobertura dos desfiles no Carnaval, por exemplo, pela qual era um apaixonado, fazia antes uma brochura e distribuía aos repórteres, com todo tipo de informação sobre cada escola de samba ? repetindo, enfaticamente, até os artigos que acompanhavam os nomes das agremiações (?Não é a Salgueiro, mas o Salgueiro!?, repetia ele, que apesar de gostar muito da história de todas, torcia para a Unidos da Tijuca, na qual chegou a disputar dosi sambas).
Para encontrar os programas mais inusitados da cidade, promovia eleições curiosas com personalidades e leitores, às vezes, juntando todos na mesma foto. Era uma característica marcante de Lula fazer roteiros não-óbvios pela cidade, de maneira a instigar o leitor a circular por um Rio diferente ? ?O melhor frango de padaria do Rio?, por exemplo, era um mote que nas suas letras virava um banquete.
? Lula participou de coberturas históricas, como do 11 de setembro, da morte de Tom Jobim e Ayrton Senna, era um especialista em Chico Buarque, resgatou Osvaldo Montenegro, participou das últimas edições impressas do Jornal do Brasil ? lembra Ítala Maduell, colega de trabalho, que escreveu com ele o livro ?Da favela para o mundo?, sobre a história do Afroreggae. ? Ele amava o Rio. Estava organizando o projeto de animação ?As mil do Rio?. Lula adorava rimas, mas era ímpar. Não teve filhos, mas deixa muitos órfãos: os amigos de escola, a turma do Clã, dezenas de ex-estagiários, centenas de ex-alunos, muitos amores, mil amigos.
Nas redes sociais, a assessora de imprensa cultural Rachel Almeida escreveu: ?Depois que virei assessora de imprensa, me ?infernizava? com verdadeiros questionários sobre os personagens, que podiam ser humanos ou não, uma vez perguntou onde morava o boneco-protagonista de uma peça de teatro, quantos anos tinha e por onde já tinha viajado. Os resultados sempre compensavam, e ele se importava, mandava mensagem querendo saber se eu tinha gostado. (…) Honra mesmo foi depois ter podido conviver tanto tempo com ele, uma pessoa realmente generosa e divertida.?
Também jornalista, o amigo Ulisses Mattos listou histórias divertidas de Lula: ?Há 18 anos, Lula fazia em sua casa um encontro anual de admiradores dos Beatles, para jogar um quiz que ele bolava, mostrar descobertas sobre a banda e dar palestras sobre alguma teoria sobre o grupo. Fui a todos desde o primeiro, quando tinha só quatro ou cinco convidados. Num deles, ficamos trancados na cozinha por quase uma hora. Quando chegamos na sala, tinha uma banda cover tocando Beatles. Era a Pepperband, que passou a ir aos encontros nos anos seguintes?
Outra era a de um ?livro? em que ele pedia para as visitas assinarem, quando iam à sua casa: ?Quando houve 100 assinaturas (ou 500?), rolou uma festa em que ele deu presentes pros que mais vezes foram lá, com alguma característica ligada a pessoa. Ganhei uma mola (uma vez fiz o livro sair de casa e voltar pra eu assinar), minha esposa ganhou uma almofada (ela sempre acabava dormindo nas visitas).?
Foi Lula quem inventou o formato de ?listas? muito antes que virasse mania na Internet, quando colunista do Jornal do Brasil, elencando os ?melhores filmes com finais interrompidos? ou ?músicas que não tinham refrão?. Na hora de vender uma pauta, fazia cartazes coloridos, puxava um violão ou dançava no meio da redação, para alegria dos que formavam sua plateia. Tijucano e torcedor do América, casado com a jornalista Amanda Barros, era formado em Jornalismo pela PUC-Rio em 1990, dava aulas na instituição desde 2006.
Lula Branco Martins tinha 53 anos e morreu na segunda-feira, no Rio, vítima de um AVC.