Cotidiano

Unioeste desenvolve pesquisas inovadoras na descontaminação de águas

Grupo transforma resíduos provenientes da agroindústria em materiais "filtrantes"

Marechal Cândido Rondon – Nos últimos anos o professor doutor Affonso Celso Gonçalves Jr., do Centro de Ciências Agrárias do Campus de Marechal Cândido Rondon da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná ) juntamente com sua equipe do Gesoma-CNPq (Grupo de Estudos em Solos e Meio Ambiente) têm realizado inúmeros projetos científicos focados na área de Ciências Ambientais, mais especificamente com trabalhos voltados para remediação de águas contaminadas por metais e agrotóxicos.

Além de coordenar o Gesoma, o professor Affonso também coordena o Laboratório de Química Ambiental da Unioeste desde o ano 2000 e desde então, inúmeras pesquisas e trabalhos científicos têm sido realizados pela sua equipe, que atualmente conta com orientados de pós-doutorado, doutorado, mestrado e acadêmicos de iniciação científica que atuam sob sua orientação direta.

O desenvolvimento dos trabalhos científicos na área de remediação de compartimentos ambientais teve início quando Affonso realizou um pós-doutorado na Universidade de Santiago de Compostela em 2011. Nesta linha de pesquisa ‘Sistemas de Produção Sustentáveis’, os pesquisadores sob sua orientação, utilizam alguns resíduos provenientes da agroindústria que normalmente seriam descartados por não apresentarem nenhum benefício ou valor agregado.

Estes resíduos são preparados em laboratório e utilizados in natura ou quimicamente modificados como materiais adsorventes (filtrantes) alternativos e sustentáveis. Os diferentes materiais produzidos podem ser utilizados em filtros visando à remoção de metais tóxicos e agrotóxicos de águas contaminadas por um processo conhecido como adsorção (física e/ou química).

Os resíduos que já foram testados in natura e/ou modificados quimicamente são: casca de mandioca, casca de pinus, sementes de moringa oleífera, sementes de crambe, casca da castanha do Brasil, casca da castanha de caju, caroço de açaí e sementes de pinhão manso.

Visando a proteção intelectual das pesquisas desenvolvidas pelo Gesoma, muitos destes processos ou produtos já foram depositados na forma de pedido de patentes junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial via o Núcleo de Inovações Tecnológicas da Unioeste.

Nos últimos anos, alguns projetos do Gesoma nesta área de remediação de águas contaminadas foram aprovados junto ao Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e com isso o Laboratório de Química Ambiental está sendo equipado de forma a atender o desenvolvimento destas pesquisas científicas.

Conforme a equipe de pesquisadores liderada por Affonso, estes filtros, contendo o material adsorvente in natura e/ou modificado, podem ser utilizados de maneira muito simples.

Desde a utilização 'caseira' de recipientes PET invertidos, contendo o material biossorvente ou até mesmo a produção em escala de filtros comerciais com estes biossorventes alternativos. De forma simples, pode-se colocar uma barreira entre o material e a saída de água no recipiente PET e a água a ser utilizada (proveniente de rios, poços e etc.) deve ser 'passada' dentro do recipiente e assim, se o resíduo adsorvente estiver preparado conforme os estudos realizados, esta água poderá ser utilizada para consumo.

Sendo assim, os resíduos antes descartados, agora poderão ser reutilizados de acordo a capacidade de cada um dos adsorventes estudados. As quantidades (massa) do material in natura a ser utilizado, para filtrar 1 litro de água contaminada por metais ou agrotóxicos, conforme os estudos do Gesoma, são as seguintes: casca de mandioca 8g; casca de pinus 8g, sementes de moringa oleífera 8g; sementes de crambe 8g; casca da castanha do Brasil 8g; casca da castanha de caju 8g; caroço de açaí 20g e sementes de pinhão manso 8g. Portanto percebe-se que a quantidade de massa necessária de cada um dos biossorventes são pequenas para filtrar cada litro de água potencialmente contaminada e, portanto a viabilidade econômica é fantástica

Cabe salientar que cada um destes materiais passa por um processo de preparação diferenciado e não basta somente utilizar estes resíduos de qualquer forma, sem conhecer o modo de obtenção e preparo adequado. Já para os adsorventes 'modificados' física e quimicamente, os resultados ainda estão sendo obtidos, porém sabe-se que a capacidade de retenção de substâncias tóxicas aumentará com estas modificações, mas infelizmente o custo também se comparado com a utilização dos materiais in natura testados inicialmente.

Estes trabalhos científicos têm gerado teses de doutorado, dissertações de mestrado e inúmeros artigos científicos internacionais e nacionais, capítulos de livros internacionais, além de diversas premiações, dentre as quais podemos destacar: projeto finalista do Prêmio Santander Ciência e Inovação edição 2014, projetos finalistas do Prêmio da Agência Nacional de Águas (ANA) edições 2012 e 2014 categoria Pesquisa e Inovação Tecnológica, diversos trabalhos premiados em eventos científicos nacionais e internacionais além do primeiro lugar no Prêmio Samuel Benchimol na Amazônia na categoria ambiental em 2009.

Atualmente os trabalhos de descontaminação e remediação de águas utilizando filtros a base de resíduos provenientes da agroindústria fazem parte de duas teses de doutorado dos professores e pós-graduandos Daniel Schwantes (PUC-PR) e Gustavo Coelho (UDC) e também de um trabalho de pós-doutorado do doutor Marcelo Campagnolo, todos orientados diretamente pelo professor Affonso.

