Cotidiano

Renan quer encontro com Moro para defender lei de abuso de autoridades

BRASÍLIA – Enquanto os investigados da Lava-Jato correm do juiz Sérgio Moro como o diabo da cruz, numa situação inusitada o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), anunciou na noite de quarta-feira, em uma conversa informal com jornalistas, que pretende marcar um encontro com o magistrado para discutir o polêmico projeto que atualiza a lei de abuso de autoridades. Investigado na operação com foro privilegiado, no Supremo Tribunal Federal (STF), Renan disse que vai convidar Moro para discutir as alterações, que para os integrantes da força tarefa é um tiro certeiro no coração da Lava-Jato.

Momentos antes da conversa o novo líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), confirmara que decidira abandonar a relatoria do projeto na Comissão Especial, e que Renan escolheria um substituto. Renan, autor do projeto, disse que na reunião de líderes marcada para hoje à tarde, irá decidir quem será o substituto de Jucá.

Depois da invasão do Senado pela Policia Federal na Operação Métis, que prendeu agentes da Polícia Legislativa, Renan voltou a carga e, mesmo com manifestação contrária da maciça maioria dos senadores, ele não desistiu de correr para aprovar a lei que pune crimes de autoridades.

Ontem o presidente do Conselho de Ética da Casa, senador João Alberto (PMDB-MA), arquivou representação apresentada por um grupo de cinco juízes pedindo que Renan fosse julgado por quebra de decoro parlamentar. A base da representação, segundo os juízes que dizem pertencer ao grupo ? Magistratura Independente?, com 1.200 integrantes em uma rede social, seria o ataque adjetivado de Renan, que se referiu ao juíz Vallisney Oliveira, que autorizou a prisão dos agentes da Polícia Legislativa como ?juizeco?.

Senadores da base e da oposição rejeitam a disposição de Renan Calheiros de agilizar a lei que altera e torna mais rigorosa a lei que define crimes de abuso de autoridade cometidos por membro dos Três Poderes, mas especialmente autoridades policiais e do Ministério Público. Nem mesmo depois da prisão dos agentes da Polícia Legislativa do Senado os paralamentares concordam que a tramitação da matéria deve ser agilizada na comissão especial.

CRÍTICAS

As mudanças propostas na lei listam 38 crimes com penas que vão de prisão de 1até quatro anos, e a perda de cargo, mandato ou função, se o servidor é reincidente. O senador Álvaro Dias (PV-PR) diz que discutir abuso de autoridade agora é ?abusar da inteligência nacional? e passa a ideia de provocação e confronto.

? Não se produz boa lei nessas circunstâncias. São vários os equívocos da proposta , mas ela já esbarra na preliminar da oportunidade. Essa precipitação repercute como uma velada obstrução de Justiça já que com visível objetivo de intimidar ? criticou Álvaro Dias.

? Esse projeto é absolutamente estranho a pauta, absolutamente delicado e sensível e não tem qualquer sentido de prioridade nesse momento. Vai soar muito mal discutir isso agora ? concorda o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), autor da PEC da reforma política junto com Aécio.

A grande maioria dos senadores, apesar de defender a modernização da lei de 1966, critica a pressa de Renan em um momento delicado da Operação Lava-Jato, alegando que a reforma do Código Penal levou 16 anos. Na consulta pública feita pelo portal do Senado, 21.375 pessoas se colocaram contrárias ao projeto, contra apenas 467 a favor. A maioria não concorda ainda com a tramitação casada com a reforma política, já com calendário fechado no Senado.

? A Lei de Abuso de Autoridade é inoportuna. O que a sociedade quer é nosso apoio às medidas de combate à corrupção e o fim do foro privilegiado ?reagiu a senadora Ana Amélia (PP-RS).

Nos partidos de esquerda a tentativa de agilização também não encontra apoio.

? Claro que não concordo com essa tramitação. E farei combate total a esse projeto ? avisou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

O líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), alerta que o teor do projeto de Renan pode até modernizar a legislação, atualizando inclusive avanços na área de Direitos Humanos, mas não pode ser aprovado a toque de caixa, num momento delicado por que passa o País. E avisou que o PSDB já fechou questão contra a aceleração da tramitação.

? A reforma do Código Penal durou 14 anos. Porque esse projeto não pode durar um ano de debates? Nossa prioridade é consertar a economia,combater a corrupção e apoiar a Lava-Jato. Somos contra qualquer coisa que possa parecer intromissão, cerceamento ou constrangimento ás investigações ? avisou o líder tucano Paulo Bauer.

PRINCIPAIS PONTOS DO PROJETO

1) Ordenar ou executar captura, detenção ou prisão fora das hipóteses legais ou sem suas finalidades, recolhe ilegalmente alguém a carceragem policial, : Pena-detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

2)Deixar de comunicar prisão em flagrante à autoridade judiciária no prazo legal:Pena-detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

3) Constranger o preso ou detento, exibir seu corpo a curiosidade pública, submeter-se a situação vexatória ou constrangimento não autorizado em lei: Pena detenção de 1 a 4 anos e multa

4) Ofender a intimidade, a vida privada, a honra ou imagem de pessoa indiciada em inquérito policial, autuada em flagrante delito, presa provisória ou preventivamente seja ela acusada , vitima ou testemunha de infração penal, constrangendo-a a participar de ato de divulgação de informações aos meios de comunicação ou serem fotografadas ou filmadas : Pena detenção de 1 a 4 anos e multa

5) Constranger alguém sob ameaça de prisão, a depor sobre fatos que possam incriminá-lo. Pena detenção de 1 a 4 anos e multa

6) Submeter o preso a interrogatório policial durante seu período de repouso noturno, salvo se capturado em flagrante delito ou se ele , devidamente assistido, consentir em prestar declarações. Pena detenção de 6 meses a 2 anos e multa.

7) Dar publicidade, antes de instaurada a ação penal,a relatórios, documentos, ou papéis obtidos como resultado de interceptação telefônica , de fluxo de comunicação informática e telemática, de escuta ambiental ou de quebra de sigilo bancário, fiscal ou telefônico autorizados. Pena detenção 1 a 4 anos e multa.

8) Exceder-se o agente público, sem justa causa, no cumprimento de ordem legal, de mandado de prisão ou de mandado de busca e apreensão com ou sem violência. Pena detenção de 3 meses a 1 ano e multa.