Numa votação apertada, os britânicos decidiram desfazer 43 anos de aliança com a União Europeia (UE), uma iniciativa histórica que muda o papel do país no cenário mundial e dá nova forma ao mapa da Europa. Seduzidos pela retórica de um populismo nacionalista e xenófobo, 52% dos eleitores que foram às urnas optaram por buscar o sonho de um passado glorioso, apesar de alertas sobre as graves consequências políticas, sociais, econômicas e culturais da decisão.
Segundo estimativas do Tesouro britânico, do FMI e do Instituto de Estudos Fiscais, o impacto na economia será de uma queda acentuada do PIB e uma drástica redução da arrecadação do país. Meio milhão de pessoas perderão o emprego, e os preços de imóveis (uma das medidas de riqueza pessoal) deverão encolher 10%. A reação dos agentes financeiros foi de pânico, gerando um efeito dominó nos mercados, à medida que os investidores calculavam o custo da resolução britânica. A libra chegou a cair 8%, para seu menor patamar desde 1985.
A decisão também ameaça dividir o próprio Reino Unido, já que Escócia e Irlanda do Norte votaram pela permanência na UE, enquanto Inglaterra e País de Gales, pela saída. Analistas sugerem que os dois primeiros poderão realizar plebiscitos separatistas para se unirem ao bloco europeu. Isso representaria o fim do Reino Unido.
O Brexit revela ainda a força crescente do Ukip, partido de extrema-direita nacionalista, que defende bandeiras anti-imigração e eurocéticas. Não à toa, a deliberação dos britânicos animou agremiações similares na própria UE, como a Frente Nacional, de Marine Le Pen, na França.
Com a derrota, o premier David Cameron anunciou que renunciará. Ficou evidente o temor dos britânicos menos politizados, que veem o fluxo de refugiados e a imigração em geral como uma ameaça, assim como o descontentamento com as elites políticas tradicionais, representadas por trabalhistas e conservadores, incapazes de solucionar problemas como o desemprego e a perda de benefícios sociais ante a globalização. Neste cenário, a concentração de poder em Bruxelas, sede da UE, é apontada como uma das razões da decadência do país.
O perfil dos eleitores é eloquente. Os britânicos mais velhos, saudosos de uma pátria grandiosa e heroica, apoiaram a saída, ao passo que os mais jovens votaram pela permanência na UE. Os residentes nos grandes centros urbanos, com modo de vida mais cosmopolita e alta escolaridade, também optaram por ficar no bloco, enquanto os moradores de regiões do interior preferiram sair.
O Brexit não será imediato e terá que ser ratificado pelo Parlamento, mas seu impacto já se fez sentir nos mercados e deve servir de alerta aos líderes políticos sobre as ameaças crescentes colocadas pelas forças populistas do atraso. Em risco está o projeto de integração do bloco que abriga mais de meio bilhão de habitantes e tem importância geopolítica crucial para o Ocidente.