Cotidiano

?Samba poconé?, do Skank, ganha turnê comemorativa e edição especial de 20 anos

RIO ? Em um passado nem tão distante, antes de o sertanejo universitário e o funk dominarem as paradas, o pop rock, o pagode e o axé coexistiam nas rádios e nos programas de TV do país. Nesse contexto, ali na década de 1990, poucas bandas aproveitaram melhor a onda favorável que o Skank. ?Calango? (1994), o segundo disco de estúdio, apresentou os mineiros ao grande público com um caminhão de hits (?Jackie Tequila?, ?Pacato cidadão?, ?Te ver?, ?Esmola?…). No total, foram seis músicas tocando nas rádios e mais de um milhão de cópias vendidas. Pode parecer uma heresia, e eu sei que isso incomoda alguns fãs, mas eu vejo ‘Samba poconé’ como um aperfeiçoamento do ‘Calango’. Em termos estéticos e musicais, é um disco mais bem resolvido e ousado

Com o sucesso, naturalmente, veio a pressão interna (e externa) para manter viva a popularidade conquistada ? afinal, foi também uma década de sucessos efêmeros. O tal teste do segundo disco, para o Skank, veio com o terceiro. ?O samba poconé? completa 20 anos em 2016 com direito a uma miniturnê comemorativa cuja estreia será neste sábado, no Vivo Rio

O álbum pode não ter repetido o número de hits radiofônicos de seu antecessor, mas teve o dobro de vendas e permitiu que o Skank fizesse suas primeiras turnês internacionais. Um êxito em grande parte alavancado pelo fenômeno ?Garota nacional?, cujo sucesso ultrapassou as fronteiras das paradas brasileiras e conquistou mercados como Espanha, Itália, Portugal, Argentina e Chile.

? Pode parecer uma heresia, e eu sei que isso incomoda alguns fãs, mas eu vejo ?Samba poconé? como um aperfeiçoamento do ?Calango?. Em termos estéticos e musicais, é um disco mais bem resolvido e ousado, foge daquela cartilha do dancehall, a banda está mais atrevida no estúdio… ? avalia Samuel. ? Apesar de ter mais recheio e mais história, o desempenho dele no rádio ficou muito monopolizado por ?Garota nacional?, enquanto ?Calango? foi mais democrático nesse sentido.

SUPEREXPOSIÇÃO

O tom de lamento é justificado. O vocalista e compositor costuma dizer que o Skank ?sobreviveu à popularidade do hit?. Sabendo desde o início do potencial que versos como ?Porque ela derrama um banquete, um palacete/ Um anjo de vestido, uma libido do cacete? e o quase impronunciável refrão (?Beat it laun, daun daun…?) carregavam, a banda temia o esgotamento causado pela superexposição. Afinal, a lasciva ?Garota nacional? não encontrava par em um disco que falava de racismo (?Los pretos?), reforma agrária (?Sem terra? ambas com participação de Manu Chao), amor (?Tão seu?) e até do esporte mais popular do país (?É uma partida de futebol?).

Outra preocupação inicial que a banda teve com ?Garota nacional? foi quanto ao conteúdo da letra escrita por Chico Amaral, parceiro recorrente de Samuel Rosa na discografia do Skank. O vocalista apresentou os versos já avisando que eram ?muito diretos e explícitos?.

? É difícil imaginar como seria a reação se o Skank lançasse uma música como aquela hoje. Ela entrou em um contexto diferente, em 1996? Mas o que a juventude tem ouvido hoje, o que toca na rádio, ultrapassa o que seria prudente no quesito letras diretas e possessivas ? avalia Samuel. Skank – ‘Garota nacional’

? O mais ousado mesmo era o clipe, que passava na MTV com todas aquelas mulheres nuas. Fomos questionados sobre isso na Espanha, por exemplo, mas não no Brasil. É uma letra explícita, mas que condizia com o nosso momento ? lembra o baterista da banda, Haroldo Ferretti. ? Se você ouvir os funks de hoje, ?Garota nacional? poderia ser considerada uma música de criança (risos).

Certo mesmo é que, desde a Skankmania causada por ?Garota nacional?, é possível contar nos dedos os exemplos de músicas lançadas por bandas de pop rock nacional que chegaram a uma repercussão próxima daquela.

? A causa disso é uma pergunta difícil e recorrente. As gerações seguintes não conseguiram repetir as façanhas alcançadas pelas de 1980 e 1990, que chegavam às multidões e disputavam espaço pau a pau com o axé e o pagode. Podemos citar nisso a conduta das gravadoras, as apostas erradas, mas também uma postura meio preconceituosa da geração de 2000 com os meios populares, algo que não existia em 80. Legião, Paralamas, Plebe Rude tinham discursos fortes, mas faziam o programa do Chacrinha. Eles se deixavam atingir por todos os tipos de público. Começou a existir um pudor muito grande com essa exposição. Acho que a conduta rock?n?roll foi mal interpretada pela geração 2000 no Brasil ? justifica Samuel.

Baterista da banda, Haroldo Ferretti guarda até hoje demos e imagens de ensaios que a banda fez durante a gravação no estúdio localizado na casa de seus pais. O material inédito estará em uma edição especial tripla de ?Samba poconé?, a ser lançada em novembro ? além do álbum original e dos registros do baterista, um terceiro disco trará versões da gravação principal, no estúdio Mosh (SP), e remixes organizados por Dudu Marote, produtor do disco, assim como a inédita ?Minas com Bahia?. Composta e gravada para estar em ?Samba poconé?, a faixa acabou sendo gravada por Daniela Mercury no álbum ?Feijão com arroz? (1996).

Na curta temporada de shows comemorativos de 20 anos de ?Samba poconé?, o Skank iniciará as apresentações com um bloco dedicado ao disco ? das 11 faixas, apenas ?Los pretos?, ?Sul da América? e ?Um dia qualquer? devem ficar de fora. Enquanto ainda viaja com a turnê de ?Velocia?, seu nono álbum de estúdio, lançado em 2014 ? Samuel concilia a agenda com os shows que faz com Lô Borges ?, a banda ainda não começou a pensar no próximo trabalho, mas a tendência, segundo os integrantes, é que entrem em estúdio no ano que vem.

Skank ? Turnê de 20 anos de ?Samba poconé?

Onde: Vivo Rio ? Avenida Infante D. Henrique, 85, Flamengo (2272-2901). Quando: No sábado, às 22h. Quanto: De R$ 100 a R$ 260. Classificação: 18 anos.