RIO Ele comanda um dos maiores esquemas de sonegação fiscal do país, acreditam as autoridades que já o investigaram. Por onde passou, deixou dívidas milionárias em tributos. Manteve conexões com o PMDB, o PT e o PCdoB, provavelmente em busca de blindagem. E agora aparece ligado a fraudes nos fundos de pensão de estatais. Mas onde está o empresário e advogado Ricardo Magro, perguntam os agentes da Polícia Federal que desde sexta-feira tentam prendê-lo.
Ricardo Andrade Magro, dono do grupo que controla a Refinaria Manguinhos e uma rede de distribuidoras de combustíveis, é considerado foragido da Justiça. A 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro autorizou a prisão do empresário, junto com outras seis pessoas, por desvio de R$ 90 milhões em recursos dos fundos de pensão Petros, da Petrobras, e Postalis, dos Correios, na aquisição de debêntures (títulos mobiliários) do Grupo Galileo.
Dos sete, quatro ainda não foram presos. Dois deles, Ricardo Magro e Márcio André Mendes Costa, ambos do Galileo, tiveram os nomes lançados na difusão vermelha da Interpol por suspeita de estarem no exterior Magro, nos Estados Unidos; e Márcio, em Portugal.
Além de comandar a refinaria, Magro era um dos sócios do Galileo na época da transação fraudulenta. A Operação Recomeço, deflagrada pela PF e pelo Ministério Público Federal, apurou que o grupo emitiu, em dezembro de 2010, R$ 100 milhões em debêntures, a pretexto de angariar recursos para recuperar a Universidade Gama Filho. O dinheiro captado, segundo as investigações, foi ilegalmente desviado para outros fins, em especial para contas bancárias dos investigados, o que levou à quebra definitiva da Gama Filho, com danos a milhares de estudantes.
O esquema prejudicou os fundos de pensão Postalis e Petros, que amargaram prejuízo de R$ 90 milhões ao adquirir em 2011 as debêntures do Galileo. De 2011 a 2015 (governo Dilma), a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ETC), patrocinadora do Postalis, foi dirigida por Wagner Pinheiro. O mesmo dirigente também comandou por oito anos a Petros (governo Lula). Já Adilson Florêncio da Costa, ex-diretor financeiro do Postalis e um dos três presos na sexta-feira, é apontado como indicação do PMDB.
A gravidade dos supostos crimes cometidos é potencializada por dois fatores sociais cruéis: o prejuízo em suas aposentadorias sofrido pelos segurados dos fundos de pensão afetados e o irreversível dano a milhares de alunos lamentou o procurador regional da República Márcio Barra Lima, do grupo que conduziu a investigação.
As conexões de Magro com o mundo político não são recentes. Na Operação Alquila, de 2009, a polícia fluminense revelou que o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afastado pelo Supremo Tribunal Federal da Presidência da Câmara, prometeu, em conversa com Magro, pressionar a Braskem a retomar a venda de gasolina A para Manguinhos. A investigação sustentou que o combustível era despejado no mercado fluminense em operações ilegais com sonegação de ICMS. Manguinhos se valia dos benefícios fiscais concedidos a refinarias e adquiria a gasolina A, já industrializada, como se fosse insumo. A empresa de Magro, porém, não produzia uma gota de gasolina.
As mesmas gravações também revelaram que Magro, na época, foi recebido pelo então senador Edison Lobão Filho (PMDB-MA), em Brasília. O encontro foi agendado por um assessor da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Depois disso, decisões tomadas por dirigentes da ANP, indicados pelo então ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, pai do senador, favoreceram as empresas do grupo Magro.
Outro personagem citado no inquérito é o ex-superintendente de Abastecimento da ANP Edson Menezes da Silva. Flagrado por interceptações telefônicas em conversas com gestores da refinaria, Edson foi membro da direção estadual do PCdoB gaúcho. Sendo assim, pertencia ao mesmo partido do então presidente do Conselho Administrativo de Manguinhos, Felipi Rizzo.
Os petistas também tiveram ligação com a refinaria. Em 2008, o ex-secretário de Comunicação do PT Marcelo Sereno passou pelo comando de Manguinhos como integrante do Conselho da Grandiflorum, que tinha o controle acionário da refinaria.
Na ocasião, Eduardo Cunha admitiu as conversas com Magro, mas negou envolvimento em qualquer tipo de esquema de fraude. Os demais políticos citados, também ouvidos pelo GLOBO na época, negaram conhecer o esquema.
A família Andrade Magro começou atuando na revenda de combustíveis e lubrificantes em São Paulo. Nos anos 1990, logo após entrar no ramo, tornou-se um dos principais grupos dos chamados novos entrantes (distribuidoras TM, JPJ e Dínamo, entre outras). Foi o grupo que mais usou liminares para escapar da tributação de 1998 a 2004. Mais tarde, levou o mesmo modelo, sustentado pela indústria de liminares, para o Paraná e para o Rio, onde a refinaria se transformou no quartel-general do esquema.
Os investigadores da Operação Recomeço não afastam a hipótese de ligação entre a fraude contra os fundos de pensão e as operações ilegais da refinaria. Também estavam foragidos até ontem Carlos Alberto Peregrino da Silva, do Galileo; e Luiz Alfredo da Gama Botafogo Muniz, da Gama Filho.