Cotidiano

Snapchat: O fantasma das redes nas eleições

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RIO ? A rede social surgiu oficialmente em 2011, criada por Evan Spiegel, jovem empreendedor oriundo da Universidade de Stanford, nos EUA, que teve uma ideia nascida da necessidade pessoal de um colega: a vontade de se criar algum meio para enviar fotos que se apagassem rapidamente depois que recebidas pelo destinatário. Hoje, cinco anos depois, o Snapchat – ou, simplesmente, “Snap” – tem mais de 150 milhões de usuários ativos que passam cerca de meia hora no aplicativo diariamente, contando histórias, lendo notícias, interagindo com amigos e acompanhando o dia a dia de estrelas do mundo pop e… Políticos.

Com o boom da rede social nos EUA, campanhas eleitorais americanas perceberam nela um potencial para falar com um público jovem. Na terra de Barack Obama, a faixa etária que mais utiliza a rede social do fantasminha – ícone do app justamente pela ideia de não deixar rastros – é justamente aquela de 18 a 24 anos. Segundo uma pesquisa da comScore de abril deste ano, eles somam 69% dos donos de smartphones que são usuários do app. No Brasil, a ideia ainda não engrenou no cenário político, mas, para as eleições deste ano, políticos já começam a usar o aplicativo, movimentando o período eleitoral em mais um rede social.

Entre os oito candidatos mais bem colocados nas pesquisas para a Prefeitura do Rio de Janeiro, três não tem contas no snap: Alessandro Molon, Marcello Crivella e Indio da Costa. Durante a apuração desta reportagem, Marcelo Crivella, candidato do PRB, se mostrou interessado em participar da rede, se inspirando na forma como Hillary Clinton a utiliza na campanha presidencial dos EUA. Os outros dois, segundo suas assessorias, optaram por priorizar redes que invistam em vídeos permanentes, como o próprio Facebook ou o Periscope. Dos candidatos que utilizam, Freixo e Jandira são os que mais se destacam, ainda que com uma regularidade de postagens muito inferior ao apresentado na rede de Mark Zuckerberg.

Para Adriana Buarque de Holanda, professora de Comunicação Digital com doutorado em Comunicação pela UFF, o Snapchat se destaca por trazer à campanha política o conjunto de dois fatores importantes de aproximação com o eleitorado: a ideia do autorelato e do vídeo ao vivo. Ela destaca que o app é um bom meio do candidato expor o dia a dia da campanha e de complementar as ferramentas de engajamento de outras redes sociais.

A diferença do Snap, porém, está no público alvo e no formato bastante informal da rede. Para Adriana, quem quiser falar para o público jovem tem que usar o Snapchat:

? O Facebook não tem mais a quantidade de engajamento como tinha antes. O Snapchat vem com outra linguagem, outra oportunidade. O novo proporciona mudanças. O candidato com um argumento de mudança vai usar o Snapchat, que vem como ferramenta muito grande pra envolver o jovem na politica.

Uma das maiores dificuldades das campanhas que optarem por usar o Snapchat é entender como participar da rede usufruindo de duas das suas principais características: a casualidade e o humor. Para Pedro Lenhard, pesquisador da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV, os dois pontos vão de encontro à forma como normalmente as propagandas políticas são feitas no país e que, mesmo após anos de utilização das redes sociais, ainda não tem uma forma ideal.

? Não vejo que 2016 seja o ano das eleições no Snapchat. Estamos muito bem no Facebook, no Twitter e no Instagram, mas Snapchat é muito iniciante ainda. Ele mostra o dia a dia e humaniza o candidato. É bom para os eleitores jovens verem que os candidatos são gente como a gente. O que eu acho é que ele ainda não está sendo usado na completude no Brasil hoje ? diz Lenhard.

Juliano Borges, professor de Comunicação do Ibmec e pesquisador de internet e novas mídias, concorda com Lenhard. Para ele, as evoluções tecnológicas chegam às campanhas políticas com uma eleição de atraso. Por conta disso, talvez seja possível observar uma melhor utilização do Snap apenas em 2018. O fato das imagens se perderem com o tempo e não haver uma forma evidente de mensuração de impacto – a empresa não fornece dados de engajamento, como outras redes sociais, apenas permite que o usuário saiba quem o segue e quem viu as publicações compartilhadas – também é um dificultador. Borges acredita que a fugacidade das publicações do Snap podem ser um delimitador no interesse das campanhas em fazer parte dele, mas destaca que, se o interesse for se aproximar do jovens, o Snap pode ser uma solução:

? Ao mesmo tempo que é novidade, fica muito muito restrito à própria novidade, mas não sei até que ponto a funcionalidade vai muito além do que uma tentativa de se comunicar com um eleitorado mais jovem, aí sim poderia se ter um investimento maior ? reflete Borges.

NOS EUA, CORRIDA PRESIDENCIAL GANHOU O APLICATIVO

Durante as primárias democratas para as eleições presidencias norte-americanas, Hillary Clinton e Bernie Sanders souberam usar a rede para aumentar a rede de contato com o eleitorado. Com a delimitação da não obrigatoriedade do voto no país, os candidatos se mostraram dispostos a conquistar os jovens onde eles estavam: no Snapchat.

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Em janeiro deste ano, Sanders usou o Snap para produzir uma campanha publicitária, especificamente no estado de Iowa, onde precisava conquistar votos. Durante nove dias, usuários foram capazes de utilizar filtros temáticos da campanha de Bernie Sanders em suas publicações. A ideia, de acordo com o Wall Street Journal, era que os jovens “snapchatters” ajudassem a propagar o nome de Sanders e o dia da votação da primária estadual. O feito se repetiu durante as primárias de Nova York, estado político de Hillary.

A campanha da ex-primeira-dama e ex-senadora dos EUA também desenvolveu filtros temáticos durante as primárias, porém, mais focadas em Donald Trump. Em um deles, o usuário da rede tinha a possibilidade de inserir em sua publicação a imagem de um boné com os dizeres “Deport Trump” (Deporte o Trump, em tradução livre). Para Lenhard, a diferença entre a utilização do aplicativo em campanha eleitoral nos EUA e no Brasil reside justamente na questão do voto:

? Nos EUA, todo debate é o quanto é que o Snap vai fazer os “young voters” a votar. No Brasil, o debate é outro porque você é obrigado a votar. Eu acho que isso é algo a ser visto. O que de fato está influenciando o jovem é toda a discussão na rede é como ele está pegando informação do candidato dele. Hoje dá para dizer que o eleitor de 18 a 24 anos tem muito mais acesso a política pública por causa das redes. O Snapchat é instrumento acessório e não decisivo. Ainda.