Cotidiano

Brexit deve afetar expansão do Brasil no comércio mundial

WASHINGTON E RIO – Os efeitos da saída do Reino Unido da União Europeia não devem se limitar ao vaivém do mercado financeiro, que acordou tenso com a notícia. De imediato, o país foi impactado pela chamada aversão ao risco, que, no jargão financeiro, significa a fuga de investidores de mercados instáveis, como os emergentes. A Bolsa de São Paulo caía 3,5% na tarde desta sexta-feira. Para economistas, no entanto, o Brexit terá consequências de longo prazo para a já combalida economia nacional, que deve se ressentir do momento de incertezas no comércio global.

A economista Monica de Bolle acredita que o Brasil sentirá os efeitos do que isso representa para a globalização. Ela compara o fato histórico à queda do muro de Berlim, um marco da recente integração econômica internacional.

— O Brasil será afetado pelo que isso representa para a globalização. Assim como a queda do muro de Berlim inaugurou a era da integração acelerada, foi símbolo disso, o voto britânico inaugura a era do nativismo e nacionalismo exacerbados. Para quem pretende agenda de inserção mundial atrasada como nós, é um baque forte — avalia Monica.

Para Kevin Casas-Zamora, pesquisador do Inter-American Dialogue e ex-ministro de planejamento da Costa Rica, afirmou que o impacto do Brexit na América Latina será maior em países como Brasil, Colômbia e Chile, que vendem mais produtos para a União Europeia e que, em um primeiro momento, vai desacelerar. Ele lembrou ainda que países muito endividados, como o Brasil, deverão sentir um impacto da valorização do dólar.

— Além disso, qualquer chance pequena que havia de um acordo entre o Brasil ou o Mercosul e a União Europeia agora não existe mais, por um bom período — disse.

Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas, também avalia que a turbulência causada pode atrasar a muito aguardada recuperação da economia brasileira via comércio exterior.

— Esse impacto está ocorrendo em uma economia mundial fragilizada. A União Europeia já vinha crescendo pouco, vai crescer menos agora. É lógico que se a economia mundial vai crescer menos no médio prazo, isso prejudica o Brasil. Uma das formas da saída mais rápida desse ciclo recessivo seria com um crescimento das exportações. A preocupação é que a saída da recessão brasileira via exportação se torne mais difícil — afirma o economista.

Em prazo menor, Langoni destaca outro fator que pode interferir na atividade econômica brasileira. Com o clima instável, ele acredita que o Banco Central hesite em iniciar o processo de redução da taxa Selic, hoje em 14,25%. O afrouxamento é esperado por alguns analistas, devido à desaceleração da inflação.

COLCHÃO DE RESERVAS PROTEGE O PAÍS

O ponto positivo, afirma o especialista, é que o país formou um colchão de proteção a choques internacionais no ano passado, por causa da alta do dólar e da recessão, que causou a redução nas importações. Hoje, o Brasil tem cerca de US$ 370 bilhões em reservas internacionais.

— De imediato, tem uma aversão global ao risco, que é o que está assistindo hoje. Essa aversão global ao risco prejudica as economias emergentes, principalmente as que têm desequilíbrios macroeconômicos importantes, como o Brasil. O fator a favor do Brasil é que, pelo menos, o ajuste externo foi feito, porque não depende de decisões políticas. Ele simplesmente funcionou no piloto automático com o câmbio flutuando. E o resto, a própria recessão reduziu as importações. Apesar do nível baixo do preço das commodities, o Brasil conseguiu superávitis comerciais e manteve o nível de reservas elevadas. Nesse aspecto, o Brasil tem um colchão de proteção externa — afirma o economista.

(*) Correspondente