RIO – O presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Leonardo Pereira, está preocupado com a possibilidade de a escassez de servidores no órgão refletir negativamente na inspeção do Fundo Monetário Internacional (FMI) pela qual a autarquia passará este ano. Em entrevista ao GLOBO, Pereira ? cujo mandato termina em 14 de julho ? afirmou que ?se o Brasil tem uma nota baixa em uma inspeção como essa, é algo que tem impacto? e prometeu pedir a realização de um novo concurso.
? Vamos pedir de novo um concurso este ano, para 2018. Tem que pedir um ano antes para entrar no Orçamento. Estamos levantando isso publicamente para depois não afirmarem de que não foi alertado. Vamos sofrer uma inspeção internacional este ano e eles vão ver isso. Um dos princípios é se você tem pessoas suficientes e capacitadas para exercer seu mandato. Se o Brasil tem uma nota baixa em uma inspeção como essa, é algo que tem impacto ? disse o presidente da autarquia, responsável por supervisionar o mercado de capitais brasileiro.
Pereira referiu-se Financial System Stability Assessment (FSSA), inspeção sobre a solidez do sistema financeiro promovida a cada cinco anos em todas as economias do G-20. O trabalho é conduzido pelo FMI em parceria com o Banco Mundial. A última vez que o Brasil foi avaliado foi em março de 2012. De acordo com Pereira, ainda não foi definida a data da inspeção este ano.
Em documento publicado em dezembro, a autarquia queixou-se que a falta de concursos públicos periódicos tem levado à redução do quadro de servidores. Segundo o texto, a perda acumulada é de 240 profissionais em oito anos. Ao fim de 2017, estima-se que a CVM terá 173 profissionais a menos do que o previsto, resultando em um déficit de servidores de 28%, ?o que acarretará prejuízos diretos às suas atividades, em especial as de supervisão e sanção.?. Dessa forma, ?o quadro da autarquia retrocederia a níveis similares aos de 2009, quando a criticidade da situação motivou a realização de um novo concurso.?
PROJETO SOBRE MULTAS VOLTA À ESTACA ZERO
Em quase cinco anos de mandato, Pereira não conseguiu ainda fazer valer uma de suas bandeiras: a elevação das multas que podem ser aplicadas pela CVM. Hoje, o valor é de R$ 500 mil, mas há anos existe um projeto do Ministério da Fazenda que busca elevá-lo para R$ 500 milhões. Segundo o presidente da autarquia, o que impediu que ele se concretizasse foi a sucessão de trocas de ministros depois de Guido Mantega, que saiu em 2015. Ele já foi sucedido por Joaquim Levy, Nelson Barbosa e Henrique Meirelles.
? Ele está no mesmo lugar que estava no fim de 2015. Só que tinha um ministro, e o ministro mudou. Sempre que muda, a coisa vai para a estaca zero. Mas continua muito importante, e eu mencionei isso no meu voto do caso Henrique Pizzolato. Teve um diretor que gostaria de dar uma pena maior e não conseguiu. Eu disse que também achava que o caso pedia isso mas que a lei não permitia ? disse.
Em dezembro, o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil foi multado em R$ 500 mil por irregularidades no repasse de recursos a agências de publicidade. Segundo Pereira, tratou-se de um caso ?que certamente merecia pena maior?.
? Houve ali um desrespeito total ao seu dever fiduciário. Ele desrespeitou todos os controles internos, criando um controle paralelo para que alguém assinasse as notas e não colocassem o destino… A pena não é para estar incluída no custo da transação. Deve ser proporcional e tem que ter um fator para desencorajar as irregularidades ? disse.
PROCESSOS MAIS RÁPIDOS
Se não conseguiu avançar no que diz respeito às multas, Pereira observou que sua gestão conseguiu tornar mais célere a atividade sancionadora. A CVM afirma ter reduzido, desde 2013, de 11 para 2 anos a idade dos processos que têm potencial para irem a julgamento. Quanto aos inquéritos que estão em instauração, o tempo caiu de 7 para 3 anos, segundo a autarquia. No caso dos processos que aguardam para serem instaurados, aqueles no primeiro estágio da tramitação, a redução foi de 7 para 1 ano. Segundo Pereira, esse tempo de 1 ano está dentro do ideal.
Tramitam hoje na CVM 19 processos sobre a Petrobras, dos quais quatro prontos para julgamento, seis em estágio de instrução e nove em análise.
Segundo Pereira, sua rotina não mudará nos seis meses que tem pela frente no comando da CVM. Após sua saída, deve aproveitar os seis meses de quarentena para estudar em uma universidade no exterior.