Cabe ressaltar que os doutorandos Daniel e Gustavo foram contemplados recentemente pela Capes com uma bolsa de doutorado ‘sandwich’ no exterior e desde o início de setembro estão respectivamente em Lisboa (Portugal) e Santiago de Compostela (Espanha) realizando parte dos experimentos de suas teses em universidades destes países.

Estas oportunidades surgiram a partir de diversos trabalhos de parceria científica e visitas técnicas realizadas pelo professor Affonso desde 2010 junto a diversos pesquisadores de importantes universidades europeias, dentre as quais pode-se destacar: Universidade de Santiago de Compostela (Espanha), Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa (Portugal) e  Universidades autônomas de Barcelona e Madrid (Espanha). Nestas universidades Affonso ministrou conferências internacionais e desenvolve diversos projetos científicos em parceria.

Segundo o doutorando e professor da PUC-PR Daniel Schwantes, “O uso de resíduos sólidos agroindustriais é uma excelente alternativa para produção de adsorventes modificados, uma vez que tais adsorventes apresentam alta capacidade de remediação de águas contaminadas com metais tóxicos e pesticidas”.

Daniel comenta ainda que “tais adsorventes modificados poderão, em um futuro próximo, ser fonte de renda para as agroindústrias, uma vez que a matéria prima utilizada para sua produção não apresenta grande valor agregado atualmente”.

Conforme o doutorando e professor da UDC, Gustavo Ferreira Coelho “são diversos os materiais adsorventes estudados pelo Gesoma sendo estes resíduos, todos de espécies cultivadas em diversas regiões do Brasil, que além de serem gerados em grandes quantidades e baixo custo, a obtenção destes materiais vem a tornar mais acessível aos interessados, e agora com o desenvolvimento de nossas teses no exterior é possível descobrir novos materiais adsorventes de alta capacidade visando a remediação de compartimentos ambientais para outros países. Reforço ainda, que graças às parcerias científicas firmadas pelo professor Affonso e o financiamento da Capes, temos a oportunidade de desenvolver parte dos nossos estudos no exterior, e certamente esta será uma grande experiência profissional e científica”

Uma pergunta que surge com relação a este assunto, seria quem teria interesse em comprar e onde podem ser usados estes filtros ‘alternativos e sustentáveis’? Affonso responde que todas as pessoas que não tem acesso a água potável e aquelas que eventualmente querem melhorar a qualidade da água que chega até suas torneiras podem ter interesse nestes material adsorventes.

Estes filtros 'alternativos' podem ser usados em qualquer situação onde a potabilidade da água não seja adequada ou onde exista a necessidade de melhorar a qualidade química existente. Deve-se ressaltar, que estes filtros a base de resíduos provenientes da agroindústria também podem ser utilizados para finalidades industriais tais como pós-tratamento de efluentes e até mesmo tratamento de água para fins da própria agroindústria.

Na atualidade devemos lembrar que a maioria dos mananciais hídricos estão contaminados por substâncias potencialmente tóxicas e assim, a importância destas pesquisas fica evidentes. Affonso afirma ainda que não se pode ainda falar em preços finais, pois isso dependerá do interesse da iniciativa privada nesta nova tecnologia, porém pode-se afirmar com segurança que serão filtros com redução de até 80% em relação aos que utilizam carvão ativado e outras substâncias. Logicamente, não tem como uma empresa produzir e comercializar estes produtos/processos de purificação de água sem custo.

Segundo Affonso, os trabalhos científicos desenvolvidos pelo Grupo de Estudos em Solos e Meio Ambiente (Gesoma-CNPq), tem o foco em um ambiente sustentável onde reaproveitamos resíduos que certamente seriam descartados como lixo e transformamos estes materiais em produtos que podem ser utilizados com grande eficácia na descontaminação de águas, o que atualmente representa um problema de grande magnitude no mundo todo.

Outros trabalhos inovadores sob orientação do professor Affonso são a dissertação de mestrado do Marcelo Gonçalves que utiliza medicamentos homeopáticos visando a remediação de solos agricultáveis contaminados por metais tóxicos e a tese de doutorado do Adir Parizotto que trata da aplicação desenfreada de dejetos suínos em solos agrícolas.

O sucesso de todos estes projetos é fruto de um efetivo trabalho em equipe e sem isso não é possível o desenvolvimento da ciência e tecnologia de forma ética e eficaz. O Gesoma tem apresentado um excelente desenvolvimento científico em virtude dos projetos aprovados nos últimos anos na área de Ciências Ambientais, mais especificamente com relação à linha de pesquisa voltada para a remediação de águas contaminadas por agrotóxicos e metais utilizando materiais biossorventes alternativos e sustentáveis provenientes de atividades agroindustriais.

Os integrantes do Gesoma atualmente são: Affonso Celso Gonçalves Jr. (Coordenador e Orientador); Emerson Gasparotto (Técnico), Gilmar Gomes (Técnico), Marcelo Campagnolo (Pós-Doutorando), Daniel Schwantes (Doutorando), Gustavo Coelho (Doutorando), Adir Parizotto (Doutorando), Marcelo Gonçalves (Mestrando) e os seguintes acadêmicos bolsistas de Iniciação Científica: Alisson Miola, Caio Domingues, Iberê Porto, Eduardo Volz, Dionir Briesch, Juliano Zimmermann, Elio Conradi Junior, Victor Cazzo, Camila Podkowa e Victor Edmund Elias.