Se há 20 anos a internet começou a alterar a forma de as marcas se
comunicarem, hoje o mundo digital continua trazendo desafios para a
publicidade. Mas as mudanças, até bem pouco tempo restritas às redes
sociais e aos vídeos sob demanda, ganham fôlego extra com as quase quase
2 mil segmentações, lista que inclui até os meios mais tradicionais,
como televisão, rádio e mídia impressa (jornais e revistas). Em um
mundo que vai além de Facebook e Twitter, as empresas vêm descobrindo a
cada dia nova plataformas de comunicação, nascidas de start ups a
gigantes da tecnologia, como Snapchat, Uber, Spotify e a febre do
momento Pokemon Go, de realidade virtual.
Na tentativa
de se aproximar cada vez mais dos consumidores, o publicitário Armando
Strozenberg, presidente do Grupo Havas, diz que a proliferação de novas
plataformas fez com que a publicidade deixasse de pensar em apenas um
meio para veicular uma mensagem. Hoje, continua o especialista, o
esforço é criar narrativas diferentes para momentos específicos. Segundo
dados do Kantar Ibope Mídia, a TV reponde por cerca de 62,9%, seguido
de internet (com 9,7%), TV paga (9,2%), jornais (8,2%), revistas (4,6%),
rádios (3,6%), mídia exterior (1,3%) e cinema (0,6%).
–
Antes se planejava um anúncio para jornal, outro para revistas, um spot
para rádio, comerciais para televisão. Hoje, tudo se desdobra na
internet ou spots em streaming de emissoras de rádio que se esparramam
até o Spotify. Das antigas quatro segmentações de uma campanha, ela pode
ser trabalhada hoje em 1.920 segmentações. Os banners não são mais
estáticos. Pode-se montá-los em tempo real de acordo com o comportamento
digital do consumidor. A publicidade não pensa mais em termos de meio e
mensagem, raciocina-se em contato e narrativa: qual é a melhor
plataforma para tocar as pessoas em determinado momento. O fato é que há
hoje muito maior possibilidade de contato, personalização e
diferenciação – afirma Strozenberg.
A internet
trouxe ainda mudanças nos outros meios, com a mídia imprensa, por
exemplo, buscando ampliar plataformas de contato com o consumidor,
exemplifica Strozenberg. As redes sociais, por exemplo, trouxeram
interação; depois os celulares inteligentes, como o iPhone (da Apple) e o
Galaxy (da Samsung), adicionaram os aplicativos e os recursos de
localização , ampliando o conhecimento das marcas sobre a vida “ontime”
das pessoas, destaca Strozenberg.
– A internet
transformou o consumo de conteúdo em algo on demand. E com isso todo
mundo passou a fazer conteúdo. Esse é um comportamento que veio para
ficar, com o conceito de experiência – pondera Strozenberg.
FORÇA DO CELULAR
Flávio
Martino, sócio da agência Giacometti, destaca a força do celular, que
vem ganhando importância a cada ano com novos aplicativos e hoje é o
principal elo entre o real e o virtual. Com isso, o o consumidor virou
multi-telas. Por isso, diz o especialista, a mensagem publicitária
passou a estar acima das plataformas:
– Essas
novidades trouxeram um novo comportamento ao consumidor. Não é uma mídia
que vai impactar o público, mas o conjunto. Pedimos táxi de forma
diferente. Compramos o que queremos sem precisar sair de casa. Diria que
moldou o mundo que estamos e criou novas gerações totalmente
incorporadas à este novo mundo – diz Martino.
Com
todas essas transformações, Marcos Facó, professor do MBA em Marketing
Digital da Fundação Getulio Vargas (FGV) brinca dizendo que a
publicidade saiu do “romaticismo da criatividade no fim dos anos 1990
para o pragmatismo da performance atualmente”. Isso porque, afirma ele,
é possível identificar hoje os passos dos clientes, seja com os
impactos das peças gráficas e da busca ou com o clique de compra. Mas o
desafio, destaca, é o que faz o consumidor clicar em determinado
conteúdo.
