Cotidiano

'UnREAL': dramas da vida (quase) real

RIO? Quem assistiu à primeira temporada de ?UnREAL? e acompanhou os bastidores de um reality show aos moldes de ?The bachelor? (o fictício ?Everlasting?) muito provavelmente ficou chocado com os artifícios usados pelos produtores do programa para fazer a tal ?boa televisão? que eles tanto apregoam. Ao longo dos episódios, as pretendentes a se casar com um bonitão da realeza britânica eram feitas de gato e sapato, manipuladas à exaustão, para que suas produtoras, Quinn (Constance Zimmer, indicada ao Emmy de atriz coadjuvante pelo papel) e Rachel (Shiri Appleby), tivessem material suculento o suficiente para atrair a maior audiência possível. Esse climão de ?fábrica de salsicha? resultou no famigerado ?o Brasil ‘tá vendo?. Ou melhor, os Estados Unidos. A série de Sarah Gertrude Shapiro e Marti Noxon conquistou crítica e público por sua representação fiel da realidade por trás dos realities, base da grade de tantos canais, por lá e aqui.

Séries 1

Sarah jura que tudo que é visto na série, cuja segunda temporada estreia hoje, às 22h50m, no Lifetime, não passa da mais pura ficção. Mas ela tirou a premissa de suas experiências pessoais: ela mesma foi produtora de ?The bachelor? e confessa ter usado métodos cruéis como o da dupla de protagonistas para arrancar das participantes material impactante. Assim, garantiria uma boa audiência e, por consequência, seu emprego. Afinal, ela era uma jovem roteirista de 20 e poucos anos que precisava pagar seu aluguel.

? Tudo em ?UnREAL? é ficção, mas a forma como um reality show é feito, a forma como as pessoas manipulam umas às outras, tudo isso é muito autêntico. A verdade é que eu desejava nunca ter trabalhado em ?The bachelor?, mas faz parte da minha vida ? diz ela, durante uma teleconferência com jornalistas da América Latina. ? Reality shows são muito baratos de se produzir e são muito lucrativos. Ainda mais os como ?Everlasting?. Todo mundo quer acreditar no amor. A fábula da princesa à espera de ser salva pelo príncipe encantado pode ser inebriante. Mesmo que as mulheres tenham que competir por um homem na TV. Particularmente, não acho isso nada positivo.

Shiri, fã confessa de ?Project runway? e ?Keeping up with the Kardashians?, se diverte com a oportunidade de viver o outro lado, mesmo que na ficção:

? Acho esse um pano de fundo bem interessante para uma série, ver como os reality shows são feitos e produzidos.

Para a nova temporada, as criadoras resolveram adicionar um elemento racial. Pela primeira vez, ?Everlasting? terá um protagonista negro (coisa que jamais aconteceu em ?The bachelor?). Darius Beck (B.J. Britt) é um jogador de futebol americano que precisa limpar sua barra depois de uma série de crises de imagem. E, para aumentar a dose de realidade da série, ele vai se envolver com uma participante, militante do movimento ?Black lives matter? (que luta pelo direito dos negros contra a truculência policial nos EUA) e com… a truculência policial contra negros.

? Quando cheguei na sala de roteiristas e disse que gostaria de focar na questão racial, todo mundo ficou nervoso, eu inclusa. Afinal, sou uma mulher branca e judia escrevendo sobre um homem negro ? conta Sarah, que divide o comando dos episódios com Marti, roteirista de?Buffy, a caça-vampiros?. ? Mas decidimos que seria melhor fazer isso do que ter medo de fazer. Foi muito importante que duas roteiristas negras que trabalham conosco tivessem uma voz muito forte nessa história. Tiramos muito tempo para ouvir seus pontos de vista.

Outro ponto central da temporada é o relacionamento de Quinn e Rachel, ora se comportando como criadora e criatura, ora como mãe e filha, ora como mocinha e bandida.

? Quando você passa tanto tempo no trabalho, seu colega se torna parte da família. A trama é toda sobre Quinn e Rachel. As duas se amando, se odiando, brigando, lutando pelo poder. A relação das duas é a mais importante da série.

Shiri Appleby, que chegou a ser apontada como revelação, está na TV desde criança e curte seu momento de maior destaque no papel de uma produtora ambiciosa que precisa lidar com os ossos do ofício e seus dilemas morais. Isso sem falar nas crises nervosas.

? Eu gosto de ir trabalhar todos os dias, é uma personagem que tem desafios reais. Rachel é uma sobrevivente, e ela não se permite ser vimitizada ? diz a atriz, que dirigiu o sexto episódio da temporada.