Cotidiano

Temor sobre saída de Reino Unido da União Europeia abala mercados

262322734_1-12.jpgRIO, LONDRES E FRANKFURT – A possibilidade cada vez maior de o Reino Unido sair da União Europeia (UE), conforme sinalizado por quatro pesquisas de opinião divulgadas nesta terça-feira, sacudiu os mercados acionários globais, cujos principais índices fecharam em queda ? com a libra atingindo seu menor valor em dois meses. O referendo ocorrerá no próximo dia 23. Na Europa, o índice DAX, da Bolsa de Frankfurt, recuou 1,43%, e o CAC 40, de Paris, 2,29%. Já o FTSE 100, de Londres, caiu 2,01%, a seu menor patamar em pontos desde o fim de fevereiro, quando o primeiro-ministro inglês, David Cameron, anunciou a data do referendo. Desde a última quinta-feira, a Bolsa de Londres já perdeu 98 bilhões de libras de seu valor. E a cotação da libra ? que recuou ante 16 moedas mapeadas pela Bloomberg ? tocou a mínima em dois meses em relação ao dólar, com uma queda de 1,09%, a US$ 1,1410. Com isso, os principais bancos centrais do mundo já preparam uma ação coordenada, que incluiria troca de divisas, segundo a Reuters, para proteger a economia global.

Nos Estados Unidos, também registraram perdas Dow Jones (-0,33%), S&P 500 (-0,18%) e Nasdaq (-0,10%). Enquanto isso, o índice de referência da Bolsa de São Paulo (Ibovespa) teve queda de 2,04%.

? Temos visto o voto pela saída ganhar ímpeto nas pesquisas de opinião, e isso está trazendo o risco de volta ? disse à agência Bloomberg Alvin T. Tan, estrategista de câmbio do Société Généralé em Londres.

BC BRASILEIRO MONITORA MERCADOS

Das cinco pesquisas divulgadas nesta terça-feira, duas apontavam uma diferença maior entre os que querem o Brexit e quem é contra. Uma delas, realizada pela consultoria YouGov a pedido do jornal ?The Times?, aponta que 46% apoiam a saída da UE, enquanto 39% defendem a permanência. A outra, feita on-line pela TNS, mostra vitória do Brexit por 47% a 40%.

E pode haver ainda um fator externo pesando na opinião dos britânicos. Na avaliação do colunista do jornal ?The New York Times? Roger Cohen, o ataque a uma boate gay nos EUA, no domingo, influenciaria a opinião pública. ?Omar Mateen, o atirador da Flórida (…), acaba de conduzir Donald Trump para a Casa Branca, a Grã-Bretanha para fora da União Europeia?, afirmou em sua coluna, publicada na segunda-feira.

Prevendo forte turbulência nos mercados caso o Reino Unido deixe a UE, os principais BCs do mundo estão alinhavando iniciativas de suporte financeiro para proteger a economia global do impacto a curto prazo. Com linhas de swap, as autoridades monetárias se preparam para trocas recíprocas ? potencialmente ilimitadas ? de divisas, se faltar moeda estrangeira para exportadores e bancos. Seria uma ação semelhante à adotada em setembro de 2001 e na crise financeira de 2008. Isso porque o Brexit poderia provocar uma fuga de capitais, o que paralisaria os mercados de câmbio e prejudicaria um crescimento econômico global já fraco, pelo fato de as empresas não conseguirem acesso às divisas estrangeiras de que necessitam em suas operações cotidianas.

O BC brasileiro também está monitorando os mercados, de olho nas consequências de um possível Brexit. Segundo um técnico da equipe econômica, a certeza do governo é que o Brasil será afetado, com o agravante de não ter mais o grau de investimento (espécie de selo de bom pagador, concedido pelas agências de classificação de risco), o que deve interferir nos fluxos de capitais que viriam para o país.

? Já não daria para contar com tanta liquidez nos mercados lá de fora, ainda mais para financiar uma economia sem investment grade como a do Brasil. Não sei se será muito forte, mas terá um efeito na liquidez internacional que deve nos afetar ? afirmou um técnico ouvido pelo GLOBO.

Um dos temores é sobre o que pode acontecer com a abertura de um precedente para outros países deixarem a UE, como ressaltou o megainvestidor Bill Gross. ?Se o Brexit for aprovado, vai demorar muitos anos para isso se realizar. O perigo, contudo, é que outros podem se contaminar?, tuitou nesta terça a gestora de fundos Janus Capital Management, onde Gross é gerente de Portfólio.

Também nesta terça, o ministro das Finanças do Canadá, Bill Morneau, fez um apelo contra o Brexit e alertou que empregos em empresas canadenses estariam em risco caso os britânicos deixem a UE. O Canadá integra o Commonwealth, do qual fazem parte o Reino Unido e suas antigas colônias. Os cidadãos do Commonwealth residentes no Reino Unido poderão votar no referendo.

O Brexit também foi criticado pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk. Em entrevista ao jornal alemão ?Bild?, ele afirmou que a saída do Reino Unido é perigosa porque não há como prever as consequências de longo prazo. ?Como historiador, temo que o Brexit possa ser o início da destruição não só da UE, mas também da civilização política ocidental em sua totalidade?.

Para Ketish Pothalingam, gestor de portfólio da gestora de fundos Pimco, de todos os setores do Reino Unido, o mais exposto é o bancário. Ele disse ao diário de negócios ?Financial Times? que o principal risco negativo seria ?um choque no Produto Interno Bruto e queda nos preços de imóveis.?