– Assim, a principal mudança foi
que o consumidor passou a deter o poder de se relacionar com as marcas
de igual para igual. As marcas passaram a concorrer não mais com outras
marcas, mas com as pessoas. O principal desafio é entender o
comportamento deste novo consumidor. Entender as razões que os levam a
usar as redes sociais ou a ler uma notícia. Como busca determinado
produto, qual tipo de navegação percorreu até a compra. Temos as
ferramentas para os efeitos, que são as métricas. Mas ainda não temos as
ferramentas adequadas para as causas – destaca Facó.
Com
a internet – que em alguns casos já chega a responder por até 80% da
verba publicitária de grandes clientes de consumo -, o vídeo vem
ganhando importância entre as empresas por ser o meio mais fácil de se
comunicar, acredita Gustavo Otto, vice-presidente de Planejamento da
agência NBS. Segundo ele, a maior importância ocorre pelo fato de que as
gerações mais novas não assistem televisão de modo tradicional e sim
através de YouTube, Facebook, Netflix e Snapchat.
–
Mas cada canal tem características específicas. No Facebook, há suporte
de subtítulos e outros elementos gráficos, porque as pessoas tendem a
ver o vídeo sem volume. O YouTube funciona como uma nova TV. E o
Snapchat é o reino do improviso e do amador, já que a estética da rede é
não ter produção. Um fato interessante é que o Snapchat influencia o
jeito de consumir videos.Além da questão do tempo limite, é a única rede
que os videos são gravados na vertical, o que permite ver mais vídeos,
em menos tempo, sem ter que mudar a posição do celular, como nas outras
redes. Tudo isso aparece como novidade para a publicidade – diz Otto. –
As pessoas não estão atras de monólogos, mas de diálogo. Aos veículos
caberá flexibilizar algumas regras e se tornar mais parceiros na
produção de conteúdo.
CONSUMIDOR PARCEIRO
É por isso que Fabro
Steibel, professor de Comunicação Digital da ESPM Rio, diz que a
publicidade nos últimos 20 anos ganhou, além da internet, outro
parceiro: o consumidor.
– Hoje a publicidade
tem que ser criativa e espalhável. As pessoas tem que poder comentar, se
apaixonar, compartilhar e recriar. Uma imagem vale mais que mil
palavras, um vídeo vale mais que mil imagens. Vídeos que consumimos hoje
são curtos e interessantes. Todas as plataformas estão investindo
nisso. Mas o que seria hoje do primeiro sutiã da Duloren se tivéssemos
Snapchat? Provavelmente, a criatividade que Washington Olivetto colocou
naquele comercial se adaptaria aos dias de hoje – pergunta Steibel.
Ele
diz ainda que a internet traz novos desafios, como a forma de calcular o
retorno financeiro de uma campanha. Ele cita um exemplo:
–
Monetizar a publicidade é uma tarefa cada vez mais complexa e com cada
vez mais intermediários. Uma rede social veicula o anúncio criado pela
agência, que circula em um jornal e que será compartilhada em uma
aplicativo de mensagens instantâneas. Como monetizar isso? Pela
produção do anúncio ou pelo consumo? Pela exibição da peça ou pela
reação a ela?
Bruno
Dreaux, sócio da agência digital AMO, acredita que os meios
tradicionais, como TV, rádio e mídia impressa, ainda são relevantes. Mas
os especialistas ressaltam que o papel vem mudando. Eles citam o uso da
convergência em portais digitais. André Pedroso, vice-presidente de
criação da agência Momentum Brasil, diz que o Brasil, pelo seu tamanho,
ainda depende da televisão, jornal e rádio para levar a informação a
todos os cantos do país.
– Os veículos
tradicionais hoje estão tentando se adaptar a um novo comportamento de
leitura e de audiência do consumidor. Se uma marca não estiver aberta a
manter o diálogo de forma sincera com o consumidor, através dos novos
meios, ela sem dúvida vai fracassar. Agora, temos a tecnologia VR (de
realidade virtual,que vem fazendo sucesso com o game Pokémon Go). Quando
for mais difundida, os vídeos poderão incluir o consumidor nos
roteiros. Ele vai poder participar ativamente de um roteiro – prevê
Pedroso.
Agora, o setor já traça o futuro: a
publicidade sob demanda, como o Uber oferece transportes e o AirBnB
serve hospedagem. A ver.