Agronegócio

Queijo nas alturas: Valorização de derivados pesa a empresários, mas anima produtores

O principal destaque foi a muçarela

De vilão a mocinho: queijo salta de preço em menos de dois meses - Foto: FAEP
De vilão a mocinho: queijo salta de preço em menos de dois meses - Foto: FAEP

Cascavel – Após chegar ao menor patamar de preço em maio devido à baixa demanda, o queijo teve uma valorização acentuada ao longo dos últimos 40 dias deixou o papel de vilão e se tornou o herói do segmento, puxando o valor de referência do preço no mercado paranaense. O principal destaque foi a muçarela, cujo preço médio aumentou 47,5% do início de maio a 7 de julho, alcançando o segundo melhor preço em dez anos. Os dados foram apresentados em reunião virtual do Conseleite-PR (Conselho Paritário Produtores/Indústria do Paraná).

“Não existem fundamentos econômicos para explicar esse aumento. É um descompasso de mercado que pode ter grande relação com o auxílio emergencial pago pelo governo federal, que deu mais poder de compra às famílias e assim o consumo aumentou, refletindo na valorização do produto e, consequentemente, na valorização da matéria-prima, o leite”, explica o técnico departamento econômico da Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná) Guilherme Souza Dias.

A valorização do derivado surpreendeu tanto que rendeu até um novo título. “É impressionante a variabilidade que esse derivado [a muçarela] teve no período. Os queijos, que eram os vilões, passaram a heróis”, comparou José Roberto Canziani, da UFPR (Universidade Federal do Paraná), um dos responsáveis pelo levantamento.

Além da muçarela, outros queijos também tiveram valorização expressiva. De maio ao primeiro decêndio de julho, o preço do queijo prato avançou 33,4% e o do provolone, 14,1%. Parmesão e requeijão tiveram oscilação positiva de 4,8% e 5,6%, respectivamente.

Outro ponto que demonstra a força momentânea dos queijos é a relação com o leite UHT. Na média histórica, um quilo de muçarela corresponde ao preço de sete litros de UTH. Em março, a relação estava inferior a seis. Com a valorização, um quilo da muçarela passou a corresponder a 8,5 litros de UHT.

 

Na outra ponta

Se por um lado a melhora no preço dos queijos anima os produtores, que amargavam prejuízo até dois meses atrás, por outro, complica a vida de empresários, especialmente do ramo alimentício em geral.

É que o aumento do produto vem junto da queda do movimento dos estabelecimentos que já voltaram a funcionar após as quarentenas. “Esse aumento significativo vem complicando a nossa situação, que já não era das melhores. Depois de um período fechados por conta da pandemia, agora que reabrimos nosso movimento é apenas 40% do que era antes. Por enquanto estamos absorvendo esse valor, porque reabrir e já repassar ao cliente nesse momento não dá. Esperamos que seja algo momentâneo e que haja um equilíbrio em breve, porque vai chegar uma hora que não vamos mais conseguir absorver. Para se ter ideia, eu pagava R$ 18,90 no quilo do queijo e agora pago R$ 25,80, cerca de 36% a mais. Nunca houve um aumento tão grande… Todos os anos o preço oscila, mas nunca dessa forma”, afirma o empresário Sandro Fadanelli, proprietário de restaurante.

Produtores planejam investimentos

E se até algumas semanas atrás o pecuarista leiteiro estava desacorçoado com a atividade, agora o cenário melhorou.

Com a exceção de alguns derivados, como iogurte e doce de leite, que se mantiveram estáveis, os outros produtos derivados de leite também tiveram oscilação positiva, embora nenhuma tão expressiva quanto a dos queijos.

Diante desse cenário, o valor de referência do leite aumentou 22% de maio para junho, saltando de R$ 1,3046 para R$ 1,5975 o litro. Valor comemorado pelo produtor, pois está cobrindo os altos custos da produção. “O preço melhorou bastante, mas precisa melhorar ainda mais. Eu recebi R$ 1,53 por litro, consegui pagar a ração e ainda sobrou um pouco, fiquei mais animada, pois antes mal cobria os custos… Para se ter uma ideia, o valor da ração aumentou muito. Antes eu pagava R$ 38 em uma saca de 40 kg, agora pago R$ 52…”, afirma a produtora Celi Griep, do Distrito de Novo Três Passos, em Marechal Cândido Rondon. Ela completa: “Poderia melhorar ainda mais, chegando aos R$ 2 o litro [do leite], mas está bom o valor, até porque no ano passado recebíamos R$ 1,10”.

Ela conta que, para reduzir custos, investiu no plantio de aveia para pastagem dos animais e com o cenário atual já planeja aumentar o plantel, em pelo menos dois animais.

O colegiado aprovou o valor de referência projetado de R$ 1,6986, para o leite entregue em julho a ser pago em agosto. Mas, de acordo com o técnico da Faep Guilherme Souza Dias, o momento é de cautela e de focar na eficiência produtiva. “Não há como prever até quando o cenário se mantém, pois grandes valorizações e desvalorizações não perduram por muito tempo e nós nunca vivemos um cenário tão incerto como vivemos hoje, com a pandemia do novo coronavírus. Então, é o momento de o produtor focar na eficiência da propriedade, rever os custos, descartar animais improdutivos e valorizar a qualidade do produto que oferta; buscar o lacticínio e tentar renegociar contratos com base na qualidade, que é o carro-chefe”, ressalta Guilherme.

 

Perigo

Especialistas em mercado reforçam o alerta sobre o perigo da valorização súbita. A última vez que o preço dos queijos teve alta tão acentuada em um período curto foi em julho de 2016. Na ocasião, após a valorização súbita, os preços também despencaram rapidamente nos meses seguintes. “É um momento de extrema cautela, porque é um momento atípico. Estamos em um momento em que as variações são muito positivas, mas, em breve, podem ser muito negativas”, apontou a professora Vânia Guimarães, da UFPR, que também elaborou o acompanhamento de mercado.

Na avaliação do vice-presidente do Conseleite-PR, Ronei Volpi, apesar de o mercado estar aquecido, o setor deve adotar um tom de prudência, em razão cenário atípico provocado pelo combate à covid-19. “Embora o cenário aponte para preços favoráveis, a situação conjuntural aconselha termos cautela em função das incertezas econômicas, sociais e de mercado, em função da pandemia”, disse o vice-presidente do Conseleite-PR, Ronei Volpi.