Cascavel – A cadeia pública de Cascavel, anexa à Delegacia de Polícia Civil, no Centro da cidade, chamada de “bomba relógio”, chegou a ser oficialmente demolida no fim de 2016 com a promessa do governador Beto Richa de que não voltaria a funcionar e que a partir de então seria apenas um local transitório para os presos encaminhados às penitenciárias. Não foi o que aconteceu. A bomba relógio tem cada vez mais explosivos e hoje abriga 98 detentos, onde poderia ter no máximo uns 10, 15 presos. E olhe lá!
Mas a situação de Cascavel é apenas um reflexo do que ocorre por todo o Estado. Uma auditoria feita pelo TCE-PR (Tribunal de Contas do Estado do Paraná), divulgada ontem, traz dados assustadores e mostra, número por número, o caos do sistema prisional paranaense e derruba as falácias do governo do Estado.
De acordo com o Tribunal, conforme dados coletados com o Depen e a Polícia Civil, em dezembro de 2017 havia 10.729 presos em carceragens ou delegacias de Polícia Civil, em locais com 3.618 vagas, ou seja: três vezes a capacidade. Na mesma época, o sistema penitenciário tinha 19.345 presos para 17.793 vagas, 1.552 presos a mais, referente a 8,7% de superlotação.
Segundo o TCE, no Paraná a maior parte da superlotação existente está nas carceragens de Delegacia de Polícia Civil. Perfil diferente se comparado ao que acontece em abrangência nacional, em que o excesso de presos é mais evidente nos presídios.
No País, estima-se um total 726,7 mil presos ocupando 368 mil vagas. Taxa de superlotação de 197,4%.
O número tem se agravado ao longo dos anos. De 2005 a 2016, a quantidade de pessoas privadas de liberdade subiu de 361,4 mil para 726,7 mil.
Planejamento é considerado ineficiente
No relatório publicado pelo TCE, o diagnóstico é de que o planejamento de obras do sistema carcerário do governo do Estado é ineficiente. Para suprir o déficit de vagas, segundo o TCE, o Estado propôs construção de unidades prisionais, por meio de 20 obras, previstas no Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional. Os contratos foram firmados em 2014, com término previsto de outubro do mesmo ano até abril de 2015.
Ocorre que em novembro do ano passado oito obras estavam com o contrato suspenso ou rescindido devido a problemas de projeto e de execução, sem previsão para retomada. Quatro estavam em fase de reformulação do projeto e duas em execução. Ou seja, apenas 598 novas vagas em andamento das 8.627 necessárias para suprimir a superlotação carcerária do Estado. Nenhuma das obras foi entregue no cronograma previsto. O TCE ressaltou também baixa qualidade dos projetos de engenharia para as obras e recomenda que o poder Executivo apresente um cronograma real de execução das obras.
Novas penitenciárias não suprirão a demanda
Mesmo se todas as de penitenciárias no Paraná prometidas pelo atual governo estivessem prontas, as vagas não seriam suficientes para atender a demanda de presos. Conforme a Sesp (Secretaria de Segurança Pública), estavam previstas 14 unidades e um total de 7 mil vagas, enquanto a “sobra” de presos hoje é de 8.627, que se espremem nas celas.
E isso está longe de aconteceu. De acordo com a Sesp, das 14 obras, três estão em andamento: Cadeia Pública de Campo Mourão, Centro de Integração Social de Piraquara e a ampliação da Penitenciária Estadual de Piraquara II. Nos próximos dias, está prevista a retomada das obras na Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu I.
Além das transferências, a Sesp afirma que começou a construção de shelters, que são celas modulares, que vão abrir em todo o Estado mais de 680 vagas. E que tramita no Depen Nacional a construção de uma nova unidade prisional modular com capacidade para mais 636 presos.
Mais de 1,6 mil condenados estão em carceragens
Outro problema analisado pelo Tribunal de Contas do Estado é de que 1.689 pessoas condenadas cumpriam pena em carceragens de Delegacias de Polícia, por falta de vagas nas penitenciárias. Consequência: impossibilidade de ofertar tratamento penal conforme os direitos estabelecidos por lei.
O TCE também analisou a celeridade dos processos com ocorrência de prisão. Mais da metade dos processos transitados em julgado, com sentença proferida no primeiro semestre do ano passado, o tempo entre o recebimento da denúncia e a realização da audiência de instrução foi superior a 120 dias. Alguns demoraram até 500 dias e resultaram na duração excessiva da prisão preventiva.
Tudo isso deu vazão a outro problema: a falta de defensores públicos no Paraná. Hoje a média é de 538,54 presos por defensor público no Estado, o índice mais alto de todo o País. Em dezembro de 2017, eram 99 cargos de defensores públicos no Paraná, e o ideal seriam 526 profissionais. Do total dos existentes, 42 atuam nas áreas criminal e penal. Esses 42 atenderiam, de forma satisfatória, 25,2 mil pessoas. Porém, a população carcerária do Paraná é de aproximadamente 30 mil presos. A recomendação do Tribunal de Contas é de que o Poder Executivo e a Defensoria Pública estabeleçam uma metodologia para aferição do quantitativo de defensores públicos necessários para assistência dos encarcerados do Estado.