Cotidiano

Um em cada três municípios não possui leito do SUS na região

São 117 mil pessoas que, para internamentos, precisam ser removidas para outras cidades

Cafelândia – O artigo 196 da Constituição Federal, a chamada constituição cidadã de 1988, diz que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Ocorre que a Constituição vem sendo confrontada quando o acesso a 117 mil pessoas que vivem em 17 municípios no oeste do Paraná, ou seja, 33% de um total de 50 cidades, não podem contar com um único leito do SUS (Sistema Único de Saúde) para internamentos.

Esses municípios não têm hospitais municipais e dependem, exclusivamente, de cidades próximas para os internamentos. Nem partos essas cidades podem realizar.

Os dados foram apurados pelo auditor independente do sistema de saúde Eduardo Benoliel. Servidor de carreira do Ministério da Saúde, ele dedica parte do tempo a investigar os descasos ao acesso à saúde pública, fraudes ao sistema, descumprimento de medidas judiciais e, principalmente, atos de corrupção que oneram o sistema e deixam boa parte da população, geralmente a mais carente, alijada de atendimentos ou sem acesso aos hospitais.

Para o auditor, é inconcebível do ponto de vista da necessidade da utilização do sistema que uma região tão próspera ainda esteja à margem desses atendimentos considerados por ele os mais essenciais possíveis. “Estas pessoas vivem em cidades que possuem agências bancárias, têm Câmaras de Vereadores, prefeitura e não têm leitos SUS. Por que as pessoas vivem em cidades com agências bancárias e sem hospitais?”, indaga.

Para ele, diante de tantas situações de descaso, o caminho precisa mesmo ser a denúncia. “Mesmo assim, temos a sensação de que estamos enxugando gelo. As denúncias sempre dão repercussão, os governos se mexem um pouco aqui e ali, mas logo tudo volta ao status natural”, afirmou. “Se a mídia e o povo não continuarem brigando, a tendência é de que o SUS acabe. Eu faço questão de não pagar um plano de saúde, eu dependo do SUS e quando preciso brigo pelos meus direitos, todos precisam brigar pelos seus direitos”.

O auditor reforça que a implantação de leitos públicos para internamentos passam essencialmente pela vontade política. “Ela é a impulsionada pela pressão e pelos órgãos que fiscalizam [Ministério Público, imprensa], mas a pressão sempre acaba sendo preponderante (…) o Paraná é pioneiro em saúde, o SUS chegou primeiro a Curitiba e depois se expandiu para o interior, então pelo pioneirismo e por ser um estado rico, o atendimento à saúde não poderia faltar”, destacou.

 

Distantes na riqueza, perto na falta de atendimento

Mas nem a prosperidade faz da saúde pública uma prioridade. O que coloca dois municípios com realidades econômicas tão diferentes estarem em pé de igualdade em uma relação nada positiva à população local? Em uma das pontas da tabela está o Município de Cafelândia. Com mais de 17 mil habitantes, o Município tem o maior PIB (Produto Interno Bruto) per capita da região e um dos maiores do Estado, com R$ 82,3 mil/ano (dado do IBGE divulgado em dezembro de 2017 tendo como ano-base 2015, o último disponível para avaliação).

O PIB ali é sete vezes maior do que o de Diamante do Sul, com 3,5 mil moradores, e que tem o pior PIB per capita do oeste, com R$ 12,6 mil habitante/ano.

A similaridade entre as duas realidades fica por conta da falta de assistência em internamentos públicos e gratuitos: os dois não têm hospital municipal.

Em Cafelândia, a estrutura física chegou a ser concluída, mas permanece fechada por falta de equipamentos que seriam resolvidos com R$ 2,5 milhões de investimentos, segundo a secretária municipal de Saúde, Maria Catarina Cardoso. “Temos o pronto-atendimento com observação de seis e 12 horas, mas o hospital municipal ainda não está em funcionamento”, destaca.

Todos os meses o Município faz o encaminhamento, as chamadas AIHs (Autorizações de Internamentos Hospitalares), para 91 pacientes que vivem na cidade. Eles são atendidos nos hospitais de Nova Aurora, de Corbélia e de Cascavel, fazendo a estrutura de saúde pública nessas cidades inchar ainda mais.

O problema vem herdado pela atual gestão e ainda está longe de ser resolvido. O hospital em Cafelândia teria 53 leitos em funcionamento. Chegou a ser inaugurado pela antiga administração pública, a atual cancelou o ato e agora se espera o empenho de emendas parlamentares para equipar a unidade, além das adequações na edificação que já se mostraram necessárias. A contratação de médicos e demais funcionários é outro problema a ser enfrentado, assim que os outros problemas estiverem resolvidos.

Já a secretária de Saúde de Diamante do Sul, Eliane Tirelli, afirma que os problemas na cidade são os relacionados à falta de dinheiro. A cidade está no ranking de uma das mais pobres do oeste e depende, essencialmente, do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) para custear a máquina pública. Um hospital municipal está totalmente fora dos planos. Hoje o Município faz o encaminhamento de 22 AIHs por mês que são absorvidas nos hospitais de Guaraniaçu, Cascavel, Nova Aurora e Jandaia do Sul.

 

Municípios na região oeste que não têm nenhum leito SUS

Anahy

Braganey

Cafelândia

Campo Bonito

Catanduvas

Diamante do Sul

Iguatu

Iracema do Oeste

Mercedes

Ouro Verde do Oeste

Quatro Pontes

Ramilândia

Santa Lúcia

Santa Tereza do Oeste

Santa Terezinha de Itaipu

São Pedro do Iguaçu

Serranópolis do Iguaçu