BRASÍLIA – Em uma mudança radical de tom do presidente Michel Temer sobre o sistema penitenciário, o uso das Forças Armadas em presídios estaduais é visto no Palácio do Planalto como uma resposta à ameaça “iminente” de colapso das carceragens. No governo, as operações futuras dos militares são comparadas à Força de Pacificação do Complexo da Maré, pelo caráter provisório e pelas surpresas das operações. Cada governador deverá solicitar ajuda federal, e o presidente Temer decidirá caso a caso.
O Planalto decidiu também cancelar a reunião do presidente Temer com todos os governadores, que estava prevista para esta quarta-feira. A intenção é dividi-los em grupos menores, de acordo com perfis dos presídios. Rio Grande do Norte, Amazonas e Roraima ? estados em que houve massacres que somam mais de 130 presos nas últimas duas semanas ? devem estar na comissão mais crítica, o que deve demandar ações duras dos militares, com as tropas para operações mais críticas. Estados com situação menos drástica, como Espírito Santo, devem ter ações focadas na apreensão de armas e drogas. Segundo a Constituição, os estados são os responsáveis pelas prisões ? à exceção dos presídios federais ?, e o uso de agentes federais deve ser consentido.
A ideia de usar as Forças Armadas é comparada à Força de Pacificação do Complexo da Maré, no Rio, já que as ações serão pontuais e com tempo limitado. Assim que a situação voltar à normalidade, o governo estadual retoma a gestão. Os militares ficaram um ano e três meses no complexo da Maré, que tem 15 favelas e cerca de 150 mil pessoas, e realizaram 83 mil ações, 674 prisões e 255 apreensões de menores. As inspeções periódicas das Forças Armadas serão feitas de surpresa, e ainda não se sabe quais tropas irão para quais presídios. O orçamento também é desconhecido.
Auxiliares do presidente Michel Temer argumentam que a Força Nacional não daria conta da situação “dramática” das carceragens brasileiras, e que o governo teme que a crise se espalhe para outros estados. A medida é vista como uma resposta mais concreta à crise penitenciária, e com potencial de impacto em curto prazo. Esses auxiliares também preveem que o combate dos militares deve ser muito mais “duro” do que os das forças de segurança estaduais.
? Se as rebeliões continuarem e chegarem a outros estados, a panela estoura ? disse um assessor do Planalto.
Horas antes de órgãos de inteligência definirem o uso dos militares nas prisões, o governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria (PSD), alertou que pode haver um “novo Carandiru” em um presídio do seu estado, onde uma rebelião foi recomeçada, se a polícia do estado intervir.
? Se a polícia entrar dentro do presídio, pode haver novas mortes, confrontos policiais, aí vai ser um novo Carandiru. Temos que evitar isso. Vamos entrar em casos de extrema necessidade ? afirmou o governador, referindo-se à prisão de Alcaçuz.
O começo da crise penitenciária, com 56 presos brutalmente assassinados em um presídio de Manaus, foi a segunda maior matança de presos no Brasil, ficando atrás apenas da que aconteceu no presídio do Carandiru, em 1992 em São Paulo, quando 111 presos foram mortos.
O presidente Michel Temer, que nesta terça-feira anunciou uso das Forças Armadas nos presídios, só se pronunciou quatro dias após o massacre de Manaus, para chamá-lo de “acidente”. Na semana passada, temendo a segurança nacional, ele admitiu que as condições nas prisões do Brasil são “desumanas” e que o tema causa “angústia”.