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Seleção de futebol tenta aprender a conviver com o peso da história de recentes fracassos

Teresópolis. O sonho da Copa do Mundo, em casa, encerrado com um 7 a 1; os maus resultados recentes; o jejum histórico de medalhas de ouro olímpicas, conquista inédita para o futebol brasileiro; um país sob o estigma, alimentado pelos resultados, de não produzir mais talentos. Poucas vezes uma seleção brasileira entrou em campo com tantas contas a acertar com a história, mesmo que os jogadores atuais não a tenham escrito. E a conta recai sobre um time jovem, quase todo sub-23, às vésperas de outra disputa em casa.

Em Teresópolis, o elenco que se prepara para a Olimpíada do Rio tenta se relacionar com o passado, entender a melhor forma de lidar com tantos fatores que se somam à responsabilidade natural de jogar uma competição pela seleção.

Nenhum dos jogadores atuais esteve no 7 a 1, tampouco Neymar, machucado na ocasião. O atacante é o único que já jogou uma Olimpíada, mas também não é responsável pelo país jamais ter ganho o ouro em qualquer edição dos Jogos. Entre isolar o time atual do peso histórico do torneio e assumir toda a responsabilidade, há um caminho intermediário.

— A gente tem que filtrar as coisas boas, não apagar a história. Porque a história da seleção tem cinco títulos mundiais, tem uma tradição que impõe respeito e pressiona os rivais também. Um técnico português uma vez me falou que, taticamente, já se inventou de tudo no futebol. O que ainda não foi tão trabalhado é o lado mental — afirmou o goleiro Fernando Prass que, com 38 anos, é de longe o mais velho da equipe.

COMPONENTE SOCIAL

Prass pede que o time enxergue a ocasião como uma oportunidade. E ampliou o debate para além do futebol.

— Mesmo se o Brasil já tivesse vencido dez vezes a Olimpíada, a pressão seria enorme — avisou. — Resultados abaixo do esperado geraram frustração. Mas temos que entender a sociedade em que vivemos. O país vive frustrações em diversas áreas, como o governo, há um componente social. Num país apaixonado por futebol, ele vira alvo.

Apesar do reconhecimento de que há um fator mental importante cercando a seleção, não haverá um profissional especializado com o grupo, que tem média de idade bem baixa. Pelo regulamento, 15 dos 18 convocados têm até 23 anos. Além de Prass, fogem à regra Renato Augusto, de 28 anos, e Neymar, de 24.

— Não teremos um profissional desta área (psicologia). Caberá à comissão técnica dar suporte. Estes jovens não podem receber toda a pressão pelo Brasil não ter esta medalha. Queremos passar tranquilidade— explicou Erasmo Damiani, coordenador das divisões de base da seleção brasileira.

A tarefa exigirá esforço. Boa parte do elenco de jogadores jamais enfrentou uma grande competição com a seleção brasileira. Em especial com o peso de jogar em casa. O mesmo se aplica ao comando da comissão técnica. O técnico Rogério Micale e o próprio Damiani construíram suas carreiras quase que inteiramente em divisões de base. Também vivem uma experiência inédita num torneio de tanta visibilidade.

Exportador de jogadores, o futebol brasileiro dá, muito cedo, responsabilidades aos jovens nos grandes clubes. Casos de Gabriel, Gabriel Jesus, considerados dois exemplos claros de que o país segue produzindo talentos. O zagueiro Luan, de 23 anos, titular absoluto do Vasco, exibe maturidade.

— Temos uma oportunidade de mostrar que o Brasil ainda tem talento, que é um grande revelador de jogadores. Claro que é ruim a seleção perder de 7 a 1. Até em termos de valorização internacional. Antes de tudo, temos que mostrar a nós mesmos que somos bons. E conquistar a confiança da torcida — disse Luan.

Fernando Prass admitiu que, pela idade, tem papel importante no time, embora viva sua primeira passagem na seleção.

— Mas liderança não se fabrica. Um jovem de 19 anos, de repente, pode assumir. Mas tenho vivências que um garoto ainda não teve. Meu caso é mesmo raro. É como de um casal que passa anos tentando engravidar e até desencana. Quando consegue, a alegria é ainda maior.