O Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) e o Ministério da Saúde (MS) estimam a ocorrência de cerca de 600 mil casos novos de câncer no Brasil em 2018. As informações estão na publicação técnica Estimativa 2018 – Incidência de Câncer no Brasil, produzida pelo INCA/MS e lançada nesta sexta-feira (2) na cerimônia pelo Dia Mundial do Câncer (5 de fevereiro), na sede do INCA, no Rio de Janeiro.
O número preciso da estimativa é de 582.590 casos novos de câncer: 282.450 em mulheres e 300.140 em homens. O estudo abrange o biênio 2018-2019 e as estimativas para o ano que vem são as mesmas de 2018. As estimativas do biênio 2018-2019 não podem ser comparadas às dos biênios anteriores, porque as bases de cálculo são permanentemente aperfeiçoadas.
O tipo de câncer mais incidente em ambos os sexos para cada ano do biênio 2018-2019 será o de pele não melanoma, que é um tipo de tumor menos letal, com 165.580 casos novos. Depois de pele não melanoma, os dez tipos de câncer mais incidentes no Brasil serão próstata (68.220 casos novos por ano), mama feminina (59.700), cólon e reto (mais comumente denominado câncer de intestino) (36.360), pulmão (31.270), estômago (21.290), colo do útero (16.370), cavidade oral (14.700), sistema nervoso central (11.320), leucemias (10.800) e esôfago (10.790).
Entre as mulheres, as maiores incidências serão de cânceres de mama (59.700), intestino (18.980), colo do útero (16.370), pulmão (12.530), glândula tireoide (8.040), estômago (7.740), corpo do útero (6.600), ovário (6.150), sistema nervoso central (5.510) e leucemias (4.860).
Para os homens, os cânceres mais incidentes serão os de próstata (68.220), pulmão (18.740), intestino (17.380), estômago (13.540), cavidade oral (11.200), esôfago (8.240), bexiga (6.690), laringe (6.390), leucemias (5.940) e sistema nervoso central (5.810).
O estudo revela o perfil de um país urbanizado, industrializado e com população em processo de envelhecimento, que possui os cânceres de próstata, pulmão, mama feminina e intestino entre os mais incidentes, em linha com países desenvolvidos do Ocidente. Mas o trabalho também revela que o Brasil continua a conviver com a incidência de cânceres associados a infecções, como o câncer do colo do útero e estômago, que possuem alto potencial de prevenção e costumam ser mais incidentes em países de baixo e médio desenvolvimentos.
O câncer engloba um conjunto de doenças, cada uma com características e fatores de risco próprios, cujo denominador comum é a reprodução desordenada de células. O câncer é uma doença multifatorial, ou seja, pode ser causada por diversos fatores.
A longevidade, urbanização, globalização e exposição aos fatores de risco ambientais e ocupacionais, bem como fatores reprodutivos e hormonais e o histórico familiar de câncer, estão entre as principais causas da doença. Mas cerca de um terço dos casos de câncer poderia ser prevenido.
“O que fazer? Nossa recomendação é a seguinte. Definitivamente, não fume e não se exponha à fumaça de pessoas próximas a você que fumam. Faça alguma atividade física de forma regular. Reduza a ingestão de carnes vermelhas e coma alimentos frescos, como frutas, vegetais e hortaliças, e alimentos ricos em fibras. Evite os alimentos processados, gordurosos, defumados e produzidos com o uso de agrotóxicos. Mantenha o peso corporal adequado. Proteja-se da exposição solar excessiva usando roupas, chapéu, óculos escuros e protetor solar. Minimize a ingestão de bebidas alcoólicas. Evite, sempre que possível, se expor à radiação ionizante e poluição do ar,” afirma Ana Cristina Pinho, diretora-geral do INCA.
Próstata, mama feminina, intestino e pulmão
Os tipos de câncer mais incidentes no Brasil (excetuando-se pele não melanoma), próstata, mama feminina, intestino e pulmão, têm relação com as mudanças ocorridas no país, que motivaram a chamada transição epidemiológica. Em um século, o Brasil aumentou exponencialmente sua população, os brasileiros se mudaram das zonas rurais para os grandes centros urbanos, a população entrou em processo de envelhecimento (com o aumento da expectativa de vida e a queda na taxa de natalidade) e o problema da fome foi aos poucos substituído pelo da obesidade, entre outras mudanças. O câncer no Brasil, sobretudo nas regiões Sul e Sudeste e parte do Centro-Oeste, assumiu um perfil muito parecido com o dos chamados países do primeiro mundo.
“Os cânceres de próstata e mama, que são os mais incidentes em homens e mulheres, estão associados a longevidade, fatores reprodutivos e hormonais, inatividade física, obesidade e uso de álcool. Há também uma minoria de casos relacionados à história de câncer na família,” aponta a médica epidemiologista Liz Almeida, chefe da Divisão de Pesquisa Populacional do INCA/MS.
