Cotidiano

Vantagens recebidas por Lula somam R$ 3,7 milhões, diz denúncia

SÃO PAULO ? A denúncia apresentada hoje pela força-tarefa da Lava-Jato aponta que Lula teria recebido, ao todo, R$ 3,7 milhões da empreiteira OAS em vantagens indevidas na forma da aquisição de um tríplex no Guarujá, sua reforma e decoração, além do armazenamento de parte de seu acervo pessoal quando deixou a presidência, em 2010. Lula foi denunciado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Segundo o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, assim como na investigação do recebimento de propinas por José Dirceu, existia para Lula um sistema que o procurador chamou de ?caixa-geral?. De acordo com Dallagnol, ao contrário do que ocorria com outros agentes públicos, como diretores da Petrobras e operadores financeiros, não precisava ser acertado um valor de propina definido para essas autoridades.

? Lula, Dirceu, Vaccari e outros integrantes do partido, que tinham controle sobre a distribuição desses valores, podiam sacar valores desse caixa-geral ? afirmou.

O detalhamento da compra, reforma e mobília do apartamento foi realizada pelos procuradores Roberson Pozzobon e Júlio Carlos Noronha. Durante sua apresentação, Pozzobon indicou indícios que apontariam que o tríplex do condomínio Solaris, no Guarujá, serviu como pagamento de vantagens indevidas para Lula. No entanto, o procurador ressaltou que não seriam apresentados provas cabais de que Lula é o efetivo proprietário do apartamento. Segundo Pozzobon, essa ausência é uma forma de ocultar a verdadeira propriedade do apartamento.

O procurador realizou um histórico do condomínio, lançando em maio de 2003 pela Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop) com conclusão prevista para o ano de 2006. Uma cota, no valor de 195 mil reais, foi adquirida neste momento pela mulher de Lula, Marisa Letícia. Durante a apresentação, Pozzobon apontou que uma rasura no termo que firmou o acordo entre Marisa e a Bancoop é um sinal de que a família não tinha interesse em adquirir aquele apartamento, mas a cobertura do prédio.

? No ponto em que se indica a unidade consta uma rasura. Verificou-se que o número originário não era 141 mas 174. Se a intenção era adquirir o 141, por que se colocou o 174? ? disse Pozzobon.

Em duas tabelas apreendidas durante a 24ª fase da Operação Lava-Jato mostram que, no mês de dezembro, o apartamento 174 era o único que constava como ?vaga reservada?. Quando a OAS assumiu o empreendimento devido a problemas financeiros da Bancoop, o apartamento 174 tornou-se o tríplex 164, que os investigadores afirmam ser de propriedade de Lula. Após a entrada da OAS no negócio, Pozzobon afirmou que Marisa Letícia suspendeu os pagamentos.

? Foi nesse momento que, mediante ajustes com Léo Pinheiro (ex-presidente da OAS), eles recebem a cobertura em pagamento de propinas de forma oculta ou dissimulada ? disse.

A cobertura do tríplex, segundo os investigadores, tinha o valor à época de R$ 1,4 milhão de reais, o que constituiria uma vantagem indevida de R$ 1,1 milhão de reais. A partir do ano de 2013, o tríplex ainda teria recebido modificações personalizadas para o interesse da família de Lula e custeadas pela OAS no valor de R$ 1,3 milhão de reais.

Os investigadores também denunciaram Lula e executivos da OAS pelo armazenamento de parte do acervo pessoal do ex-presidente após sua saída do Palácio do Planalto, em 2010. Segundo o procurador Júlio Carlos Noronha, a OAS ficou responsável por realizar o pagamento à Granero, onde parte do acervo ficou armazenado. Teriam sido feitos, pela OAS, 61 pagamentos à empresa no valor de R$ 21 mil reais, que somariam R$ 1,3 milhões durante todo o período em que o acervo permaneceu na Granero.

LULA E MARISA LETÍCIA REPUDIAM DENÚNCIA

Em nota, Lula e Marisa Letícia chamaram a denúncia do Ministério Público Federal de truque de ilusionismo.

Em relação ao imóvel no Guarujá, a defesa de Lula e Marisa afirmaram que o apartamento é de propriedade da OAS e apresentou o registro no Cartório de Registro de Imóveis do apartamento que mostra a empreiteira como proprietária do tríplex. ?A denúncia não contém um único elemento que possa superar essa realidade jurídica, revelando-se, portanto, peça de ficção?, afirmaram os advogados.

De acordo com a defesa, Marisa adquiriu em 2005 uma cota-parte da Bancoop que, se fosse quitada, daria direito a um imóvel no Edíficio Mar Cantábrico, nome antigo do hoje Edifício Solaris. Ela fez pagamentos até 2009, quando o empreendimento foi transferido à OAS por uma decisão dos cooperados, acompanhada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. ?Diante disso, D. Marisa passou a ter a opção de usar os valores investidos como parte do pagamento de uma unidade no Edifício Solaris ? que seria finalizado pela OAS ? ou receber o valor do investimento de volta, em condições pré-estabelecidas. Após visitar o Edifício Solaris e verificar que não tinha interesse na aquisição da unidade 164-A que lhe foi ofertada, ela optou, em 26.11.2015, por pedir a restituição dos valores investidos. Atualmente, o valor está sendo cobrado por D. Marisa da Bancoop e da OAS por meio de ação judicial?, comunicaram os advogados.

Segundo Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira, advogados da família de Lula, o Ministério Público não conseguiu apresentar qualquer conduta irregular praticada por Lula em relação ao armazenamento do acervo presidencial. Lula foi denunciado por ser o proprietário do acervo. A denúncia se baseia, portanto, em uma responsabilidade objetiva incompatível com o direito penal. Para os advogados, ?não foi apresentado um único elemento concreto que possa indicar que os recursos utilizados pela empresa tivessem origem em desvios da Petrobras e, muito menos, que Lula e sua esposa tivessem conhecimento dessa suposta origem ilícita.?

(*Estagiário, sob supervisão de Flávio Freire)