Cotidiano

Proposta ?errada? em cartel de ferrovias levou a agressão em reunião de empreiteiros

BRASÍLIA – Um erro na entrega de envelopes em uma concorrência da Valec, estatal federal da área de ferrovias, gerou uma crise no cartel do setor e até agressão física entre representantes de duas empreiteiras envolvidas no esquema. A história é contada no acordo de leniência da construtora Camargo Corrêa, tornado público pelo Conselho Administrativo e Defesa Econômica (Cade). O documento foi a base da Operação Tabela Periódica deflagrada pela Polícia Federal em Goiás e mais oito estados nesta quinta-feira.

Ao assumir o cartel, os executivos da Camargo Corrêa contam que ele existe, ao menos, desde o governo Fernando Henrique Cardoso. Relatam uma licitação feita ainda sob a presidência Luiz Raimundo Carneiro de Azevedo na Valec na qual teria havido direcionamento por ele para beneficiar Camargo, Mendes Jr, SPA e Andrade Gutierrez. Segundo o documento, o cartel se consolidou a partir de 2003 e foi ampliado em 2010, chegando a contemplar 37 empresas. José Francisco das Neves, o Juquinha, ex-presidente da Valec, teria sido o responsável pela ampliação, contemplando empresas de menor porte.

Foi nessa fase que um erro de executivos da Queiroz Galvão teria provocado a disputa dentro do cartel. Na negociação entre as empresas para a divisão de obras das Ferrovias Norte-Sul e Leste-Oeste houve alguns impasses e a Camargo Corrêa e a Queiroz Galvão, que formavam juntas o consórcio Ferrosul, decidiram preparar propostas ?competitivas? para dois dos lotes, além das combinadas com os concorrentes. Até o momento da licitação, ocorrida no segundo semestre de 2010, as disputas internas foram pacificadas e as empresas entregaram as propostas já com as cartas marcadas de quem deveria vencer.

O problema é que na hora de entregar os envelopes a Queiroz Galvão mandou para a Valec as propostas ?competitivas?. Com isso, o consórcio venceu dois lotes na Ferrovia Norte Sul, quando deveria ter levado apenas um. O erro provocou a ira de Juquinha e da empresa Pavotec, que venceria um dos lotes pela combinação do cartel.

No meio das tensas negociações para que o consórcio Ferrosul desistisse de um dos lotes chegou-se à agressão física. Um sócio da Pavotec arremessou um objeto contra um executivo da Queiroz Galvão. A confusão encerrou a reunião, que acontecia na sede da Queiroz Galvão em Brasília.

?Na ocasião, estiveram presentes, pelo menos, Djalma Florêncio Diniz (sócio da Pavotec) e Rui Novais Dias (Diretor da Queiroz Galvão). As tratativas foram infrutíferas tendo ocorrido, inclusive, agressão física entre os participantes, quando um representante da Pavotec teria arremessado um objeto em direção a Rui Novais Dias (Diretor da Queiroz Galvão). Segundo conhecimento do signatário após a tentativa de agressão, a reunião foi encerrada e os representantes da Queiroz Galvão anunciaram que não mais receberiam os representantes da Pavotec?, diz trecho do documento da Camargo Corrêa divulgado pelo Cade.

Juquinha pressionou o consórcio Ferrosul pela desistência, mas o entendimento da Camargo era de que a proposta só teria viabilidade financeira se fosse para os dois lotes. Após diversas reuniões com o presidente da Valec, as empresas acabaram cedendo e desistiram de um dos lotes duas semanas depois de terem mandado documento à própria estatal revalidando as propostas. Nesse caso, o consórcio Ferrosul recebeu da Valec, devido a aditivos, R$ 882,9 milhões pelas obras de um dos lotes entre 2012 e 2014. A licitação foi vencida com um lance de R$ 632,8 milhões em 2010.