Cotidiano

Suspensão de herbicida provoca divergências

Cascavel – Uma medida adotada recentemente pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) tem gerado repercussão nos setores ligados ao campo na região oeste do Paraná.

Há poucos dias a agência determinou o banimento do herbicida Paraquat, há anos presente no mercado e que agora tem um prazo legal de três anos para ser extinto do Brasil. Outros produtos que já foram banidos pela Anvisa nos últimos tempos foram o Metamidophos, Monocrotophos e o Endosulfan.

A decisão esquentou os grupos de bates de setores ligados à agricultura. Em Cascavel, um dos primeiros a levantar a questão foi Agassiz Linhares Neto, agricultor e que também exerce o cargo de secretário da Agricultura e Meio Ambiente de Cascavel. “Estou falando como agricultor, indignado com o banimento e apontando como causa o lobby das empresas multinacionais na Anvisa”.

Agassiz, inclusive, encaminhou aos deputados federais da região um ofício reivindicando a intercessão dos representantes na Câmara Federal para buscar uma opinião científica das universidades para saber se esse produto é mesmo obsoleto. “Tiram os produtos mais baratos para garantir a reserva de mercado de itens quatro vezes mais caros e isso acaba refletindo no bolso do agricultor”, denuncia Agassiz. “Por pressão das ONGs financiadas por essas multinacionais, esse produto é retirado do mercado, sobrando apenas os herbicidas com patentes vigentes, de custo elevadíssimo”.

Hoje, o Paraquat custa em média de R$ 11 a R$ 12 o litro, e o que sobra é um produto que, conforme Agassiz, custa em torno de R$ 40 o litro. “O lobby internacional é tão intenso que ONGs são usadas para afirmar que esse produto é ultrapassado e quem perde com tudo isso é a agricultura”.

Pressão comercial

Para Agassiz, essa decisão da Anvisa é fruto de uma pressão comercial que precisa deixar de ocorrer no campo. “Precisamos criar nossos próprios mecanismos de proteção aos negócios ligados à agricultura no País”.

Os produtos retirados pelo governo ajudam no controle do percevejo: “Só ficam no mercado à disposição do agricultor produtos protegidos por patentes que custam muito caro”.

O custo de produção na aplicação, que antes era de R$ 20 por alqueire, sem o Paraquat, vai subir para, no mínimo, R$ 50, de acordo com o agricultor.

Custo adicional na agricultura

O Paraquat é um herbicida usado em mais de 80 países, inclusive nos Estados Unidos, na Argentina, na Austrália, no Canadá, no Japão, no Chile e no Uruguai. Está registrado há 47 anos no Brasil e é essencial para o plantio direto na palha, prática conservacionista que mantém o solo sem revolver e que nos livrou da erosão e problemas de assoreamento de rios, dentre muitas outras vantagens ambientais. Além disso, é usado como dessecante para uniformizar a colheita de soja, eliminando hastes verdes.

Por fim, o herbicida é muito eficaz, não havendo erva daninha resistente a ele, o que o torna um forte aliado no manejo de ervas resistentes ao glifosato, o que constitui um problema a se resolver no País. Além disso, ajuda ao encurtar um precioso tempo no calendário para o plantio da segunda safra. Levantamento aponta que o custo adicional para a agricultura será de R$ 460 milhões, em relação à troca do Paraquat por substitutos disponíveis no mercado.

Professor da UFPR aponta perigo

O professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná) Victor Pelaez integra o grupo de pesquisas que estuda agrotóxicos. Para ele, o Paraquat é um produto extremamente tóxico, banido da União Europeia diante dos perigos atribuídos a ele. “Há riscos econômicos com a utilização e sua retirada deve ser precedida de alternativas mais viáveis e de custo reduzido por parte dos fabricantes”, pontua.

Ele cita os Estados Unidos como exemplo. Lá, para que um fitossanitário seja aprovado, precisa passar por uma rigorosa análise e suas consequências para o consumo humano, se aplicado em doses elevadas. “Precisamos seguir uma série de critérios e conscientizar o agricultor sobre o uso adequado desses produtos, e citar a utilização indispensável de EPIs durante o seu manuseio”.

Todo esse trabalho necessita de uma ação intensa de fiscalização, medida difícil de ocorrer no Brasil por conta de falta de material humano para realizar esse serviço. “Nos Estados Unidos, o produtor passa por um treinamento obrigatório para somente depois ter acesso ao produto”, compara.

Pesquisador da Embrapa explica causas e impacto

De passagem por Cascavel, o pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Dionisio Gazziero também se manifestou sobre a repercussão em torno do banimento do Paraquat, considerando inicialmente que a retirada de um produto do mercado leva à perda de uma ferramenta importante no campo.

“O impacto é inevitável e, obviamente, surgirão outros produtos que desempenharão o mesmo papel, gerando como consequência problemas em relação ao seu custo”, destacou.

Hoje, um número expressivo de produtores utiliza esse herbicida para o controle de pragas.

O pesquisador chama a atenção para alguns pontos: a preocupação antiga dos órgãos de saúde em relação ao produto e os alertas emitidos pela Europa em torno da presença de resíduos no produto exportado, mesmo com o nível dentro do limite preconizado pela OMS (Organização Mundial da Saúde). “Na verdade, eu questiono se todas as aplicações de fato são necessárias e hoje esse é o produto principal usado na dissecação”.

Gazziero aponta um conjunto de situações envolvendo o produto, como uso intensivo e até mau uso, pela falta de respeito muitas vezes ao período de carência pós-aplicação, que é de sete dias. “Se não agir dessa forma, os resíduos vão estar presentes”.

Para ele, o manejo de produtos químicos precisa seguir uma regra: “Se usássemos de forma racional e adequada, talvez não despertasse tanto o interesse de alguns continentes em banir a presença desses produtos”, alerta.

SEM SAÍDA

Adapar fecha o cerco ao Paraquat

Curitiba – Logo que soube da determinação da Anvisa proibindo o uso do Paraquat no campo, a Adapar (Agência de Defesa Agropecuária do Paraná) orientou suas equipes de fiscalização para ficarem atentas a qualquer ato suspeito em torno do uso desse projeto nas lavouras. Até agora, não foi registrada notificação nesse sentido.

De acordo com o coordenador do Cadastro de Agrotóxicos da Adapar, Renato Rezende Blood, a agência atuará na fiscalização em cima das restrições que ocorreram envolvendo a dessecação para a colheita. “Quem for pego a partir de agora usando o produto será autuado e, dependendo da situação, poderá ser multado”, avisou.

Segundo ele, a fiscalização não vai se restringir apenas ao campo. A proibição envolve o uso costal e aplicação em áreas. “Hoje temos vários produtos que tem o Paraquat como ingrediente ativo”.

O comércio de insumos também receberá a visita da Adapar para saber se o estabelecimento continua comercializando o produto.