Cotidiano

Regina Silveira ocupa Fundação Eva Klabin com obras que fazem referência a bichos

RIO — Insetos gigantes sobem pela fachada, jacarés espreitam amedrontadores, uma mosca varejeira paira sobre a cama, pêlos avançam sobre objetos corriqueiros. Regina Silveira vislumbrou na Fundação Eva Klabin o ambiente propício à proliferação de animais. Convidada a realizar a 21ª edição do projeto Respiração (com abertura ao público nesta quarta-feira, a partir das 14h), o bem-sucedido programa de intervenções na casa-museu da Lagoa idealizado por Marcio Doctors, curador da instituição, a artista paulistana de 77 anos não tinha, na verdade, nenhuma ideia em mente ao visitar o espaço. Mas ao ver a bela mesa mineira do século XIX posta, com porcelanas, talheres de prata e imponentes candelabros de prata, soube imediatamente que a recobriria de uma pelúcia felpuda, preta.

— Já tenho na minha obra trabalhos com pelo, mas não dessa dimensão. A ideia aqui era manter a silhueta da mesa, conservar a sua identidade como tal. O incrível é que se transformou num animal. Se fizesse só isso já estaria contente — diz a artista.

Mas Doctors não. Argumentou que seria muito pouco diante “da grandeza da obra” da artista. Ela então concedeu, e, a partir de “Mutante” (este o nome da mesa recoberta de pêlos) pensou o resto da mostra. O resultado se vê já de fora. Regina é o primeiro nome do projeto a usar a fachada do imóvel. Ela desenhou insetos gigantes e a imagem digital foi recortada e plotada na parede externa. “Mundus admirabilis” foi feito originalmente em 2008, para uma exposição no CCBB de Brasília, chamada “Jardim do poder”. Coube a ela preencher uma caixa de vidro de 20 x 20 metros.

— Instalei essa família de insetos maus, daninhos. Eu os agigantei completamente, como numa espécie de aula magnífica. Por isso “Mundus admirabilis”. Era uma alusão à magnificência da vida política em Brasília com seus insetos daninhos. Achei eles muito apropriados para cá, parece brotarem do jardim.

A animalização da casa continua na rica sala Renascença. Ali, ela retirou tapetes e afastou móveis para instalar “Dark swamp (nest)”, um ovo negro em fibra de vidro, de 1,80m, rodeado por uma mandala de jacarés. A obra, da Coleção João Sattamini/MAC, foi concebida em Nova Orleans, ainda devastada pela passagem, em 2005, do furacão Katrina.

— Imaginei esse ovo na Sala do Cabildo (antiga sede de poder do governo durante a colonização espanhola em Louisiana). É um ovo do mal, nasceu ligado às consequências do desastre do Katrina. Fala sobre contaminação, sobre deterioração da vida cotidiana.

— Há uma intencionalidade aqui, de fazer com que o ovo crie um ponto de convergência de todas as obras da coleção. Ele de certa maneira imanta as obras que estão na parede e cria um contraste fabuloso — observa Doctors.

“Insolitus” traz ainda um “Mutante 2” — um carrinho de chá no processo de se tornar “bicho”, com pelos recobrindo uma parte dele e dos objetos que carrega. Um percurso sonoro, também criado por ela, atrai o visitante ao segundo andar. É lá, no quarto de dormir de Eva Klabin, que Regina instalou “Surveillance”. Uma animação em 3D de uma mosca varejeira é projetada em looping sobre a cama, e sua movimentação tem o som digital do telefone celular ampliado.

— A obra dela tem várias camadas de sentido. É crítia, sem ser panfletária ou militante — diz o curador.

“INSOLITUS”

Onde: Fundação Eva Klabin — Avenida Epitácio Pessoa 2.480, Lagoa (3202-8550).

Quando: Abre ao público dia 28/9, às 14h. Visitação de ter. a dom., das 14h às 18h. Até 29/1/2017.

Quanto: R$ 10 (grátis aos domingos).

Classificação: Livre.