BRASÍLIA – Um dia após assumir a liderança do governo, o deputado André Moura (PSC-SE) já tenta desvincular sua imagem do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Por orientação de auxiliares do presidente interino Michel Temer e de deputados do chamado Centrão, que lhe serviram de cabos eleitorais, Moura passou a sustentar o discurso de que não discutirá os temas da Câmara com Cunha e que agirá afinado apenas com o governo e a base.
Ao GLOBO, o líder afirmou que há ?zero de chance? ? uma expressão regularmente usada por Cunha ? de agir no cargo por orientação do colega:
? Zero de chance. Quem vai estar à frente da liderança sou eu, com apoio dos líderes e da base aliada. Sou líder do governo Michel Temer e devo satisfação somente ao presidente da República e aos seus ministros. Fora isso, não sigo orientação de absolutamente ninguém ? disse.
André Moura também nega que vá usar o cargo para ajudar o colega peemedebista a se livrar da cassação do mandato no Conselho de Ética. Aliados de Cunha tentam um acordo para que ele renuncie à presidência da Câmara em troca de uma punição mais branda no colegiado e, para tanto, esperam contar com o apoio do governo no convencimento de deputados.
? A partir do momento que aceitei o convite para ser líder do governo, deixei de cometer ações unilaterais. Eu falo pelo governo. Esse assunto da cassação do Eduardo Cunha, que eu saiba, não é assunto de governo. E eu irei discutir apenas matérias de interesse da nação. Essa é minha missão ? afirmou ao GLOBO.
A relação de Cunha com Moura é de extrema proximidade. Moura é investigado na Lava-Jato por supostamente ajudar o peemedebista a alterar medidas provisórias de interesse de empreiteiras ou para pressionar empresários por meio de requerimentos na Câmara ? acusação que ele nega. A relação entre ambos era tão intensa que, no ano passado, os colegas lhe apelidaram de ?André Cunha?, alcunha que não lhe desagradava.
Nos tempos de maior potência de Cunha na presidência da Câmara, quando detinha o poder de decidir pela abertura ou não do processo de impeachment, Moura foi agraciado com relatorias de projetos relevantes, como a PEC da reforma tributária. A pessoas próximas, o deputado gostava de contar que ?só não dormia? com Eduardo Cunha, mas que passava boa parte do dia ao seu lado, fosse na Câmara, fosse na residência oficial.
A partir de agora, ao menos na aparência, a relação deve ficar mais fria. Moura diz que esteve pela última vez com Cunha na semana passada, ao lado de um grupo de deputados e que, desde então, não voltou a vê-lo. Mas, o deputado não cogita cortar os laços com o colega.
? Enquanto Eduardo foi presidente da Casa, sempre tive relação boa com ele. Mas, desde que ele se afastou, estive muito pouco com ele. Por que vou cortar relações com ele? Não vou discutir com Eduardo Cunha as orientações que vou dar na Câmara, mas não vejo necessidade de cortar relações ? diz o novo líder.
O Palácio do Planalto resistiu em aceitar a indicação de Moura, mesmo com o apoio de líderes de quase 300 deputados, por acreditar que sua forte ligação com Cunha poderia prejudicar a imagem do governo. Mas, pressionado, acabou acatando a escolha dos deputados, que pressionaram até o último instante para fazê-lo líder.