RIO ? Se na coreografia ?Umusuna?, apresentada no Rio em 2013, a Cia. Sankai Juku investigava a Terra e sua origem pré-histórica, em ?Meguri?, a nova obra do grupo japonês de dança-butô, a proposta é mergulhar num elemento dominante na constituição e na imagem do planeta: a água ? responsável por cobrir mais de 70% da superfície terrestre. Ver a Terra como um planeta d?água, regido por seu fluxo, é um pouco do que a obra propõe. E é como se o coreógrafo Ushio Amagatsu tivesse revisto aquela célebre fotografia da Terra tirada pela Apollo 17 (?The blue marble?) e decidisse submergir nas águas daquela pequena esfera azul solta no cosmos. A forma circular da Terra, sua movimentação rotatória, o fluxo das águas e a relação entre a terra e o mar são alguns dos elementos que se destacam naquela imagem, e são esses, também, os alicerces que sustentam a nova criação do coreógrafo, que será apresentada na Cidade das Artes neste fim de semana, em duas únicas sessões: neste sábado, às 21h, e no domingo, às 18h.
? ?Meguri? é um verbo que se refere a fenômenos como a água em movimento circular, e também a tudo o que gira ? diz Amagatsu em entrevista ao GLOBO. ? É um termo que usamos para tudo o que se move ou circula seguindo uma ordem ou um sistema pré-descrito, como a passagem do tempo, o ciclo das quatro estações e todas as transições de eras pelas quais a Terra já passou.
DIÁLOGO ENTRE A TERRA E O MAR
Além de refletir sobre as transformações pelas quais a Terra atravessou, ?Meguri? traz como subtítulo a expressão ?Mar exuberante, Terra tranquila?, e também investiga a relação entre os mares e as porções de terra firme.
? A inspiração geral para esse trabalho veio da observação dos ciclos temporais da História da Terra, mas a partir daí, dentro de um escopo mais específico, busquei observar os organismos vivos que habitam os oceanos profundos, e o modo como esses organismos interagiram com outras formas de vida que, posteriormente, colonizaram a Terra.
Assim como as demais obras do repertório da Sankai Juku, ?Meguri? desvia-se de uma investigação antropocêntrica, e não reflete sobre temas, dilemas ou conflitos da espécie humana. Em vez disso, suas obras criam movimentos e gestos que possibilitam ao espectador observar, através dos corpos humanos, o modo como se movimentam e se comportam os elementos que constituem o planeta e, também, o universo.
? O que me interessa, realmente, é investigar essa incrível história de lutas e dinâmicas que se desenvolveram na Terra e no universo ao longo dos últimos milhões e milhões de anos, e não os pequenos aspectos da nossa vida cotidiana ? diz. ? E acho que é isso que faz com que espectadores do mundo todo se conectem com o sentido universal das minhas peças.
Segmentada em sete partes ? ?Um clamor à distância?, ?Transformação do fundo do mar?, ?Duas superfícies?, ?Premonição ? Quietude ? Tremores?, ?Floresta de fósseis?, ?Entrelaçamentos? e ?Retorno? ?, ?Meguri? se desenvolve diante de um cenário que reconstitui fósseis de criaturas marinhas da Era Paleozoica, e busca, a partir da aproximação com as noções de fluxo e circularidade, enfatizar ?a dança, o aspecto dançado, que é mais evidente que em obras recentes? diz Amagatsu.
? É um trabalho em que evidencio, nessa ordem, movimento, imagens e sons ? diz. ? Por ter decidido falar de ciclos, rotações e interações, senti que deveria coreografar mais meus dançarinos, criar movimentos que acompanhassem esse sentido, e isso nos levou a testar diferentes formas de movimentação, alguns ligados aos mundos de outros animais e vegetais. Movimentos que evidenciam as restrições e as superações que os organismos vivos tiveram de enfrentar desde os tempos mais antigos, desde as águas mais profundas, para que chegassem aqui, nos dias de hoje.
Serviço ? ?Meguri?:
Onde: Cidade das Artes ? Av. das Américas 5.300 (3328-5300).
Quando: Sábado, às 21h, e domingo, às 18h.
Quanto: R$ 25 a R$ 75.
Classificação: 10 anos.