“Sobre o câncer de pulmão, cujo principal fator é a exposição à fumaça do tabaco, conseguimos avançar com a forte redução na prevalência de fumantes, resultado do programa brasileiro de controle do tabagismo. Mas pulmão continua a figurar entre os cânceres mais incidentes e temos que intensificar a prevenção ao tabagismo, sobretudo entre os jovens. O tabaco continua liderando o ranking de fatores de risco, está associado a 16 tipos de câncer e responde por um quinto de todas as mortes por câncer no mundo,” complementa Liz Almeida.
A incidência do câncer de intestino está relacionada ao aumento no índice de brasileiros com peso corporal inadequado. De acordo com os inquéritos nacionais do IBGE, enquanto na década de 1970 em torno de 24% da população adulta apresentava excesso de peso corporal, nos anos de 2002-2003 esses valores passaram para aproximadamente 41% da população com mais de 20 anos. Dez anos depois, os valores subiram ainda mais, alcançando 56,9% da população.
“O câncer de intestino já é o segundo entre as mulheres, perdendo apenas para mama, e o terceiro entre os homens, ficando atrás de próstata e pulmão,” ressalta Liz Almeida. “A doença está associada a diversos fatores, como obesidade, consumo de carnes vermelhas e processadas, dieta pobre em fibras, inatividade física e uso de álcool e tabaco, além da presença de pólipos no cólon e reto, história familiar de câncer etc.”
Colo do útero
Em contraste com o padrão pós-transição epidemiológica, o Brasil continua a conviver com a incidência de cânceres decorrentes de infecções, que poderiam ser prevenidos. O exemplo mais marcante é o câncer do colo do útero, o mais incidente entre as mulheres na Região Norte e o segundo mais incidente nas regiões Nordeste e Centro-Oeste.
A infecção pelo vírus do papiloma humano (HPV) é responsável por praticamente todos os casos de câncer do colo do útero. O HPV propaga-se por contato sexual. O vírus provoca uma lesão no colo do útero, que, se não tratada adequadamente, pode levar ao desenvolvimento do câncer.
A boa notícia é que o Ministério da Saúde oferece, desde 2014, a vacinação para meninas contra o vírus do HPV, agora ampliada para os meninos, o que poderá reduzir no futuro a incidência de cânceres associados a essa infecção. No curto e médio prazos, a medida mais efetiva para a prevenção e detecção precoce do câncer do colo do útero é a universalização do acesso ao exame de Papanicolaou, biópsia e tratamento.
Sobre o estudo
O objetivo da publicação técnica Estimativa 2018 – Incidência de Câncer no Brasil é oferecer um painel sobre o cenário atual da magnitude do câncer, que possa ser utilizado por gestores, profissionais de saúde e sociedade em geral, de modo a subsidiar as ações de prevenção e controle da doença. Os resultados têm como base as informações dos registros de câncer de base populacional e do sistema de informações sobre mortalidade (SIM), que são atualizados com frequência. Isto inviabiliza comparações entre as novas estimativas e aquelas divulgadas em anos anteriores, uma vez que são baseadas em realidades distintas.
As estimativas são elaboradas pela Divisão de Vigilância e Análise de Situação da Coordenação de Prevenção e Vigilância (Conprev) do INCA/MS. “A informação deve ser a principal aliada para lidar com a doença. O conhecimento favorece a prática de hábitos de vida saudáveis, a busca pela detecção precoce e a realização do tratamento no tempo adequado, aumentando a sobrevida com qualidade”, enfatiza Marise Rebelo, chefe da Divisão de Vigilância e Análise de Situação.
“Conhecer o perfil do câncer nas diferentes populações favorece o delineamento das melhores estratégias para o controle da doença e o planejamento dos serviços. O resultado é uma melhor qualidade da atenção prestada à população,” conclui Marceli de Oliveira Santos, técnica da Divisão de Vigilância do INCA.
Fake news, saúde e câncer
O fenômeno mundial da divulgação de informações falsas via mídias sociais e outras plataformas digitais e tradicionais é uma realidade na área de saúde, no Brasil. O INCA reúne um grupo de especialistas para participar, na cerimônia do Dia Mundial do Câncer, do debate “Fake news, saúde e câncer”, que pretende discutir as características desse fenômeno.
Os debatedores são: Gelcio Mendes, coordenador de Assistência e diretor substituto do INCA (INCA/COAS); Liz Almeida, chefe da Divisão de Pesquisa Populacional do INCA; Luciana Grucci Moreira, nutricionista da Coordenação de Prevenção e Vigilância do INCA; Igor Sacramento, acadêmico na área de Comunicação em Saúde da Fiocruz; Euler Siqueira, sociólogo e pesquisador do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ; e Ana Rita Cunha, jornalista e repórter do site Aos Fatos (aosfatos.org). Rodolfo Schneider, diretor de jornalismo da BandNews FM, é o mediador do debate.