RIO – O cafezinho está mais ralo, mas ainda é oferecido quentinho e em xícara no
gabinete do delegado Fernando Veloso, chefe de Polícia Civil, no prédio na Rua
da Relação, no Centro. Servida em ocasiões especiais, a bebida é o último ?luxo?
ainda mantido na corporação, que enfrenta uma das mais graves crises em seus 200
anos. Com cortes no orçamento, contingenciamento de recursos e uma dívida com
fornecedores que ultrapassa R$ 80 milhões, a Polícia Civil está a um passo do
colapso e no limite de seu funcionamento. Os serviços básicos estão sendo
garantidos graças a alguns repasses feitos pela Alerj e pelo Detran.
? Estamos no limite de nossa capacidade operacional, e
não descarto a possibilidade de um colapso. Quando, não sei. Tivemos que
replanejar tudo, até nossa atuação durante os Jogos Olímpicos. Estamos nos
adequando aos recursos disponibilizados, numa situação-limite ? disse Veloso.
Um dos grandes desafios tem sido manter o funcionamento
do Instituto Médico-Legal (IML). Na unidade do Centro, por falta de condições de
higiene ? sem receber, a empresa que fazia a limpeza suspendeu as atividades ?,
não são mais realizadas necropsias, apenas exames de corpo de delito. Além
disso, a equipe de legistas foi transferida para o IML de Campo Grande. Crise – 01/06
Outros problemas: foi cortado o fornecimento de papel usado nas delegacias; o
número de veículos da corporação circulando caiu a um terço; gasolina está sendo
racionada; e vários contratos, incluindo os de limpeza, foram cancelados.
? Não tem como não pensar em mais cortes. Vamos cortar muito mais. A gente
não quer isso, mas precisa fazer. E são cortes que impactarão o produto final,
que é o atendimento à população. A única coisa que eu posso garantir é que não
vamos fechar delegacias ? afirmou Veloso.
Em comparação com o ano passado, o orçamento da Polícia Civil já havia
sofrido um corte de cerca de 20%, passando para R$ 1,7 bilhão. Com o avanço da
crise no estado, o governador Luiz Fernando Pezão determinou, em fevereiro, com
o decreto 45.569, um enxugamento de 30% no orçamento geral do estado, incluindo
o da segurança pública. Ontem, o governador em exercício Francisco Dornelles
anunciou mais cortes nos gastos das secretarias.
Em audiência pública realizada na Alerj em março, o
diretor-geral de Assuntos Financeiros da Polícia Civil, Flávio Brito, demonstrou
preocupação.
? Não há mais como fazer cortes na Polícia Civil sem que eles atinjam a
população. Estamos gerando um déficit de R$ 40 milhões por ano. Nos últimos
meses, sobrevivemos basicamente com recursos repassados pelo Detran e pela Alerj
? afirmou ele na ocasião.
No mesmo dia, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, foi mais
fundo: admitiu que a crise estava atrapalhado o planejamento da pasta. Segundo
ele, os repasses estavam sendo feitos aos poucos, não permitindo a montagem de
uma estratégia a longo prazo:
? Nós não temos autonomia financeira. O orçamento é liberado de acordo com as
receitas. Então, estamos recebendo de maneira picada. Pego R$ 2 milhões ou R$ 3
milhões para planejar dois ou três meses.
HELICÓPTEROS ESTÃO FORA DE OPERAÇÃO
Por causa da crise, apenas três veículos blindados
(caveirões) dos seis da Polícia Civil estão funcionando. Além disso, todos os
três helicópteros da corporação estão no chão: não podem voar por falta de
manutenção. O delegado Fernando Veloso lembra que outro dia um perito ficou em
situação de risco numa favela no Lins de Vasconcelos:
? Policiais civis foram imediatamente para lá, mas
enfrentaram forte resistência de traficantes e estavam com dificuldades para
progredir. Pediram apoio aéreo, e ele não foi.
Ele disse que seu maior medo é não conseguir manter o
funcionamento do coração da Polícia Civil: um sofisticado sistema de informática
que mantém interligada todas as 186 delegacias do estado.
? Confeccionamos mais de um milhão de registros por ano. Tudo isso graças a
um sistema de informática que, para ser mantido, precisa de recursos. Ele
trabalha interligado e on-line com o do Tribunal de Justiça e o do Ministério
Público. Se parar, será o colapso ? afirmou.
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