BRASÍLIA – O avanço do desenvolvimento humano no Brasil está 41% mais lento nesta década, comparando o crescimento anual do indicador que mede o bem-estar social entre 2011 e 2014 (1% ) com a média verificada de 2000 a 2010 (1,7%). Depois da queda substancial no ritmo das melhorias, apontada pelo estudo Radar Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (Radar IDHM), lançado hoje, a tendência é de recuo já no próximo levantamento, em função da crise econômica.
– É possível que já venha retrocesso nos próximos estudos, quando pegarmos os dados de 2015 e 2016, em função da estagnação da economia, que impacta a renda e, em consequência, as outras dimensões avaliadas, que são Saúde e Educação — afirma Andréa Bolzon, coordenadora do Programa das Nações Unidas (Pnud) no estudo apresentado.
Segundo Andréa, é praticamente impossível que o resultado negativo do PIB em 2015, que decresceu 3,6%, não gere impactos drásticos nas próximas avaliações do desenvolvimento humano no Brasil. O Radar IDHM, que fez uma análise das tendências, é fruto de uma parceria entre Pnud, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fundação João Pinheiro.
O levantamento usou os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) então disponíveis, de 2011 até 2014, para comparar o ritmo das melhorias, por meio de taxas anuais, ocorridas num período anterior, de 2000 e 2010, com base nas informações dos censos. Foram avaliadas três dimensões gerais que compõem o índice principal: Renda, Longevidade e Educação. A que mais preocupa é a relacionada ao nível de instrução da população, sobretudo dos jovens.
Um dos destaques negativos é a estagnação das pessoas com 18 anos ou mais que tinham ensino fundamental completo: 60,1% em 2011 e 61,8% em 2014. O crescimento, portanto, foi de 0,5% ao ano, contra uma taxa média de 3,3% no período censitário usado para comparação. O crescimento lento das pessoas de 18 a 20 anos com ensino médio completo (de 2,4% anualmente de 2011 a 2014, ante 5,1% de 2000 a 2010) também é apontado como grave.
— O que nós chamamos mais atenção, como alerta para as políticas públicas, é a educação. É a dimensão que traz os indicadores piores. E que tem consequências graves para o mercado de trabalho e para o bem-estar das pessoas — disse Marco Aurélio Costa, coordenador de estudos setoriais urbanos do Ipea.
Segundo os pesquisadores, não é possível apontar as causas específicas dos índices ruins da educação, mas algumas mudanças no foco das políticas podem ter causado impacto. Para Andréa Bolzon, do Pnud, o enfraquecimento do ensino de jovens e adultos em algumas regiões pode explicar parte dos problemas, embora ela ressalte ser ainda cedo para fazer reflexões definitivas.
— De forma geral, quando a economia não vai bem, isso tem impacto na educação. As pessoas precisam parar de trabalhar para ganhar o pão. Mas não dá para afirmar os principais fatores. A partir dos dados, precisamos pensar juntos como isso se explica, as consequências e orientar as ações para melhorar — diz.
Preocupam estados como Alagoas, Pará e Sergipe, que têm os menores IDHMs em Educação: 0,603, 0,592 e 0,591. Os dois últimos estados estão na faixa do baixo desenvolvimento humano, cujo índice vai de 0,500 a 0,599. E Sergipe ainda ficou estagnado, entre 2011 e 2014, ao lado do Espírito Santo, em que houve recuo de 0,002 no indicador.
Na dimensão Longevidade, o avanço foi global, sendo que todas as unidades da Federação estão nas faixas de alto ou muito alto desenvolvimento humano. Segundo os pesquisadores, o indicador que mede basicamente a expectativa de vida ao nascer não é tão sensível quanto os demais em relação à crise econômica. Os impactos, segundo eles, são menos imediatos.
No indicador Renda, veio a grande surpresa do estudo. Andréa Bolzon admite que não esperava verificar um aumento nos ganhos das pessoas, de R$ 104,9 na renda familiar per capita média para o país, dentro do cenário de crise já verificado no período analisado.
Ela destacou, porém, que a desigualdade permaneceu estagnada. Em 2014, por exemplo, a maior renda per capita média do país, de R$ 1.606 no DF, era quase quatro vezes superior a menor renda, em Alagoas, de R$ 414. Para Andréa, o governo precisa lançar mão de outras políticas caso queira combater a desigualdade:
— Há uma opção da política pública, que tem sido voltada para alívio da pobreza. Mas para diminuir a desigualdade, é preciso outros tipos políticas, como taxar grandes fortunas, heranças. Mas é claro que houve aumento expressivo na renda das pessoas, com políticas de valorização do salário mínimo, de atrelar isso aos benefícios previdenciários, mas não foram suficientes (para redução da desigualdade).
Apesar de os períodos de comparação serem diferentes — 2000 a 2014, em relação a 2000 a 2010 –, Marco Aurélio Costa, do Ipea, defende que há comparabilidade nos dados porque se avalia tendências por meio das taxas anuais de avanço ou recuo do índice de desenvolvimento humano, que aglutina indicadores nas dimensões longevidade, educação e renda.