Cotidiano

Renzi confirma renúncia após derrota em referendo, mas posterga saída

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ROMA ? O primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, postergou sua renúncia até pelo menos sexta-feira, após anunciar sua saída em função do fracasso na proposta de levar adiante uma ampla reforma constitucional que mudaria a estrutura política do país. Após o Conselho de Ministros chegar a um consenso por sua saída, ele foi ao Palácio do Quirinal, sede da Presidência, para comunicar ao presidente Sergio Mattarella que deixará o cargo, mas que esperará a votação da Lei de Orçamento até o fim desta semana. Pela manhã, Mattarella disse que o clima político é de “serenidade e respeito recíproco”, tentando convencer Renzi a ficar no cargo por mais tempo e evitar uma nova eleição, mas ainda cogitando indicar um nome técnico para liderar um governo de transição.

? Faço isso por senso de responsabilidade e para evitar o exercício provisório do cargo ? disse ele, citado pelo “La Repubblica”.

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Mattarella e Renzi se encontraram nesta manhã no Palácio do Quirinal. Logo depois, o presidente emitiu um comunicado no qual destacou que “a elevada participação no voto (…) é o testemunho de uma democracia sólida, de um país apaixonado, capaz de participação activa”. Tentando apaziguar os ânimos, o presidente disse ainda em sua declaração que “o clima político (…) está marcado pela serenidade e pelo respeito recíproco”.

TEMORES SOBRE FUTURO NA EUROPA

Enquanto a Itália acordava nesta segunda-feira cercada de incertezas sobre seu futuro político, cresciam os receios de que a renúncia de Renzi leve a uma crise na zona do euro. O premier anunciou que deixaria o cargo na noite de domingo, quando os resultados das urnas apontavam que ele perderia um referendo sobre sua proposta de reforma constitucional no país. A derrota de Renzi poderá fortalecer a oposição, incluindo a bancada eurocética que defende uma consulta popular sobre o abandono do euro no ano que vem, depois que a moeda atingiu uma baixa recorde dos últimos 21 meses na madrugada desta segunda-feira.

A saída de Renzi provoca incerteza sobre como será o próximo governo no país. Mas, minutos após o premier ter reconhecido a derrota no domingo, a oposição já pressionava por eleições antecipadas, na esperança de ampliar sua potência política com novas votações no ano que vem ? o fim do mandato do premier estava previsto para 2018. O resultado preocupa os vizinhos europeus, uma vez que a derrota da reforma é considerada a terceira revolta eleitoral antissistema neste ano para o Ocidente ? depois do Brexit no Reino Unido e da vitória de Donald Trump para a Presidência dos EUA.

Segunda força política no país, o populista Movimento Cinco Estrelas (M5S), fundado pelo comediante Beppe Grillo, comemorou a derrota de Renzi, após ter investido em uma forte campanha pelo “Não” ? assim como a xenófoba Liga Norte, de Matteo Salvini, e a Força Itália, de centro-direita. O vice-presidente da Câmara dos Deputados, Luigi di Maio, que é também um dos líderes do movimento, prometeu que começariam os novos esforços já nesta segunda-feira:

? A partir de amanhã, começaremos a trabalhar para formar o time do futuro governo Cinco Estrelas ? disse di Maio no domingo, repetindo o tom da sua recente entrevista ao GLOBO.

Primeiro-ministro da Itália renuncia

O movimento antissistema, cujo discurso se constrói, em grande parte, na crítica à velha classe o abandono do euro, defende uma consulta popular para votar o abandono do euro pela Itália. O discurso temores de uma crise na zona do euro e do aprofundamento da desintegração na União Europeia (UE) ? já fragilizada pela saída britânica do bloco, aprovada em referendo em junho no Reino Unido.

Nesta segunda-feira, o euro já caiu e atingiu seu índice mais baixo nos últimos 21 meses em comparação ao dólar. Os investidores fugiram de ativos mais arriscados depois que Renzi anunciou a derrota. E, ainda, a derrota ameaça os esforços para estabilizar a economia italiana e o seu instável sistema bancário.

Daniele Caprepra, porta-voz do M5S no Reino Unido, disse à rede BBC que a oposição é a favor do movimento para debater a permanência italiana na zona do euro:

? O euro é um problema para a Itália agora, e nós gostaríamos de ouvir a voz das pessoas sobre isso. O euro está prejudicando a economia italiana e não é bom o suficiente pra a Itália agora.

Nesta segunda-feira, o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, afirmou que a Itália deveria manter as políticas econômicas de Renzi.

? A Itália tem que continuar o caminho que o primeiro-ministro Matteo Renzi tomou economica e políticamente ? disse. Info referendo Itália

DERROTA SIMBÓLICA

Renzi propôs um pacote de mudanças cuja principal plataforma era a drástica redução dos poderes do Senado, e, na sua campanha pela aprovação do texto, prometeu que sairia do governo caso os italianos dissessem “Não” à reforma. Esta foi uma simbólica derrota para Renzi, uma vez que, nas últimas pesquisas antes da votação, a maioria dos italianos dizia que votaria apenas pensando em manter o premier no governo ou retirá-lo do poder. O resultado foi amplamente comemorado pelos seus opositores.

“Viva Trump, viva Putin, viva la Le Pen e viva a Liga!”, escreveu, em seu Twitter, o líder da Liga Norte, Matteo Salvini. salvini

O resultado das urnas foi expressivo, superando significamente a margem de liderança do “Não” que era esperada, tomando como base as últimas pesquisas de intenção de voto: 49,69% dos italianos que foram às urnas votaram “Sim” e 59,11% votaram “Não”.

? O “Não” venceu de forma clara ? declarou Renzi em entrevista coletiva, em que acrescentou: ? Assumo a responsabilidade pela derrota. Minha experiência como chefe de governo termina aqui. Amanhã apresentarei minha renúncia.

Dentre as possibilidades para a Itália agora, está a formação de um governo tecnocrático, em que o presidente italiano, Segio Mattarella, apontaria um novo líder do governo com o apoio da atual maioria de centro-esquerda do Parlamento. É a hipótese apontada como a mais provável pelos analistas políticos. Dentre os nomes mais cotados, estão o Presidente do Senado, Pietro Grasso, e o ministro das Finanças, Pier Carlo Padoan. A função deste governo seria preparar uma nova lei eleitoral antes da votação de 2018 ? a atual foi declarada inconstitucional pela Justiça e só teria sido resolvida com a vitória do “sim”.

Outra opção seria a dissolução do Parlamento, com a convocação de novas eleições, como pedem os partidos de oposição. Esta alternativa representaria um momento de alta instabilidade política para a Itália. E muitos partidos já expressaram que não estão de acordo com esta opção, sobretudo pra evitar uma vitória populista. Além disso, embora menos provável, Renzi poderia receber um voto de confiança do Parlamento. O premier, no entanto, aparentemente excluiu essa possibilidade no domingo.ITALY-REFERENDUM_-GTI31F1TJ.1.jpg