Cotidiano

?Somos um país de indiferentes?, afirma analista de conflitos sobre plebiscito na Colômbia

201610021954542560_RTS.jpgBUENOS AIRRES – Embora tenha respaldado o ?sim? durante todo o processo e se sentido profundamente decepcionado com o resultado de ontem, o analista de conflitos Pedro Santana, da Corporação Latino-americana Sur, reconheceu que a campanha do governo de Juan Manuel Santos cometeu ?vários erros?. Em poucas palavras, disse ele, o ?sim? foi derrotado ?porque representava um entendimento entre um governo e uma guerrilha impopulares, apoiados pela desgastada classe política tradicional da Colômbia?.

O GLOBO – Como se explica a vitória do ?não??

PEDRO SANTANA: É uma coisa de loucos, estamos em estado de choque. As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) são uma guerrilha muito impopular na Colômbia. Uma guerrilha que teve mais de 2 milhões de vítimas diretas. Hoje vemos que era como tentar vender um produto que os consumidores sabem que é ruim. Isso pesou muito na decisão. Além disso, quem promovia a venda desse produto era também um governo impopular por suas políticas econômicas.

A participação foi baixíssima…

Das mais baixas da História. Ficou claro que somos um país de indiferentes, já que 63% dos eleitores não participaram. Como se a paz não fosse um problema deles.

A campanha do ?sim? não convenceu?

Devo admitir que a estratégia do ?sim? foi desastrosa. Convocaram políticos de imagem desgastada, da classe política tradicional.

Mesmo assim todos confiavam na vitória do ?sim?…

Acho que minimizamos a importância dessas questões. As Farc tiveram uma atitude positiva, pediram perdão, se reuniram com as vítimas. Mas não foi suficiente.

Como o senhor entende o voto pelo ?não??

Tivemos uma diferença de apenas 60 mil votos. Acho que pesaram duas coisas: a participação das Farc na política e a ausência de uma reclusão tradicional no acordo sobre justiça. Eles teriam seus movimentos limitados, mas não iriam para uma prisão normal. As pessoas não entenderam que não se tratava de uma rendição e sim de uma negociação com uma guerrilha que não foi derrotada no campo de batalha. Como promotor do ?sim?, acho que erramos em não restringir a participação na campanha dos políticos tradicionais. A mensagem de Santos foi a de que privilegiava os partidos com pior imagem no país, tirando espaço das vítimas e dos movimentos sociais.

O ?não? foi mais forte nas grandes cidades…

Os que decidiram derrotar o acordo de paz são os que não vivem nem viveram a guerra. O acordo de paz não mobilizou, não interessou a 63% dos eleitores. As pessoas não se sentiram comovidas pela paz e ficaram em casa.

Como fica Santos a partir de agora?

Profundamente enfraquecido. A Corte disse que o presidente tem instrumentos jurídicos para aplicar o acordo, mas tudo deve passar pelo Congresso.

O acordo poderia vir a ser renegociado?

Acho que ainda existe margem, mas é difícil. Santos está obrigado a buscar uma aproximação com o uribismo. Já as Farc estão no pior dos mundos, abandonaram as armas e agora deverão ver como reagir a esta derrota.